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Festivais

42° Fest Brasilia (noite 4 e 5) – 2009

Declaração de amor ao Recife

Por Luiz Joaquim | 22.11.2009 (domingo)

BRASÍLIA (DF) – Só amanhã (segunda-feira) encerra a mostra competitiva aqui nesta 42º edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, mas já na noite de sábado, após projeção, havia nos bastidores uma confluências de convicções sobre “Recife Frio”, de Kleber Mendonça Filho, como o favorito ao prêmio de melhor curta-metragem em competição. Diante de um Cine Brasilia abarrotado de gente, espalhados inclusive sobre os degraus do cinema, Kleber ressaltou sobre esta produção que tomou mais de dois anos de sua vida: “É um filme muito pessoal sobre a minha cidade, e queria dedicar a sessão a Suzana (Amaral) e Marcélia (Cartaxo)”, fazendo referência à diretora e protagonista de “A Hora da Estrela” (1985), exibido em cópia nova na tarde daquele mesmo dia.

“Recife Frio” é uma declaração de amor ao Recife mas, pelo refinamento de seu discurso, talvez não seja tão facilmente assim percebido por alguns recifenses. Isso porque Mendonça utilize-se de um humor sofisticado para fazer rir de uma hipotética e muito triste reação daquela população caso um fenômeno climático afetasse a capital pernambucana, deixando-a apenas com poucas horas de sol por dia e, de resto, vivesse sempre abaixo de de 10 graus centígrados. Saindo do humor e entrando na melancolia da situação, o filme remete, claro, a como o Recife é pensado hoje, pelos próprios recifenses. Daí a força e lamento em seu discurso.

Não foi apenas pela exotismo do tema que esse lindo alienígena de 23 minutos deixou a platéia em Brasília numa excitação quase depravada – alguns, ao final da sessão berravam: “É ISSO AÍ RECIFE!” numa estranha intimidade que não possuem com a cidade. Há uma beleza cinematográfica em “Recife Frio” que sedimenta de vez o completo domínio do idioma “cinema” que possui o crítico e realizador pernambucano.

A partir de um documentarista argentino (Andrés Schaffer) que vai ao Recife registrar as mudanças sociais, econômicas e culturais da cidade em função do fenômeno, Mendonça transita com maestral fluidez de temas banais de adequação – como o artesão (Jr. Black) que faz seu boneco de barro agora com cachecol – para outros complexos, como uma nova postura imobiliária num Recife frio, que no Recife quente de hoje “achata sua população” e, numa lógica de arquitetura herdada da senzala, isola a empregada doméstica num cubículo com pouca circulação de ar.

Ao final, celebrando o talento e a beleza de Lia de Itamaracá – e com ela tudo o que pode de fato representar Pernambuco -, o realizador parece querer dizer, de forma quase transcendental, o que é realmente legítimo em termos cultural, ou seja, sua autenticidade. Atenção para a última imagem após todos os créditos finais. É uma ilustração visual que desafia o espectador recifense como uma imagem forte, que ficará marcada para sempre na sua cabeça.

Na noite de sexta-feira, outro pernambucano tirou o fôlego da platéia. Foi Camilo Cavalcante com seu “Ave Maria ou Mãe dos Sertanejos”, pelo qual desenha um quadro lúdico e plasticamente tocante do Sertão Central pernambucano, a partir da população do município de Serrita, quando bate as 18h horas e toca a música “Ave Maria Sertaneja”, por Luiz Gonzaga. O filme foi fruto de um oficina de cinema com os próprios moradores dali e é o segundo trabalho de um trilogia que começou em 2003 com “Avé Maria ou Mãe dos Oprimidos”. O terceiro, adiantou Camilo em entrevista, focará às 18 horas na vida da burguesia, ao som de uma “Ave Maria” mais clássica.

Junto ao curta de Camilo, foi exibido o brasiliense, “Dia de Greve”, Adirley Queirós, situando a cidade satélite Ceilândia socialmente dentro de um contexto da Capital Federal. O ponto de partida é uma desorganizada greve de serralheiros que deixa a mostra a própria desarticulação daquela comunidade para conseguir avanços sociais. Junto a “Recife Frio”, projetou “Verdadeiro ou Falso”, de Jimi Figueiredo, sobre como o conceito das duas palavras do título podem interferir nas consequências das coisas, e particularmente no amor.

LONGAS
Sexta-feira, o documentário “Quebradeiras”, do paulista Evaldo Mocarzel, apresentou uma guinada em sua habitual produção de documentários, que primava pela palavra. Sem a palavra falada, apenas a cantada, Mocarzel passa 71 minutos mostrando as quebradeiras de coco do Pico do Papagaio, no Maranhão. Declaradamente flertando com a estética experimental dos documentários mineiros, “Quebradeiras” cai em diversas armadilhas de conceitos como a já cansada “dilatação do tempo” a partir de imagens quase paradas, tornando-se um arremedo de experimento que cai no vazio de imagens inegavelmente lindas, mas sem um destino certo, e ainda ajustadas por um estratégia formal na montagem que não se apercebe que está presa a uma repetição de ir do plano aberto para o plano fechado, e depois para o close de um ângulo inusitado, para assim conseguir dar dinamicidade a algo que nem é tão dinâmico assim.

No sábado, Geraldo Moraes mostrou seu “O Homem Mau Dorme Bem”, que poderia se chamar ´o homem bom não dorme´. Isso porque tudo gira em torno de uma palhaço de circo (Luiz Carlos Vasconcelos) que se resguarda para sua amada, alimentado pelo desejo de se vingar contra aqueles que o afastaram dela. Geraldo brinca com o presente e passado em seu roteiro, mas transita bruscamente entre eles de forma mais prejudicial que benéfica para seu espectador. Rodado em Brasília, o longa filme teve grande interesse da platéia do Cine Brasília.

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