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Entrevistas

Entrevista: Gabriel Mascaro

Um Lugar ao Sol

Por Luiz Joaquim | 23.10.2009 (sexta-feira)

Como surgiu a interesse pelo perspectiva de mundo dos moradores de coberturas?
A idéia veio de um interesse como espectador. Queria ver um filme que abordasse o imaginário dessas pessoas que vivem em coberturas. É algo que não lembro de ter visto no cinema brasileiro. Mais especificamente, queria falar da transformação pela qual passa o Recife agora, pois vivi 20 anos numa casa entre o Cordeiro e a Torre e vi esses bairros verticalizando. Daí comecei a imaginar como o fato de morar num lugar alto interferiria na perspectiva de ver o mundo.

Quanto tempo para fazer o filme?
Foi um processo complicado. Filmei há bastante tempo e ele ficou quase quatro anos decantando. O primeiro contato o discurso dos entrevistados foi perturbador. Eu não parti para um confronto de pontos de vista enquanto filmava. Tive de resolver esse confronto enquanto montava. Passei dois anos tentando resolver essa questões pois o conteúdo do material é muito forte e pode parecer bizarro para alguns, mas é um ponto de vista. Ponto de vista que pode gerar algum riso no espectador não familiarizado com aquele universo. O pior é que cada riso dói em mim. Passei um ano tentando dar um corte que não satanizase aquelas questões. Não queria fazer um filme pontualmente contra o que era dito pelos personagens. A idéia não era fazer um show de coisas chocantes. O que quero mostrar é que é um ideologia, talvez não seja a nossa, mas é sim uma forma de entender a coletividade por um outro ângulo.

Quais cuidados tomou para evitar uma possível abordagem preconceituosa?
Nosso contato foi o mais frio possível. A equipe entravam em contato com os entrevistado antes de mim. Eu só aparecia quando todo o set já estava preparado. Até começar a entrevista eu não tinha contato com o entrevistado. Era uma estratégia para evitar qualquer tipo de confronto. Se eu optasse pelo confronto, iria ter respostas muito fáceis. Só escutar já é suficiente para provocar um choque. Era difícil por exemplo, ser congratulado por eles pelo trabalho que eu estava fazendo. Eu tinha dificuldade em resolver isso no filme. Precisava evitar um combate rasteiro de classes. E carrego no filme a idéia do “personagem de exceção”.

O que seria o “personagem de exceção”?
Tenho a sensação que não consegui fazer o filme. Eu não tenho acesso a esse grupo. É como se eu não tivesse legitimidade pra representá-lo. E o filme não traz um corpo histórico que dê uma dimensão documental do ponto de vista oficial, como quem diz: “agora o Brasil tem um filme que retrata aquela classe”. Não. É exatamente isso o que eu não consegui aqui.

Além da “Variety”, como tem sido a principal leitura feita no exterior?
Estive com o filme em Monique, Suíça, Los Angeles e América Latina. O público fica até o final das exibições e quando acaba, querem entender como funciona e fazem muitas perguntas. Às vezes se chocam com a idéia de o filme não prestar homenagens, mas é exatamente o que eu não queria fazer, um filme sobre celebrações. Há uma crítica bem pesada contra o filme – no site www.cinetica.com – questionando a premissa entre ‘altura’ e ‘poder’, pois no Rio de Janeiro favelados moram em lugares mais alto que os residentes de cobertura. Entretanto, o que me interessa aqui é outra esfera. É como os personagens se percebem na sociedade. É a idéia de participação na sociedade e o grau de interesse e envolvimento deles nessa participação.

A última entrevistada sai de quadro, dando por encerrada, ela própria, a entrevista. Pela posição dessa entrevista, você também dá um desfecho ao filme. Por que esse escolha?
Acho que começamos a falar sobre segurança e ele pode ter achado que estava se expondo demais – alguém fala em 50 câmeras ligadas para segurança… Nesse momento, nosso filme tava se mostrando cinema, porque a intenção de nossa câmera era outra. Se eu trouxesse isso em outro ponto do filme, no início por exemplo, não teria o mesmo impacto que essa complexidade de como a “presença de cinema” se dá. Pra mim o filme acabou ali. Existe uma tensão não muito precisa durante todo o filme e que ali se manisfesta, exatamente quando o filme é mais cinema.

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