O Mistério do Samba
Roda de Samba em projeção digital
Por Luiz Joaquim | 12.09.2008 (sexta-feira)
Em “Rio 40 Grau” (1954), de Nelson Pereira dos Santos, o encerramento do filme corre ao som do samba “A voz do morro”. Recheado de sambistas, o cenário mostra um morro carioca festivamente decorado para o ensaio de uma escola de samba. Há no conjunto destes elementos uma beleza que não se explica, ao mesmo tempo em que, a seqüência, por si só já explica a alegria indissociável ao povo brasileiro. A cena podia ilustrar o que diz Paulinho da Viola a Marisa Monte em “O Mistério do Samba” (2008) – documentário de Carol Jabor e Lula Buarque de Hollanda estreando hoje no Cinema da Fundação.
Na fala, o músico lembra quando presenciava a Velha Guarda da Portela reunida em festa, na sua concepção original nos anos 1970, e não conseguia descrever em palavras o que acontecia ali. “Alguém pode até explicar, mas não vai ser o mais importante”, diz. O nome de Paulinho e Marisa, além do de Zeca Pagodinho, estampam grande no cartaz do filme, mas não se deixe enganar pois as estrelas mesmo são Áurea Maria, Cabelinho, Casemiro da Cuíca, David do Pandeiro, Jair do Cavaquinho, Marquinhos do Pandeiro, Monarco, Seu Argemiro, Tia Doca, Tia Eunice e outros.
Marisa Monte, que atua como pesquisadora musical aqui, já havia, há nove anos, gravado o disco “Azul”, com músicas inéditas dos sambistas. Imagens de seu arquivo pessoal, da época da pesquisa são, inclusive, utilizadas por Jabor e Hollanda. Mas a beleza mesmo de “O Mistério do Samba” está no elenco talentoso e carismático de Oswaldo Cruz, região carioca onde nasceu a Portela.
Duas coisas a atentar no filme: o som (como não podia deixar de ser numa obra assim) e a fotografia, de Toca Seabra. O som é especial pois, para não perder a leveza de um roda de samba, os realizadores gravaram a Velha Guarda cantando em lugares naturalmente difíceis de se registrar o áudio com qualidade. O resultado que se vê é brilhante. Na projeção digital, o som ocupa toda a sala do Derby revelando um perfeita edição, com a qual toda a fidelidade dos instrumentos e cantores pode ser saboreada.
Quanto à fotografia, Seabra merece parabéns por lembrar ao espectador que ali está um filme sério, onde a imagem diz muito. Nem é preciso esperar tanto. Já de início, somos submetidos a uma seqüência de lindos enquadramentos de Oswaldo Cruz. Imagens de um cotidiano suburbano, que só um olho delicado consegue perceber, assim com a melancolia de um samba que só os autênticos sambistas conseguem montar. A seqüência final, numa roda com os bambas, está lá aquela mesma beleza e alegria que Paulinho da Viola não teve palavras pra traduzir; um boa podia ser “contagiante”.
PS – sábado (13), às 19h30, o programa “Vitrine”, da TV Cultura, mostra os bastidores da gravação do documentário “O Mistério do Samba”.
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