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Reportagens

Azul, de Eric Laurence, filmagens

O céu de dona Maria

Por Luiz Joaquim | 20.02.2008 (quarta-feira)

11h15 de hoje. Uma senhora caminha sob um sol impiedoso, por um região árida, situada entre a fronteira dos municípios de Garanhuns e São João, a 229 quilômetros do Recife. Ela empunha uma sombrinha azul, assim como o céu que lhe protege. A cor do céu e da sombrinha é a mesma que dá nome ao novo curta-metragem em produção de Eric Laurence. “Azul” está em fase de captação de imagens desde segunda-feira e segue até domingo. É o início da concretização impulsionada pelo prêmio, em torno de 58 mil reais (valor líquido), que seu roteiro recebeu no concurco Ari Severo de 2006. O Firmo Neto daquele ano foi para Marcelo Lordello com “Eles Voltam”.

Nas palavras do próprio Laurence, a história que é baseada num texto de Luzilá Gonçalves, “é sobre a necessidade de se criar uma fantasia para suportar a solidão”. A senhora em questão na tomada descrita acima é a atriz paraibana Zezita Matos – que esteve no clássico “Menino de Engenho” (1965) de Walter Lima Jr., e mais recentemente em “O Céu de Suely”, como a avó do personagem de Hermila Guede. Matos protagoniza “Azul” como Dona Maria, que todos os dias caminha quilômetros até a casa de Socorro (Magdale Alves, já uma estrela do contemporâneo cinema pernambucano), para que a amiga leia sempre a mesma e única carta que o filho distante lhe teria deixado.

A rotina de D. Maria ganha uma reviravolta quando Socorro, o marido (Naneco Lira) e o filho pequeno (Samuel Santos, garoto de Lagoa do Ouro, PE, município sede das locações), resolvem viajar. É quando entra em cena um estranho (Irandhir Santos, de “Baixio das Bestas”, “Amigos de Risco”), personagem cujo roteiro deixa em aberto para o espectador decidir se é ou não o filho de D. Maria.
Com realização da SET Produções Audiovisuais, coordenado por Isabela Cribari, “Azul” soma-se a outros três projetos vitoriosos da dupla Cribari & Laurence – “O Prisioneiro” (2001), “Entre Paredes” (2004) e “No Rastro do Camaleão” (2007) -, que juntos agregaram 52 prêmios pelo País.

A julgar não só pela equipe de criação da nova produção, como também pelo técnicos trabalhando (ao todo são 33 profissionais envolvidos), “Azul” poderá render um belo exemplar de força lírica, como assim deseja Laurence. Captadas em Super-16mm (para depois ser ampliado para 35mm), as imagens são geradas por uma câmera Aaton XTR (que ficará com a SET), e é empunhada pelo fotógrafo carioca Antônio Luís Mendes, que atua há mais de 35 anos no meio, tendo participado de produções como “Dona Flor e Seus Dois Maridos” (1976), no qual atuou como foquista.

No set de filmagem, a comunicação parece fluir entre Mendes e Laurence. “Gosto de trabalhar com gente jovem, e adoro essa luz do sertão. Ao mesmo tempo em que ela é intensa, tem muitas nuances, brilho, variações. Não é fácil trabalhar com ela, mas quando se consegue entendê-la, ela é generosa”, explica o diretor de fotografia.

“Azul” também está sendo um exercício excitante para o técnico de som belga Nicolas Hallet. Ele adianta que o curta não terá trilha sonora e, nesse sentido, os ruídos do ambiente ganham uma força maior na dramaturgia. “A história, num sertão arcaico, não tem nenhuma referência dos tempos modernos, ou seja, não há algo sonoramente pontual, o que dificulta nosso trabalho”, explica.

Nestes exercícios de captação de som, Nicolas percebeu que o efeito sonoro do atrito da madeira em um carro de boi, também de madeira, quando posto em movimento, produz um som que se aproxima aos de uma rabeca. “Como vamos enviar todos os ruídos captados para o grupo mineiro O Grivo reprocessá-los harmoniosamente, há um possibilidade que este som abra o filme”, arrisca o técnico.

No caso da direção de arte, Dantas Suassuna e o assistente Guryva Portela precisaram criar uma casa cenográfica inteira. “Quando o lugar já existe e interferimos nele, já é uma criação difícil, mas quando partimos do zero, como foi fazer a casa de D. Maria, a coisa é ainda mais desafiadora”, avalia Dantas, que também ressalta a generosidade da população de Garanhuns e Lagoa do Ouro em emprestar peças cenográficas.

Isabela Cribari calcula que não consegue finalizar “Azul” com menos de 120 mil reais. Para conseguir a diferença da quantia já garantida pelo Ary Severo, pretende inscrever o projeto em outros concursos de incentivo à cultura, inclusive no de Fomento ao Audiovisual de Pernambuco, com inscrições até próximo dia 27 (regulamento em www.fundarpe.pe.gov.br).

A SET Produções ainda deve trabalhar este ano com outros dois projetos. O curta “Cangaceiras”, de Isiane Mascarenhas, dando uma perspectiva feminina sobre o tema cangaço; e o novo filme do paraibano Torquato Joel, já em maio.

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