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Críticas

Um Doce Olhar

Estreia no Cinema da Fundação (Recife)

Por Luiz Joaquim | 29.10.2010 (sexta-feira)

O olhar infantil diante da crueza da vida adulta é uma escolha potente no filme “Um doce olhar”, (Bal, Turquia, 2010), trabalho turco que coloca uma criança no meio de um furacão de dores e perdas afetivas. O longa-metragem de Semih Kaplanoglu é na verdade a terceira parte de uma trilogia sobre reminiscências de um tempo familiar e de perdas íntimas: “Ovo” (2007) e “Leite” (2008) – “Bal”, o título original deste novo trabalho, significa “mel”. É curioso perceber que as outras duas obras não entraram no circuito nacional, e que esta narrativa vem essencialmente por causa da recente conquista do filme no Festival de Berlin.

“Um doce olhar” é um tipo de filme silencioso, composto por fragmentos aleatórios de imaginação em constante movimento lúdico, que reproduz a sensação particular de uma criança diante da dureza e da inevitabilidade da vida adulta. A história gira em torno de Yusuf (mesmo protagonista dos outros dois filmes, com variações na idade). Ele tem uma conexão rara com seu pai, ligação afetiva exposta numa bela cena em que Yusuf sussurra para ele um sonho aparentemente terrível. Eles e a mãe de Yusuf moram numa pequena região da Turquia. A certa altura, o pai do jovem protagonista vai buscar mel, e não volta. É o conflito da ausência que guia o filme.

A paisagem ampla da floresta em que se passa boa parte do longa-metragem é o cenário de dramas internos dos personagens. Há uma aura de fábula infantil nesse espaço mítico, de mistério e a iminência da melancolia. Outro cenário que se repete ao longo da narrativa é a escola de Yusuf, local onde um jogo de intrigas, e sua resolução de carinho extremo, mostram esse filme possui um olhar humano elevado destinado aos seus personagens.

O uso do sonho ao longo do filme é uma recorrência que parece insinuar que o crescimento de Yusuf está atrelado à ideia de pesadelo. O sonho funciona, ainda, como um tipo de alternativa criativa para a montagem da cena final, em que um fato específico é revelado. Nessa cena, o poder sugestivo da montagem cinematográfica, escolhendo onde é o corte e o que fica de fora da imagem acabam por explorar, em sua potência emotiva máxima, que a inocência infantil é uma qualidade efêmera.

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