18o. CineCeará (2008) – 2a. noite
Conflito entre geração e confronto com Pinochet
Por Luiz Joaquim | 12.04.2008 (sábado)
FORTALEZA (CE) – A segunda noite de competição no 18º CineCeará, ontem, abriu com a co-produção entre o Chile e os EUA, “Special Circunstances” , da estreante Marianne Teleki, esposa de Héctor Salgado, sobre quem este documentário se debruça. É um filme peculiar. Segue a linha de docs como “33”, do Kiko Goiffman, ou “Passaporte Húngaro”, de Sandra Kogut, mais pelo fato de tomar a própria vida como mote para uma pesquisa audiovisual, um acerto de contas, do que pelo tema.
A estrutura formal, entretanto, se aproxima mais do que Michael Moore promove em seus filmes, com a câmera invadindo a privacidade de seus entrevistados e como um instrumento de constrangimento contra os personagens que ela expõe.
Mas, ao contrário do diretor de “Sicko”, Héctor tem sua história de vida como aliada e álibi para incomodar e atiçar seus entrevistados. Eles são militares chilenos responsáveis pelo prisão do diretor, quando adolescente aos 16 anos, e pela morte de seus colegas durante a ditadura de Pinochet.
Héctor e Marianne viajam até Tomé, pequena cidade litorânea chilena, onde ele vivia na juventude e rememora o trauma que ali passou, sob tortura até sair para o exílio nos EUA aos 19 anos, além de ir em buscar dos seus algozes. Inicialmente, o plano é conversar cara-a-cara com eles e repassar a limpo o que aconteceu. Mas, diante da negativa de todos eles permitir aproximação, passa então a invadir a privacidade ao estilo `Moore` de abordargem.
Mais uma vez, Héctor ganha respeito pela legitimidade de sua causa, que é a de passar a limpo mais um crime velado da ditadura latinoamericana.
Logo depois, fomos do Chile para a Espanha pelas mãos do jovem diretor Victor Garcia Léon (32 anos). “Vete de Mí” (Esp., 2006) conta a história do ator de teatro sessentão Santiago (Juan Diego) que se vê obrigado a receber o filho Guillermo (Juan Diego Botto) que, aos 30 anos já começou (sem concluir) faculdade de jornalismo, de biologia, além de ter tocado numa banda, e ter sido empresário de DJs.
Desempregado e brigado com a mãe, com quem vivia, Guillermo tenta refúgio na casa de Santiago, que divide um apartamento pequeno com uma mulher 25 anos mais jovem. Independente da situação inercial para a vida profissional do filho, Santiago hostilza de imediato a presença do filho.
A situação só reforça o lado egoísta do pai, que na realidade esconde uma frustração em viver por atuar em peças cômicas e corriqueiras quando sua ambição está em Becket e Shakespeare. Santiago se acredita um infeliz, só não havia se dado conta ainda.
O filme de Garcia Léon é interessante não só por salientar um problema cada vez mais frequente na Europa, em particular na Espanha – que é a dos filhos trintões ainda morando com os pais – mas também faz uma inversão interessante de situação. Se no primeira metado do filme Guillermo é irritantemente incômodo com sua postura imatura e relaxada com relação ao futuro, na outra metade, Santiago, incensado pela liberdade irresponsável do filho, tenta se libertar das frustrações e jogo tudo para o alto, gerando situações cômicas e melancólicas.
Na administração deste duas propostas de comunicação (o riso e a tristeza) com o espectador Garcia Léon não dosa bem o ‘timing’ dos dois, com especial destaque para a estupenda interpretação de Juan Diego (será o melhor ator do CineCeará 2008?), como o pai.
Longa tem um final aberto belíssimo (que parece ter decepcionado o público cearense), com pai e filho, já cúmplices nas ciladas da vida, compartilhando intimidade sem palavras, apenas por um autêntico gesto de confiança e carinho mútuo.
Quem representa o filme no evento é Buster Franco, montador de “Vete de Mí”, neto do cineasta espanhol Jass Franco (Jesus Franco), veterano autor de dezenas de filmes de horror por lá, que fascinam Carlos Reichenbach, presente em Fortaleza para apresentar sua “Falsa Loura”, amanhã, 13.
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