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Assim Era a Atlântida

Ode à felicidade e à inocência

Por Luiz Joaquim | 28.10.2007 (domingo)

Para os brasileiros de hoje, na casa dos 60, 70 anos, que tinham o hábito de, na adolescência, frequentar salas de cinema, a combinação das palavras Atlântida, Oscarito, Grande Othelo, Eliana e Cyll Farney fazem soar um violento tilintar saudosista. Um som que remete a uma época na qual nossa produção cinematográfica vivia momentos de glória, atingindo em cheio o gosto do público a partir da Chanchada. O gênero surgiu aqui no país nos anos 1940 e consolidou-se na década seguinte, sendo os estúdios da Atlântida Empresa Cinematográfica do Brasil S/A, fundada em 1941, o seu mais virulento símbolo.

Pode-se dizer que o filme contido neste pacote, Assim Era a Atlântida, rodado em 1975 por Carlos Manga, é auto-explicativo. O diretor Manga chegou à Atlântida aos 19 anos como ajudante de carpintaria dos cenários e tornou-se o menino de ouro da produtora. Ele, ao dirigir seus próprios filmes, iniciando com Nem Sansão, Nem Dalila (1953), revolucionaria o estúdio e o gênero, integrando números musicais ao corpo ficcional das Chanchadas. Experimento que já havia dado certo em Carnaval Atlântida (1952), de José Carlos Burle.

De posse da autoridade que goza, Manga reuniu aqui trechos dos 27 títulos que restaram da Atlântida após um incêndio que a tomou em 1952. A partir deles, montou uma antologia pela qual temos uma visão ora analítica, ora saudosista do que significou o estúdio e de como as estrutura narrativa simples de suas obras e seus enredos pueris encantava as massas que lotavam os cinemas para, entre outras coisas, conhecer as marchinhas de carnaval que iriam marcar os bailes no ano seguinte ou corrente.

Realizado cerca de 15 anos após o crepúsculo da Chanchada e no alvorecer da Pornochanchada (tendo o Cinema Novo também já arrefecido), o documentário Assim Era a Atlântida chegou em 1975 como uma revisão sobre seus anos de ouro, mas ainda magoada com a postura da crítica especializada em cinema que, naqueles anos, batia forte contra as produções da Atlântida.

Nas vozes de suas estrelas – Adelaide Chiozzo, Anselmo Duarte, Fada Santoro, José Lewgoy e até Norma Bengell, além dos já citados no primeiro parágrafo (exceto por Oscarito, que falecera em 1970) – há também o regozijo por saber que eram eles que levavam alegria para uma platéia fiel e crescente.

Intercalando e ilustrando os depoimentos de seus astros com imagens de seus sucessos, Manga vai desenhando um mapa pelo qual pode se reconhecer os caminhos do sucesso percorrido pela Atlântida, dos quais uma trilha, a da paródia, o estúdio dominava como nenhum outro no país.

Neste rastro, temos Carnaval no Fogo (1950, lançando Eliana), com a histórica seqüência entre Oscarito e Otelo interpretando Romeu e Julieta. Nem Sansão, Nem Dalila (1953), satirizando a partir de Sansão e Dalila, de Cecil B. DeMille, ou ainda Matar ou Correr (1954), rodado em Jacarepaguá (RJ) como se fosse o Velho Oeste de Matar ou Morrer, de Fred Zinnemann. E no quesito paródia, não havia ninguém como Oscarito que, nas palavras de Grande Othelo, seu melhor parceiro, “confundia-se com o próprio símbolo da Atlântida”. Eram inúmeros os trejeitos deste artista completo, quanto sua capacidade de criar improvisos.

Para as novas gerações, ver Assim Era a Atlântida pode servir para suscitar uma nova discussão sobre a validade da Chanchada na nossa história, sempre tão rechaçada pelos intelectuais, mas tão amada pelos espectadores, em mais de de dez anos de reinado absoluto num período de rara e comovente comunhão entre publico e produção nacional.

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