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Críticas

Coco & Stravinski

Requinte e emancipação

Por Luiz Joaquim | 01.10.2010 (sexta-feira)

Quantas nuances vindas da combinação entre o preto e o branco podem existir? A arte que ilustra a abertura dos créditos de “Coco & Stravinski” (Coco Chanel & Igor Stravinski, Fra., 2009) em cartaz no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco, aproveita estas possibilidades para criar um hipnótico caleidoscópio nas duas cores e adiantar, já ali, o nível de requinte e equilíbrio estético que está por vir neste filme de Jan Kounen.

A beleza fria da arte da abertura dá espaço, na sequência imediata, para um maestral registro cinematográfico da encenação de “A Sagração da Primavera”, de Igor Stravinski (Madds Mikkelsen). É Paris, 1913, e os ritmos modernamente dinossantes de Igor incomodam profundamente àquela platéia acomodada à melódias tranquilas, que não se contém e transforma a apresentação num histórico escarceu. Com a mesma eloquência de Stravinski, Kounen movimenta sua câmera e corre com sua montagem de maneira que a imagem aparece com a mesma força dos acordes pensados pelos compositor. Impressiona como, apenas nessa sequência, o realizador transmite sem nenhuma palavra dita a perfeita proporção entre beleza e audácia do compositor contra a incompreensão de seu público.

Mas, entre a platéia, estava Coco Chanel (Anna Mouglalis) que vê no atrevimento musical do russo uma similaridade com os planos que tem para a moda. Se a música de Igor soa libertária e libertada de qualquer regra existente, Coco também quer impor sua personalidade aos seus vestidos e perfumes, redifinindo a elegância feminina.

Sete anos depois, Coco é apresentada a Igor oferecendo-lhe, e a sua esposa com sua meia duzia de filhos, uma casa de campo para que ele viesse a trabalhar em novas composições. É aí que inicia propriamente o que interessa ao diretor Kounen. Por frente a frente, com o desejo sexual no meio, dois ícones da criação, cada um em sua idiossincrasia e seus limites. Nas performances de Mikkelsen e Mouglalis (com sua voz de arrepiar, no bom sentido), temos aqui outra combinação quente, que enche a tela pela figura lângida dela e reta dele. Em suas diversas sugestões cinematográficas, “Igor & Stravinski” faz também um paralelo entre Igor e Coco nos bosques franceses, com a propria pertubação sugerida pela “Sagração” do compositor.

Há ainda uma figura fundamental nessa história, o terceiro pé do triângulo, chamado Katarina, a esposa traída e silenciosamente assustadora vivida por Yelena Morozova. No seu olhar sem sobrancelhas, a russa é o perfeito retrato da resignação, quando, ao mesmo tempo em que percebe perder seu marido, não compreende a emancipação da rival Coco. Nisto, seu personagem remete ao de Julie Delpy no ótimo filme polonês “Varsóvia Ano 5703” (1992).

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