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Reportagens

88º Oscar (2016) – cerimônia

Uma edição para não esquecermos

Por Luiz Joaquim | 27.02.2016 (sábado)

Ah… nada como uma polemica para inflamar a relação de um evento com seu com$umidor e seu mercado. Por mais triste que possa parecer essa ideia ela, não tenha dúvida, faz brilhar os olhos de manda-chuvas do marketing no alto show-businness. Ou o leitor duvida que esta 88ª edição do Oscar terá uma das maiores audiências de sua história?

E a razão seria pelo “charme” dos filmes em competição? Não necessariamente, muito embora a safra esteja especialmente interessante. A razão primeira vem sendo estampada na mídia desde 14 de janeiro último quando foram anunciados os indicados aos prêmios e não surgiu nenhum ator negro entre os 20 que se distribuem nas categorias melhor ator e atriz, principais e coadjuvantes.

Não tem se comentado, até onde apuramos, que também não figuram entre os indicados nenhuma lésbica, gay, bissexual, travesti, transexual, transgênero ou queer. E não é por falta de opção de trabalhos competentes neste 2016.

As atrizes trans Kitana Kiki Rodrigues e Mya Taylor, por exemplo, foram inscritas como candidatas a melhor atriz na Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood para concorrer a uma estatueta dourada pelas ótimas performances no filme Tangerine, de Sean Baker, pelo qual elas vivem as amigas Sin-Dee Rella e Alexandra. Foram relegadas.

Assim como também o foi um óbvio candidato negro neste ano: Will Smith, pelo bom desempenho em Um Homem entre Gigantes (estreia 03/março), com o qual concorreu ao Globo de Ouro 2016.

Não que devamos hierarquizar injustiças sócias. É injusto ou não se é. Não há meio-termo aqui. E, reforçamos, as reivindicações de afro-descentes por reconhecimento e igualdade são todas legítimas. Ponto. Mas então, neste caso aqui, qual seria a diferença entre Smith, Rodrigues e Taylor?

Seus salários. E, logicamente, sua conseqüente representatividade na sociedade mundial. Segundo a revista “Forbes”, há dois anos, Smith era a 75ª celebridade mais bem paga do mundo. Mais um ano antes, era a 35ª. Isso, sem sombra de dúvida, conta na hora de fazer barulho na mídia desse mesmo mundo em que coabitam os três atores em questão.

Em função de tanta e tão forte polêmica em torno do assunto, a Academia passou a cogitar mudar algumas regras para a edição 2017. Entre elas, indicar não apenas cinco atores, mas até dez atores por cada categoria.

O interessante aqui é que, pelo menos um ator negro estará no palco do amanhã (28/02) entre a branca e heterossexual comunidade hollywoodiana. Ele é Chris Rock (autor da ótima tele-série Todo Mundo Odeia Chris). Então, mais uma vez, como não ficar minimamente curioso por uma cerimônia apresentada por Chris Rock com um forte movimento pro-boicote correndo por fora, que é estimulado por celebridades afro-americanas?

CINEMA
Falando de filmes, não precisa ser especialista para percebemos que, felizmente, 2016 oferece uma safra interessante. Tanto que, apesar de três dos oitos títulos despontarem na corrida pelo principal prêmio, não há quem arrisque dizer qual deles é o grande favorito. Falamos de Spotlight: Segredos Revelados, A Grande Aposta e O Regresso.

Isso sem falar que temos no mesmo páreo um dos filmes mais impactantes, operando numa espécie de unanimidade, que se chama Mad Max: Estrada da Fúria. Ao seu lado correm a ficção científica Perdido em Marte, o histórico Ponte de Espiões (assinado por ninguém menos que Steven Spielberg, registre-se); e os pequenos, mas grandemente potentes O Quarto de Jack e Brooklin

A grande beleza aqui é que a única coisa em comum entre estes oito filmes é sua indicação ao Oscar de melhor filme. Daí a dificuldade em apontar vitoriosos. Cada um tem uma força cinematográfica muito particular (e competente) de modo que, desta vez, seus temas podem nortear com um maior peso pela inclinação dos mais de 6.000 votantes da Academia.

