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Críticas

Décimo Segundo

Curta de Leonardo Lacca

Por Luiz Joaquim | 04.08.2008 (segunda-feira)

Abaixo a busca pelo sentido estrito de um filme! Abaixo a explicação ipsis litteris de um roteiro! O cinema é proporcionalmente mais potente na medida em que permite seu espectador deflagrar vôos audaciosos pelo próprio limite de percepção e interpretação do que se desenrola a sua frente. “Décimo Segundo”, curta-metragem de Leonardo Lacca, propõe isso.

Contando a história do reencontro, após longa data afastados (supõe-se), de um casal vivido pelos atores Rita Carelli e Irandhir Santos, o filme dispensa informações mais detalhadas sobre a tensão que circunda os dois. Ambos são/estão quase mudos e sem reação diante da concretude do reencontro em si. O reencontro, afinal, é mais eloqüente que qualquer outra fala (que não é dita) ou qualquer artifício de montagem.

Quase sem fala e quase sem intervenção de edição (música não há), restam, então, a câmera com sua liberdade de movimentação e os atores com seu poder de personificação. No primeiro caso, a fotografia feita por Marcelo Lordello obedece a difícil postura de um olho inquieto, e quase consciente da gravidade que sufoca o ar entre o casal.

Nesses conflitos do olhar, entre o casal, entre a câmera e o casal, entre a câmera e Carelli e, principalmente entre a câmera e Irandhir, Lordello flutua com elegância, nunca esquecendo a importância dramática da cromaticidade da luz e, conforme for, da frieza com a qual essa luz pode compor uma atmosfera. Pelo enquadramento e movimentos de sua câmera, somos, nós espectadores, aqueles que desejam entender o que se passa na cabeça do casal impotente.

No segundo caso, é pela comunhão entre a direção de Lacca com seus atores que temos uma interpretação adequada e promotora de rápida empatia. Enquanto o papel de Carelli ocupa seu lugar de figura diplomática e distante na relação aparentemente maculada no passado entre os dois, o personagem de Irandhir é dono de seu próprio mundo. É um mundo intransponível pela câmera insistente de Lordello, mas é também um mundo claramente incomodado com o que está posto, e expressado com exatidão pela contenção deste ator extraordinário.

Por essa competência Lacca e equipe garantiram o reconhecimento da melhor direção dentro da competição de curtas-metragens no último festival de Brasília. Era a 40ª edição do evento, que contemplava dessa forma a sintonia precisa para se criar uma fantasia velada de um casal numa cozinha, sem fala, sem música, quase sem cortes, mas abundante em sugestão emotiva.

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