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Críticas

Persépolis

Uma mulher exilada de si mesma

Por Luiz Joaquim | 29.02.2008 (sexta-feira)

Longe da perfeição realista dos traços digitais e do humor leve de “Ratattouille” e “Tá Dando Onda”, seus concorrentes diretos na recente festa do Oscar, a animação franco-americana “Persépolis” (Persepolis, 2007) apresenta uma simplicidade plástica (mas não simplista) para contar a história autobiográfica de uma mulher iraniana. O nome dela é Marjane Satrapi, que também co-dirige a animação com Vincent Paronnaud. Os 95 minutos do longa-metragem, que pode ser visto a partir de hoje no Cinema da Fundação, é uma adaptação direta da mesma história em quadrinhos publicada por Marjane. A Companhia das Letras lançou, recentemente, uma coletânea em um único volume (R$ 39,00; 352 pág.) das quatro edições que serviram de referência para o filme.

Apesar da graça e também leveza com a qual Marjane conduz a história de sua personagem (também chamada Marjane), um espectador infantil provavelmente não terá a satisfação que encontra fácil nas produções da Pixar e da Sony Pictures Animation. “Persépolis” não é, como se diz, um filme família. As desventuras da alegre e espevitada menina Marjane, da adolescente contestadora e exilada, e da mulher em conflito com a própria identidade acabam por desenhar melhor na cabeça de um espectador adulto a gama de variações do que foi e do que se tornou a iraniana Marjane.

A primeira parte do filme conta com a inocência própria da infância, quando conhecemos a menina que nasceu em 1969, e mostra seu país na época em que era do domínio do xá Reza Pahlevi. Filha de pais de esquerda, Marjane traz também no sangue uma postura revolucionária, mesmo quando brinca de passeata dentro de casa gritando “Abaixo o Xá!”. Depois, com um pouco mais de idade, Marjane sai em busca de seus desejos, como qualquer pré-adolescente ocidental, dançando alucinada ao som do Iron Maden, ou catando fita-cassete no mercado negro do Irã, gerando um dos momentos mais cômicos do filme.

Dali, passa para a Revolução Islâmica (1979), e de lá para o exílio na Áustria, por conta de um período mais duro da guerra entre o Irã e o Iraque (1980-1988). Lá, Marjane começa a descobrir o mundo. Mas é um mundo que não é o seu. Falando um idioma que não lhe é comum, e num pais política e economicamente estável, ela tem de encarar não só os conflitos típicos da juventude – insegurança, timidez – como também o da discriminação pela sua origem iraniana. É nesse período também que a diretora dá dicas de suas primeiras experiências amorosas. A ternura e a mão deliberadamente feminina com a qual a diretora conduz as situações aqui têm deixado o público feminino extasiado.

É fácil de explicar. Marjane colocou na tela uma personagem universal. Desde suas conversas na infância com a avó, até o arrependimento do casamento por circunstâncias ideológicas, já adulta e de volta ao Irã, a personagem é coerente com o que há de mais preciso na definição de um ser-humano: a incoerência. Encanta exatamente por isso. Marjane se descobre e nós espectadores (mulheres em especial) nos descobrimos um pouco junto a ela. Ao entrar no cinema para ver “Persépolis”, além do traço descomplicado em preto e branco, encontramos gente do bem, como a avó da pequenina Marjane, que lhe aconselha: “Você vai encontrar muitos estúpidos na sua vida. Tenha paciência com eles, pois eles não têm culpa da própria estupidez”. Fazendo a voz da Marjane adolescente e adulta está Chiaria Mastroianni, filha de Marcelo Mastroianni com Catherine Deneuve, que também participa do filme dando voz a mãe de Marjane.

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