O Primeiro que Disse
Entre o amor da família e o amor próprio
Por Luiz Joaquim | 11.03.2011 (sexta-feira)
Com uma pequena mas já interessante carreira na Itália, o cineasta Ferzan Ozpetek finalmente chega ao circuito comercial do Brasil pelo filme “O Primeiro que Disse” (Mine Vagane, Ita., 2010), entrando em cartaz no Cine Rosa e Silva hoje. Como no anterior “Un Giorno Perfecto” (2008, inédito), pelo qual Ozpetek volta seus olhos para uma jovem e em crise família romana, em “O Primeiro que Disse” é também a tensão que aproxima e afasta uma família (esta mais tradicional) o mote que o sustenta.
Mas há uma estopim que desencadeia a tensão nesta tal família que vive numa pequena cidade ao sul da Itália e administra uma fábrica de massa há mais de 40 anos. Tudo começa quando o caçula Tommaso (Riccardo Scamarcio), que reside em Roma – e deseja ser escritor ao final de seu curso de Letras -, decide anunciar ser homossexual. A certeza de uma resposta hostil por parte dos pais é tão certa que, mesmo antes do anúncio, Tommasio deixa as malas prontas sabendo que será deserdado e expulso do clã. Mas ele não se importa. Seu mair desejo é viver em paz com seu namorado em Roma.
Eis que seus planos são frustrados por Antônio (Alessandro Prezioso) irmão mais velho que, num jantar, faz o mesmo anúncio. Revela, a mesa, ser gay antes mesmo de Tommaso abrir a boca. Após, previsivelmente, seu pai expulsar Antônio de casa, o velho sofre um infarto o que deixa Tommaso preso não só ao município como também à família e à fábrica, cujo futuro depende dele, segundo seu frágil pai.
Importante ressaltar que, apesar do tema sério, Ozpetek, que assina também do roteiro, dosa todo o filme com um humor fácil (num bom sentido). Seja pela ignorância do pai e da mãe de Tommaso a respeito da condição homossexual (“Tem cura?” pergunta a mãe), seja pela tia solteirona que sempre espera um ladrão para seduzi-lo, seja pelos amigos gay de Tommaso, que vão em busca dele no interior e tentam disfarçar sua “alegria” de viver para a família do amigo.
Um forte mérito no filme de Ozpetek é exatamente não pintar o drama com tintas muito forte (e ainda assim não minimiza a importância da questão) ao mesmo tempo em que não trata o mesmo assunto com banalidade e piadas fáceis. Num modelo clássico de cinema cômico italiano, apresentando uma família grande, com todos falando alto e ao mesmo tempo de forma bastante sanguínia, “O Primeiro que Disse” compartilha apenas outro personagem são além de Tommaso. É sua avó (a bela e elegante Ilaria Occhini), uma figura silênciosa que parece ser a única a enxergar o sofrimento do neto mais jovem, uma vez que ela própria guardava um segredo em sua juventude (cujo o filme, do início ao fim, vai dando dicas em seu decorrer).
É dela o conselho que vai estimular Tommaso a sair de seu desconfortável dilema que se divide entre manter a integridade da família e saúde de seu pai, ou encarar o mundo sem medos e viver seus amores. Da altura de sua sabedoria conquistada pela idade avançada, ela lembra ao neto: “Você não vai ser feliz enquanto só fizer o que os outros mandam você fazer. Lembre que o problema dos amores impossíveis é que eles não terminam nunca”. E isso é tão simples quanto é certo para homo, hetero, bi, pansexuais e qualquer outra categoria que venha a ser criada no futuro.
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