16° Cine-PE (2012) – noite 3
Mautner x 2
Por Luiz Joaquim | 30.04.2012 (segunda-feira)
Já se sabia que a noite de sábado do 16o Cine-PE: Festival do Audiovisual seria definitivamente especial para o compositor, musico, violonista, poeta, cantor e escritor Jorge Mautner. Isto porque ele iria rever não só o longa-metragem competitivo “Jorge Mautner: O Filho do Holocausto”, de Pedro Bial e Heitor D`Alincourt, agora diante da imensa platéia do festival (que naquela noite fez juz à fama), como também conheceria o curta-metragem de Afonso Oliveira e Marcelo Pedroso, “Maracatu Atômico: Kaosnavial”.
Não se sabia, entretanto, que a experiência do longa da noite também agradaria a platéia. Isto por consideramos a última participação de Bial no Cine-PE, em 1999, com seu pálido “Outras Estórias”, feito a partir da obra de Guimarães Rosa. Junto a D`Alincourt, Bial conseguiu não apenas cumprir bem a missão numero um de um documentário, informar o espectador sobre um tema, mas também entreter este mesmo espectador.
Pode-se dizer que não havia como errar fazendo um filme sobre um personagem tão rico, carismático e talentoso como Jorge Mautner; mas, na verdade, sabemos que são incontáveis a forma de ‘errar’ no cinema. Não foi o caso aqui. A dupla de diretores conseguiu, com recursos modestos, capturar os espectadores na aventura que foi a vida desse artista, tão emocionante desde a primeira infância, com seus pais fugindo da Europa nazista.
A estrutura visual para contar essa história é simples – e talvez por isso um pouco cansativa. Todas as entrevistas acontecem num cenário dentro de um estúdio, intercaladas com imagens de arquivo e apresentações musicais do cantor e de outros (Gil e Caetano) sobre suas canções. O trio, a propósito, relembra Londres à época das filmagens de “O Demiurgo”, dirigido por Mautner em 1970, o qual era considerado por Glauber Rocha como o melhor filme sobre o exílio.
Um pouco antes do longa-metragem, e antes da homenagem ao diretor Fernando Meirelles, que assistiu uma clipe do documentário “Cidade de Deus: 10 anos Depois”, de Cavi Borges e Luciano Vidigal, o público já experimentara um pouco de Mautner e entendera teoria cunhada em seus livros “Mitologia do Kaos” e “Amálgama Brasileira”. Mas aqui, no curta de Pedroso e Oliveira, o artista era apenas uma parte da atração. Ele aparece ao lado do mestre brincante Zé Duda.
Com distanciamento e olhar cinematográfico apurado, “Kaosnavial” consegue dar a dimensão certa, sem exageros, da beleza autêntica que existe na brincadeira da Zona da Mata (e a ancestralidade por trás disso tudo). Agregue-se aí a fotografia o tempo inteiro a serviço da beleza das cores do folguedo. O curta é sem dúvida um registro, ao mesmo tempo, elegante e emocionante deste universo.
O segundo curta da noite veio de Alagoas. “KM 58” trata de um exercício pela gramática do cinema sobre a dor da perda sofrida por um homem. É interessante e correto como um exercício cinematográfico, mas o estimulo é discreto para além disso. Na sequência, o veteraníssimo Jorge Furtado (não estava presente) apareceu com seu curta “Até a Vista”.
A inteligência, erudição e experiência de Furtado saltam aos olhos neste trabalho que, de tão rico, preenchem as mesmas emoções que um outro diretor menor só preencheria com a duração de um longa-metragem. No enredo, um cineasta iniciante do Rio Grande do Sul viaja a Buenos Aires para conseguir de um velho escritor os direitos de uma novela para transformá-la num curta-metragem. O velho aceita se o jovem levá-lo ao Pará para conhecer uma morena (Dira Paes, sempre ótima). Com humor e sem didatismo, Furtado consegue tecer seus comentários sobre o cinema brasileiro e ainda contar uma bela história sobre os percalços da criação artística.
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