Ao mesmo tempo. Este peso cinematográfico e temático é igualmente equilibrado, em particular por três filmes. Spotlight: Segredos Revelados, atingindo em cheio dois alvos importantes, o jornalismo contemporâneo e abusos sexuais no âmbito da Igreja; A Grande Aposta, sobre a irresponsável manipulação do mercado financeiro, resvalando na concreta vida de uma nação; e O Quarto de Jack, apresentando com profundidade o trauma de uma seqüestrada que pariu e educou por cinco anos seu filho num cativeiro, e sua subseqüente readaptação ao mundo real.

Não são assuntos pequenos. E são muito bem explorados aqui.

Numa outra mão, é a manipulação (num bom sentido) cinematográfica que impera.

Em Mad Max temos George Miller nos oferecendo uma ópera da danação diatópica, que arregalou os olhos e encheu os ouvidos de quem o testemunhou numa sala de cinema. Um filme que fez, de forma comovente, descrentes voltarem a acreditar no cinemão.

Há, nessa mesma vibração, a elegância cinematográfica de Spielberg criando um novo herói americano ao resgatar a história do advogado que negocia com a URSS na Guerra Fria dos anos 1950 (Ponte de Espiões); e a épica história de esperança com molho high-tech de um homem esquecido em Marte, dirigida por Ridley Scott.

Já o badalado O Retorno ganhou simpatia menos pelas amostradas piruetas fotográficas de Iñárritu e mais pela real possibilidade de dar a Leonardo DiCaprio sua primeira e merecida estatueta. Querido pelos states, Leo nunca esteve tão perto do tão desejado troféu.

Ainda que esteja brigando com gente bem grande ao seu lado – Eddie Redmayne A Garota Dinamarquesa; Michael Fassbender Steve Jobs; Bryan Cranston Trumbo: Lista Negra e o azarão Matt Damon Perdido em Marte -, Leo pode mesmo levar o homenzinho dourado para casa.

E, vejam só, resta ainda um filme na competição de melhores do ano –Brooklin, que em outros anos poderia vencer a disputa sem muita dificuldade. Bem construído e bem realizado – e sendo de uma ternura rara e tocante de se ver com seus personagens para um filme contemporâneo – este trabalho de John Crowley tem muito de sua força por questões menos evidentes, ou estridentes, como as que se vêem em seus concorrentes nestes 2016.

Como se esse time de obras não fosse suficiente, correm por fora – figurando na disputa das categorias de melhor ator, atriz, roteiro, etc – outros títulos que valeram a pena serem observados em 2015/2016.

Entre eles: 45 Anos; Creed: Nascido para Lutar; Steve Jobs; Carol; Os Oito Odiados; e Sicario: Terra de Ninguém, entre outros.

Da mesma forma que houve uma distinção temática bem marcada entre os principais concorrentes, encontramos ela entre os que disputam pela categoria de língua-não inglesa. Só pelos títulos que chegaram ao Brasil temos uma ótima amostragem: o colombiano O Abraço da Serpente; o francês Cinco Graças; e húngaro O Filho de Saul, provável vencedor aqui.

BRASIL
A nós, brasileiros, um condimento deixa esta edição ainda mais saborosa. E o responsável por isso chama-se Alê Abreu, que deu ao mundo seu belo O Menino e O Mundo disputando na categoria animação com gente grande como Anomalisa; Shaun, O Carneiro; As Memórias de Marnie; e Divertida Mente, o favorito do ano.

Abreu, inteligente que é, deve estar se considerando um vencedor. Não por que pode trazer o homenzinho amarelo (o que é pouco provável, sejamos honesto), mas por entender que um novo mundo do mercado cinematográfico lhe foi aberto. E a soma é sempre mais interessante que a subtração quando os assuntos são novas ferramentas para expandir a capacidade criativa e negócios.

Será uma edição especial, essa do Oscar. Com ou sem polêmica.

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