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Críticas

Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo

Um salto num abismo chamado sertão

Por Luiz Joaquim | 28.05.2010 (sexta-feira)

É sempre difícil escrever sobre aqueles filmes que não contam nenhuma história e nessa não-história tem-se todas as histórias do mundo. Difícil de entender? Bom, é difícil porque nem tudo é suscetível à tradução por palavras. Felizmente não é preciso muita elobaração intelectual para usufruir do prazer cinematográfico e humano contido em “Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo” (Brasil, 2009), de Marcelo Gomes e Karin Aïnouz, estreando hoje, no Cinema da Fundação.

É nessa simplicidade discursiva – disfarçando uma elaboração narrativa refinada – que reside uma das belezas de uma obra cinematográfica. Fruto de imagens de arquivos feitas no ano 2000 por Gomes e Aïnouz (e outras captadas recentemente) – para o projeto “Sertão Acrílico de Azul Piscina”-, o longa “Viajo…” tem sido descrito como um road-movie: designação para filmes em que quase tudo acontece na estrada, em transito. Mas é, para este caso, um descrição muito redutora.

Isso porque, no filme, o protagonista José Renato (Irandhir Santos), geólogo de 35 anos que viaja sertão adentro, somos nós. Não é de hoje que a idéia de uma voz em off no cinema – quando a escutamos mas não vemos quem fala – tem a mesma força de um narrador onisciente na literatura, ou seja, o que é dito por essa voz é verdade interior e, por isso, é verdade inquestionável. Gomes e Aïnouz levam essa idéia aqui ao extremo, mas sem nunca passar do limite do bom gosto.

Nessa longa e solitária viagem, José Renato nos faz lembrar o tempo inteiro que conta os dias para voltar aos braços de sua “galêla”. Sua lembrança e crescente saudade só faz contrastar com a aridez da natureza ao seu redor. Muito lentamente, vamos entendendo que, na verdade, seu desejo é mais um sonho e menos algo palpável.

A suavidade da transição dessa informação flui pela combinação brilhante do texto em precisão cirúrgica do roteiro com a narração forte, grave, intensa na voz de Irandhir. Há também a marcação lenta no ritmo do filme, que na verdade segue em harmonia com o próprio ritmo do protagonista e, obrigatoriamente, embriaga o espectador positivamente.

Além disso, de nos fazer mergulhar na cabeça de um homem sozinho e solitário em meio ao nada, a dupla de diretores também nos dá, sim, um road-movie de fato, no sentido de que o olhar de José Renato é o nosso olhar diletante sobre o que há de tradicional fundindo-se com o que há de moderno nesse lugar – que pode ser místico e libertador – chamado sertão nordestino. Tão libertador quanto o salto de um clavadista de Acapulco.

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