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Críticas

Manchester à Beira-mar

Dentro do redemoinho das tragédias.

Por Luiz Joaquim | 22.01.2017 (domingo)

 Manchester à beira mar (Manchester by the Sea, EUA, 2016), de Kenneth Lonergan, é um filme sobre duas tragédias. Na primeira delas o espectador é pego de surpresa assim como acontece a Lee (Casey Affleck, vencedor do Globo de Ouro de ator pela performance aqui).

Por telefone, ele recebe a notícia de que o irmão mais velho Joe (Kyle Chandler, não tão mais velho), sofreu um segundo ataque do coração e está na unidade de tratamento intensivo em Manchester, cidade há 2 horas de carro de Brooklin, onde reside Lee.

Nesse momento inicial do filme, o impacto da notícia no espectador não é marcante uma vez que ainda estamos sendo apresentados a Lee. Até ali, o protagonista nos é mostrado apenas como o faz-tudo de um condomínio residencial. Entre o conserto de uma pia, o desentupir de um vaso sanitário ou a troca de uma luminária vamos entendo Lee como um sisudo e estourado zelador.

Chegando ao hospital em Manchester para dar assistência ao irmão, descobre que o mesmo não resistiu e entre outras atribuições recebe a informação de que será o tutor do sobrinho de 16 anos, Patrick (Lucas Hedges, bem).

Nesse ponto, Manchester à beira mar já nos capturou a atenção. Em particular pela forma como Lee reage pela perda do irmão, tentando administrar uma contenção de dor e raiva simultaneamente. Sensações e expressões que requerem de Affleck um desempenho delicado – e que ele nos dá.

A partir daí, a direção e roteiro de Lonergan também vão nos oferecendo mais dados, por meio de flashbacks, sobre o passado de Lee, sua relação com o irmão, com o sobrinho e a ex-esposa Randi (Michelle Williams) e seus três filhos.

Nesse sentido, vamos percebendo que temos dois Lees muito distintos entre o do presente, taciturno e duro com Patrick, e o doce, brincalhão e paciente do passado.

 

O que separa estes dois Lees é a segunda tragédia do enredo, e Manchester à beira mar em sua narrativa é primoroso no sentido de não oferecer dicas ao espectador a respeito disso.

Ocorre que, ao acontecer, já estamos tão próximos desse personagem complexo que, aí sim, ao sermos apresentados a ela [a tragédia] talvez tomamos um susto maior que o do próprio protagonista, ao menos é o que se sugere pela reação de Lee ao deparar-se com ela.

Em vários aspectos Manchester à beira mar é convincente (mais que isso, é envolvente) em sua dramaturgia. É assim pela consistência dos personagens satélites, como com o jovem Patrick contraditório; e é assim pelos diálogos francos e diretos.

Neste caso, num dos momentos mais marcantes, temos um encontro casual, anos depois de separados, entre Lee e Randi.

No encontro acontece a absoluta incapacidade de colocar para fora em palavras, de um para o outro, aquilo que foi interrompido entre o casal. Mas entre gaguejadas e balbuciadas entendemos tudo cristalinamente. Não é algo fácil de construir e traduzir numa encenação. Parabéns a esses dois grandes atores e ao seu diretor Lonergan.

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