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Críticas

A Vida dos Outros

Big Brother Socialista

Por Luiz Joaquim | 04.04.2008 (sexta-feira)

Essa talvez seja uma semana positivamente emblemática para a curadoria da sala Fernando Spencer, no Cine Rosa e Silva (Recife). Com a estréia hoje de “A Vida dos Outros” (Das Leben der Anderen, Alem., 2006), além de “Paranoid Park”, o espaço dedicado a filmes “alternativos” do local dá ao espectador três ótimas opções, se contarmos também com “A Casa de Alice”, desde a semana passada, na sua programação.

O alemão dirigido por Donnersmarck ficou conhecido no planeta pela chancela alcançada graças ao título de Oscar de melhor filme estrangeiro 2007. Seria uma boa carta de apresentação? Se o filme de Donnersmarck serve de exemplo, a resposta é sim.

Assim como “Adeus, Lênin!” (2003), ou mesmo os romenos “4 meses, 3 semanas, 2 dias” e “A Leste de Bucareste”, “A Vida dos Outros” olha para a história recente de seus país a partir de um caso solitário sobre um ficticio autor teatral, para simbolizar um estado opressor vigente na Alemanha Oriental de 1984. Mais: para apresentar a arte como um instrumento que restitui a humanidade.

No caso, é o vies humanista do interrogador da Stasi (polícia política) Wiesler (o excelente Ulriche Müher) que o filme quer acompanhar. Ele é um socialista sério, reto, que acredita no sistema para levar sua república ao triunfo, mas é também um anacrônico numa RDA já politicamente saturada em 1984; com partidários céticos, sem idealismos, mas ainda sob o julgo de um regime duro.

O trabalho de Wiesler é exatamete arrancar dos ‘suspeitos’ alguma pista que indique uma traição à República para daí isolá-los por nove meses, se for o caso.

É a ele que o ministério da cultura recorre para colher provas contra o talentoso dramaturgo Dreyman (Sebastian Koch), bem visto na Alemanha Ocidental, mas também respeitado na Oriental por não criticar o sistema.

Para pegar uma simbologia conteporânea da televisão, podemos dizer Dreyman vira vítima de um Big Brother TV em sua própria casa, quando sua vida é acompanhada (apenas com escutas, sem câmera) e relatada 24 horas por Wiesler. Na realidade, o dramaturgo é espionado pelo capricho do ministro, que cobiça a atriz Christa-Maria (Martina Gedeck, sensual), musa e namorada de Dreyman.

Wiesler não só discorda da razão dessa investigação, como, no seu papel de ‘Pedro Bial’ da Stasi, vai ter contato com a beleza da arte, seja pela literatura, quando lê o poêma “Erinnerung an die Marie A”, de Brecht, que rouba de Dreyman, seja pela música, quando o escuta no piano tocando “Sonata para Um Homem Bom”.

Com ressalvas para a trilha sonora Stéphane Moucha e Gabriel Yared, que se faz notar mais do que o necessáro, principalmente na seqüência final, “A Vida dos Outros” é mais um belo exemplo de trabalho sério para ser rever a própria história recente sob uma perspectiva diferente, coisa ainda incipiente no atual cinema brasileiro.

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