Noel – O Poeta da Vila
Despretensão do filme acerta no cenário e no elenco
Por Luiz Joaquim | 24.01.2008 (quinta-feira)
Se paira no ar a impressão de que filmes brasileiros de época carregam um certo “cheiro de mofo”, como se fosse necessário adotar uma linguagem antiquada para representar um passado relativamente distante, “Noel – Poeta da Vila”, de Ricardo Van Steen (2006), pode servir como exemplo digno de que é possível tomar outro caminho. Embora esteja longe de revolucionar o gênero, essa cinebiografia despretensiosa do sambista carioca Noel Rosa, que cobre a vida do músico a partir da sua desistência dos estudos de medicina, dá uma dimensão adequada de seu legado para a música brasileira, interrompido pela tuberculose quando ele tinha apenas 26 anos.
O diretor não se esquiva de fazer um trabalho paciente de costura entre a interpretação de clássicos do compositor e sua vida atribulada, dividida entre os deveres matrimoniais com sua mulher Lindaura e os prazeres com os amigos, a bebida e a amante Ceci (Camila Pitanga). A autenticidade do filme é muito facilitada pela interpretação de Rafael Raposo, muito parecido com o personagem principal num trabalho quase mediúnico.
Embora o inusitado das participações especiais (entre novos e velhos bambas do samba, estão Paulo César Peréio e Supla (!)) desvie um pouco o foco, a postura dos personagens está além da ilusão de registro documental: o que mais se percebe é o frescor dos atores e a naturalidade na recriação do Rio dos anos 20. A preocupação da mãe em dar ao filho uma vida “correta”, os valentões que mostram o poder da navalha, os cabarés chiques em contraste com a “zona”, todos os elementos importantes que definiam o ambiente estão lá, mas a serviço da narrativa, nunca se sobrepondo a ela. Se o filme ainda guarda um quê de romantismo meio fora do tom, principalmente no registro do Carnaval, pelo menos não nega as pequenas e grandes tragédias que derivavam da vida boêmia. É um trabalho que merece ser descoberto.
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