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Críticas

Águas rasas

Um dos filmes mais tenso (e belo) que você verá nos cinemas em 2016.

Por Luiz Joaquim | 25.08.2016 (quinta-feira)

Como é bom ter a possibilidade de diferentes perspectivas. Caso contrário, sua visão será unidimensional. E o pior. Você estará convicto de que ela é soberana e absoluta.

Comparemos, portanto, dois filmes em cartaz nos cinemas do Brasil que são aparentemente distintos, mas com objetivos primariamente próximos, ou seja: nos envolver pela beleza da sofisticação visual acompanhada por uma tensão constante e crescente em sua opressão.

Falamos de Esquadrão suicida e Águas rasas (The shallows, EUA, 2016). Mas, ei? Um é uma adaptação do HQ da DC Comics, e o outro é um filme de uma guria surfando na praia. Como é que você vai comparar uma vaidosa orquídea com um feioso maxixe? É simples. Tanto a vistosa orquídea (que custou US$ 175 milhões) quanto o esquisito maxixe (que custou US$ 17 milhões) são plantas.

A diferença é que o maxixe dá frutos.

No caso, o sabor é de um agridoce gratificante, o dado pelo fruto desse novo trabalho do catalão Jaume Collet-Serra – guardem esse nome. O CinemaEscrito já o vem celebrando há pelo menos cinco anos com Desconhecido (2011), Sem escalas (2014) e Noite sem fim (2015).

Collet-Serra simplesmente não erra e, qualquer dia desses, seu nome virá escrito num mesmo parágrafo com a palavra ‘Oscar’ (como este).

Os três filmes citados circundam suas tramas em torno de conspirações, ou rixa de gangues brutais, e em como se safar disso. Em Água rasas, o cineasta vai a um ambiente o mais oposto imaginável desse universo.

O cenário é uma paradisíaca praia selvagem no México e ele nos faz acompanhar os passos de uma personagem também selvagem, por assim dizer, pois em formação e em plena beleza e vigor de sua juventude.

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Há, entretanto, um elemento em comum em toda cinematografia de Collet-Serra. Seus protagonistas sempre precisam provar algo para si mesmo.

Não é diferente aqui, com a linda Nancy (Blake Lively, de A incrível história de Adaline e Café Society), que chega a tal praia para viver um momento que lhe é caro. Particular. No passado, foi ali que sua mãe – já falecida por um câncer – descobriu que estava grávida de Nancy.

O local era, portanto, um terreno sagrado e só agora a texana teve a coragem de visitá-lo, sozinha, e falando um espanhol do ensino médio. Aventurou-se para viver o luto da mãe nessa espécie de santuário de sua família.

O que há de melhor em Águas rasas é que nada disso é explicado. Ao menos não de maneira burocraticamente descritiva como fazemos acima. Collet-Serra primeiro nos coloca dentro desse ambiente paradisíaco apenas pela apresentação das lindas imagens que a geografia do lugar oferece. O que nos faz pensar, mais uma vez, o quanto é bacana não ter de vincular-se excessivamente aos efeitos especiais para encher os olhos do espectador para a beleza visual que um filme quer construir.

A afirmação é óbvia, mas não tanto se considerarmos a quantidade de filmes hollywoodianos que nos chegam hoje fazem seu atores contracenarem com o nada. Inclusive Águas rasas.

Sim. Se no primeiro 1/3 da produção, Collet-Serra toca sua obra apenas (‘apenas’ nem é a palavra) com tomadas incríveis de Nancy chegando na praia, conversando com o celular (num skype com a irmã mais nova e seu pai), e se preparando e preparando a prancha para entrar na água, nos outros 2/3, temos um monstro marinho desconstruindo todo o caminho intimista que o filme nos sugere no início.

Ainda no 1/3 inicial, as imagens que Collet-Serra escolhe para compor o roteiro de Anthony Jaswinski são absolutamente sedutoras. Seja por tomada aérea, ou submarina, ou por superclose, sua competência aqui é daquelas que faz o espectador querer estar naquele mesmo lugar, ao lado da protagonista.

Não vá o leitor pensar porem que se trata de uma construção visual publicitária, esta apresentação do ambiente. Não. Está mais para a construção de um paraíso que já existia na cabeça de Nancy por toda sua vida e, finalmente se torna concreto, tendo o espectador como testemunha. A vivacidade e encantamento do lugar, para que nos fosse convincente, não poderiam, portanto, ser tratados com menor esmero do que o que se vê na tela.

O que ficamos olhando é, basicamente, a celebração da vida, em todo o esplendor e beleza de sua juventude.

Ponto.

Feita a apresentação, uma reviravolta acontece e Águas rasas passa a ser cercado, até o fim, pela ameaça da morte. Ou seja, pelo oposto daquilo que ela celebrou de forma rica e cativante até então. E isso pode ser explicado por uma única palavra: “tubarão”.

Esta crítica encerra-se aqui. Pois a fiel angústia do choque de sensações desse contraste entre vida e morte será dada apenas pelo próprio filme. De preferência numa sala de cinema com uma tela enorme.

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