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Críticas

Pequeno segredo

Este bombom, de embrulho reluzente, tem gosto trivial e passageiro

Por Luiz Joaquim | 09.11.2016 (quarta-feira)

E finalmente o público terá acesso a Pequeno segredo (Bra., 2016), filme de David Shcürmann que ganhou fama graças a polêmica sobre sua definição pela comissão formada pela Secretaria do Audiovisual para disputar oficialmente pelo Brasil – no lugar do óbvio Aquarius, de Kleber Mendonça Filho – a uma vaga na indicação ao Oscar de filme estrangeiro em Hollywood. O filme entra em cartaz amanhã (10/11) nos multiplex do País.

Polêmicas à parte – uma vez que a tal discussão parece já saturada – e nos atendo ao que Pequeno segredo tem de concretamente a oferecer, vemos que o filme se apresenta como um bombom bem embalado com seu papel reluzente, mas cujo sabor do conteúdo é tão trivial e fácil de obliterar quanto a mais vagabunda das balinhas.

A razão disso está na estrutura tradicional (no mau sentido) de contar uma história, que vem carregada de clichês. Pequeno segredo é como uma colcha de retalhos amarrada com um bordado vistoso, mas sem resistência suficiente para sustentar os retalhos que lhe antecedem dentro da estrutura dramática.

A história segue em três esferas e tempos distintos – a da família Schürmann navegando pelo mundo; a do encontro do neozeolandês Robert (Errol Shand, de Oeste sem lei) com a paraense Jeanne (Maria Flor), encontro do qual vai nascer a pequena Kat (Mariana Goulart); e a da vida de Barbara (Fionula Flanagan, de Os outros) como mãe ciumenta de Robert e infeliz e solitária ao lado de seu marido lutando contra um câncer.

Para não deixar dúvidas, Pequeno segredo já abre com a imagem de um funeral que finalmente vai unir Barbara e Heloísa Schurmann (Julia Lemmertz), a qual viria a ser a mãe adotiva de Kat, quando cuida da menina até a sua morte em 2006.

 

Ou seja, o contrato do filme com o espectador está firmado desde o início, e ele se traduz em nos mostrar como Kat foi concebida, a razão e os caminhos que fizeram com que os Schürmann adotassem a menina; e a maneira como ela, a pequena Kat, convivia com o vírus numa época em que a medicação era muito pesada para que seus efeitos não se manifestassem.

Nesse sentido, Pequeno segredo traz momentos luminosos, solares, próprio da vida de navegadores – com retratos envolventes do mar, da paisagem do Pará e da Nova Zelândia -, e alterna esses momentos plásticos (entenda aqui o termo ‘plástico´ tanto pela ideia do atraente ‘visual’ quanto pelo que lhe há de ‘superficial’), com situações melodramáticas.

Nada contra o melodrama, mas ele não nos convence quando fica no meio do muro, ora tentando mostrar-se elegante/sóbrio, ora procurando nos comover rápido pela história de uma inocente condenada à morte. E na verdade, o grave, tentando nos comover por diálogos pobres, rasos, que não consegue nos puxar para dentro do potencial de densidade que pode haver ali naquele contexto. Atente para as frase feitas ditas em off por Heloísa, cobrindo belas paisagens do horizonte infinito.

Nessa medida, Pequeno segredo consegue o que está disposto a conquistar. A emoção fácil, barata, por um drama quase mecânico. Pronto para estimular a lágrima.

Lágrimas que deveram vir em boa parte do público médio. Mães, em particular, não deverão conter-se nas sequências em que Lemmertz aqui (esforçada, mas limitada pelo roteiro) tenta proteger e frágil Kat contra o mundo hostil.

A pequena Goulart se mostra firme em alguns momentos e mais relaxada (fora do ritmo) em outros pontos do filme. O saldo final, no seu caso, soa mais positivo que negativo.

Partir para as especulações se um filme como esse seria o “ideal” para representar o Brasil a uma vaga no Oscar seria um exercício um tanto estéril, uma vez que não se calcula matematicamente como se comportará a cabeça dos mais de 6.000 integrantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográfica de Hollywood.

De qualquer forma, num país que elege Donald Trump como presidente da república pode se esperar de um tudo. Inclusive a confirmação de Pequeno segredo como o melhor filme de língua estrangeira. Na leitura deles, claro.

O anúncio dos indicados à 89ª edição do Oscar acontece em 24 de janeiro de 2017.

5 filmes brasileiros contemporâneos com gente boiando.

– Elena, de Petra Costa

– Era uma vez, eu Verônica, de Marcelo Gomes

– Eles voltam, de Marcelo Lordello

– Pequeno segredo, de David Schürman

– À deriva, de Heitor Dhalia

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