12° Cine-PE (2008) – noite 5 (curtas e longas)
Comunidade quilombola encanta o Cine-PE
Por Luiz Joaquim | 03.05.2008 (sábado)
È provável que a maior comoção coletiva neste 12° Cine-PE tenha acontecido na noite de ontem (02 de maio), durante a projeção do curta em digital “Até Onde a Vista Alcança”, do pernambucano Felipe Peres Calheiros. Logo em sua apresentação, Felipe angariou simpatia com sua reverência aos cerca de 60 quilombolas, também no palco, oriundos de Sambaquim e Riachão de Sambaquim, município de Panelas, a 201 quilômetros, do Recife.
O grupo de senhores, senhoras, jovens e crianças de lá protagonizava o filme que inicia pincelando questões políticas, sobre o direito de posse daquelas terras, e também sobre as atividades festivas daquela comunidade. O curta guanha uma nova cor e beleza com a viagem de ônibus feita pelo grupo a uma praia de Alagoas. Com a alternância de fotografias em P&B, Felipe vai nos colocando dentro da felicidade e o alumbramento dos personagens, alguns já idosos, que vêem o mar pela primeira vez. É suave e comovente e tem boa trilha-sonora.
Além do ótimo cinema-fantástico “Um Ramo”, de Juliana Rojas e Marco Dutra, “Trópico das Cabras”, de Fernando Coimbra, chamou atenção não só pelas impecável qualidade técnica (atuações, fotografia [de Lula Carvalho], som, trilha sonora, montagem [de Karen Akerman], etc.), como pela proposta dramática e estética. Aqui um casal parte numa viagem pelas estradas do Brasil em busca de salvar o relacionamente. No percursso, uma inesperada mudança de comportamento sexual altera os planos do casal.
LONGAS – Isa Albuquerque subiu ao palco do Cineteatro Guararapes para apresentar seu longa em competição, “Ouro Negro”, fazendo menção a sua participação em 2002 neste mesmo evento com o seu “História do Olhar” (que deu o ‘Passista’, troféu da época, para Fernanda Maiorano, como atriz revelação).
Difícil falar de “Ouro Negro” sem recordar “Sangue Negro”, de Paul Thomas Anderson. Não por uma similaridade com a primazia cinematográfica do norte-americano, mas pelo tema que concentra-se na perseguição empertigada de João Martins (Danton Melo, limitado) em busca de petróleo em Alagoas e na Bahia na primeir metade do século 20, ao mesmo tempo em que tenta combater intrigas de companhias estrangeiras e a corrupção nacional.
É claro que o filme de PT Anderson não deve ter servido de referência para Albuquerque, já que os dois filmes eram projetos que corriam concomitantemente, mas é impressionante algumas poucas semelhanças na prosprosta dramatúrgica. Seja quando José Gosh (Odilon Wagner) ensina às crianças que ‘o melhor negócio do mundo é petróleo bem administrado’, ou quando ele recebe propostas de emprego de majors norte-americanas, ou ainda quando Jão Martins vê sua obra queimando numa explosão.
Apesar de um tema rico em explorações visualmente dramáticas (vide “Sangue Negro”), é triste perceber a falta de pulso na direção de Albuquerque. Há aqui uma esforço claro na direção de arte de Alexandre Meyer, mas, ao mesmo tempo, há o conflito assustador entre a montagem inquieta e nervosa (feita a machadadas, me parece) de José Rubens Hirsch, contra a perturbadora (no mal sentido) trilha-sonora de Flávia Ventura e David Tygel (o preferido de Sérgio Rezende). Lamentável.
Colado com a exibição em 35mm de “Ouro Negro”, tivemos a projeção em digital de “Que Baque É Esse”, obra de Climério de Oliveira e Nilton Pereira – que não subiram ao palco para apresentar o terceiro e último longa que concorria na Mostra Pernambuco. Para uma sala de no máximo 400 pessoas, o documentário deu seu ponto de vista, nada inovador, para o cansado, em termos audiovisuais local, tema do Maracatu pernambucano.
Antes da projeção dos longas, o homenagenado Luís Carlos Barreto recebeu a Calunga de Ouro das mãos de Roberto Farias, de quem fez questão de ressaltar sua parceira no roteiro que escreveu para “Assalto ao Trem Pagador” (1962). Barretão fez um discurso longo e empolgado, diferente daquele que proferiu há duas semanas no CineCeará, onde também foi homenageado.
Concentrou sua fala no momento triste em que se encontra o cinema brasileiro no que diz respeito a comunicação com o público. Disse que ‘cinema não é conteúdo’ (?) como querem fazer acreditar alguns. Discursou sobre a necessidade de acessibilidade do povo às salas de cinema, defendendo a meia-entrada para todos. E, nostalgicamente, lembrou dos anos 1970, quando “o cinema chegou a atrair 40% do público para filmes nacionais”. Concluiu dizendo que almeja a imortalidade, e que nunca desistirá de lutar pelo “nosso” cinema. Num momento menos eufórico, leu num papel o nome de Fernando Spencer e o ressaltou como grande crítico pernambucano dos passado, além dos ‘novos’ talentos no Estado como Cláudio Assis, Lírio Ferreira, Marcelo Gomes e Paulo Caldas.
Curiosidade
A edição 2008 do Cine-PE trouxe de volta quatro realizadores que estiveram aqui em 2002: Tabajara Ruas (Netto Perde Sua Alma / Brizola: Tempos de Guerra), André Sturm (Sonhos Tropicais / Simples Mortais), Isa Albuquerque (Histórias do Olhar / Ouro Negro) e Lais Bodanski (Bicho de Sete Cabeças / Chega de Saudade).
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