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Críticas

Estrada para Ythaca

Coragem para encarar a dor

Por Luiz Joaquim | 27.05.2011 (sexta-feira)

Há algo de sagrado que o filme “Estrada para Ythaca” (Brasil, 2010), realizado no Ceará pelos Irmãos Pretti e os Primos Parente, registra como poucos. E não estamos levando em conta apenas a cinematografia brasileira, mas toda ela tal qual conhecemos. Na verdade, não é este ‘algo’ que o filme trata como sendo raro, mas sim como o trata. Referimos-nos a amizade e, num segundo momento, à experiência do luto.

Integrantes do coletivo cearense chamado Alumbramento, as obras dos gêmeos Ricardo e Luiz Pretti e de Pedro Diógenes e Guto Parente, sempre olham para o humano e sua relação entre si e/ou com o seu ambiente, podendo este ambiente sugerir inquietações, mas não necessariamente definindo o filme. Nesse sentido, não obstante “Ythaca” ter sido filmado no Ceará, a obra oferece um alcance universal.

Não é à toa que, já na abertura, a drama apresenta as palavras do poeta grego do século 19, Konstandino Kafavis, resumindo que para entender este lugar (ou estado de espírito) chamado Ythaca é preciso persegui-lo até o fim, mas sem buscar entendê-lo, caso contrário você não o alcançará.

No enredo, são os próprios diretores que interpretam um grupo de quatro amigos que, numa noite de bebedeira em uma pequena cidade, parte em direção a um lugar desconhecido, tendo como leitmotiv a própria dor pela perda do recém-falecido Júlio, um quinto amigo do grupo.

Num carro “emprestado”, eles seguem interior adentro, tanto geograficamente quanto do ponto de vista humano. Nas refeições improvisadas, há sempre um quinto prato extra, como um símbolo da presença de Júlio. Os diálogos são escassos, cortados por uma frase ou outra do livro “O Melhor do Mau Humor”, que um deles (Pedro) sempre carrega. Quase não há ação, apenas reação, sendo esta a do sofrimento pela ausência do amigo. Um sofrimento, que invariavelmente, é consolado pelo carinho de um outro amigo.

Do ponto de vista cinematográfico, são diversas as estratégias que os Pretti e os Parente se apropriaram para emoldurar esse estado de sentidos, ou ainda dessa transição da tristeza para a libertação da tristeza. O espectador mais atento deverá perceber que “Ythaca” mostra dois momentos, sendo no primeiro a janela de enquadramento pequena em relação à tradicional proporção retangular de 1,85:1. E não só isso. Perceberá cores neutras e uma paisagem árida. É como uma concretização visual pelo luto que Luiz, Ricardo, Pedro e Guto precisam viver e expurgar até chegar a Ythaca, belamente representado no final.

Em tempo: a estreia hoje de “Ythaca” (no Recife, São Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Vitória, Rio de Janeiro) lança o projeto Sessão Vitrine, que promove a distribuição de títulos brasileiros longe do apelo comercial. Outras infos em (http://www.vitrinefilmes.com.br)

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