12° CinePE (2008) – noite 1 (longas)
Sobre a sublimação do desejo e sobre o Recife por Freyre
Por Luiz Joaquim | 29.04.2008 (terça-feira)
Na entrevista coletiva de hoje pela manhã, no Recife Palace Hotel, o cineasta Mauro Giuntini, fez uma grande preâmbulo para falar de sua primeira incursão num longa-metragem, o “Simples Mortais”, projetado ontem na mostra competitiva do 12° Cine-PE. O cineasta lembrou de como o Recife sempre o acolheu ao longo de sua carreira com três curtas-metragens – “Por Longos Dias” (1999, em 16mm); “Jardineiro do Tempo” (2002) e “Perfumado”, este o primeiro que fez em parceria com o roteiro de Di Moretti, que assina o roteiro do longa em questão. Diante da equipe e da imprensa, mostrou-se autenticamente emocionado ao salientar que era no Recife que queria perceber a reação do público, onde há uma “platéia real”, como disse.
“Exibimos o filme em Brasília numa mostra paralela, e o público de lá compete com a sessão. Não vem de peito aberto para a sessão. Aqui a platéia não só aplaudia em cena aberta como sorria no tempo certo, o que é muito gratificante quando você escreve algo cômico”, comentou.
“Simples Mortais” não é exatamente uma comédia apesar de alguns tópicos humorados. Trata mais de negociação dos desejos que qualquer ser humano tem de barganhar consigo mesmo ao longo da vida; ou, como ainda disse Giuntini trata da “idéia sobre a sublimação dos desejos”.
Ilustrando isso, temos três núcleos dramáticos espalhados pelos 80 minutos do filme. O de um pai cinquentão (Chico Sant’Anna), músico frustrado, que tenta educar o filho (o não-ator, músico Eduardo Morais, e revelação do longa). Temos a apresentadora de telejornal (Narciza Leão) desencantada com a profissão e desesperada para engravidar. E temos um professor de poesia, escritor frustrado (Leonardo Medeiros) às voltas com o casamento em decadência o com o desejo sexual por uma aluna provocante (Tatiana Muniz).
Funcionando em formato ‘multi-plots’ (expressão reforçada pelo diretor), “Simples Mortais” não aplica força para fazer os três módulos dramáticos se intrecruzarem, como é comum em obras assim. Cada uma das três tem sua força dramática, e tem certa autonomia e tensão particular. Parece não ter havido dúvida sobre o destaque para a história levada por Sant’Anna e Morais, que mostram uma empatia imediata quando aparecem na tela.
GUIA – Apesar do início tardio, às 23h10, o fidelíssimo público pernambucano para filmes pernambucanos permaneceu no Cineteatro para acompanhar a première de “Guia Prático Histórico e Sentimental da Cidade do Recife”, de Leo Falcão. Pontuado pela leitura feita por figuras célebres da sociedade local a trechos do livro homônimo de Gilberto Freyre, escrito em 1934, o filme desenha com imagens e sons para os dias hoje aquilo que Freyre desejava colocar sobre sua cidade não só para os turistas mas para os próprios recifenses.
O resulto é positivo. E tem, conforme discutido na entrevista coletiva hoje pela manhã, o mesmo ritmo e exposições de contradições sobre o Recife e sobre os recifenses. Contradições que permeiam a obra de Freyre também. A primeira impressão que salta aos olhos é o ótimo olho de Tuta (Roberto Santos Filho), como diretor de fotografia, que enquadrou a cidade por ângulos inusitados, pouco visto, ou lembrados, para lugares já tão comuns aos habitantes da cidade.
Para intercalar e pontuar a leitura do livro de Freyre, Leo Falcão e Fernando Weller (co-roteirista) deram como opção o depoimento de personagens reais da cidade (algumas delas bem conhecida pela população local) que vivencia Recife. “Pensamos em pessoas que pudessem falar da mesma forma que Freyre falava da cidade, ou seja, pessoas que experimentaram a cidade. Não queríamos o discurso pronto”, explicou Weller.
“Guia Prático…” nos chega, inegavelmente, como um trabalho concebido por razões institucionais (por encomenda da Fundação Gilberto Freyre em parceria com a Secretaria de Turismo da Prefeitura do Recife). Mas há também a percepção de que temos um trabalho feito com carinhoso olhar cinematográfico e respeito pela imagem, pelo tempo, e pelos personagens, bem cuidados e respeitados.
——————
Tapioca
Em entrevista coletiva na manhã de hoje, o representante de Fundação Gilberto Freyre, instituição responsável pela produção do “Guia Prático Histórico e Sentimental da Cidade do Recife”, deu a seguinte resposta para a pergunta ‘quanto custou o filme?’: “Custou 60 mil tapiocas. Vocês se virem para saber quanto custa uma tapioca aqui na cidade. Tapioca de cocô”.
0 Comentários