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Críticas

Shame

Sexo em abundância, escassez de carinho

Por Luiz Joaquim | 25.05.2012 (sexta-feira)

Sexo. Esta será a palavra mais usada para falar de “Shame” (Ing., 2011), segundo longa-metragem de Steve McQueen (realizador inglês) que estreia hoje no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco. Sexo não é, entretanto, a palavra que melhor traduz o a história do personagem Brandon (Michael Fassbender). Solidão, na verdade, é o assunto em pauta aqui. Não a solidão por opção, mas pela incapacidade deixar-se envolver sentimentalmente pelo outro. Não a solidão pela timidez, mas pela inabilidade em associar carinho a sexo, e vice-versa.

Brandon – com Fassbender em performance magistral – é um personagem absolutamente triste. Isto apesar do que possa parecer e a despeito da sua não-percepção do problema que carrega consigo. Este bem sucedido executivo de Nova Iorque é bonito, sedutor, e tem uma muito ativa vida sexual com diversas mulheres. Soa atraente? Até poderia, se Brandon conseguisse se satisfazer. Mas isso não acontece. Não se trata de não conseguir atingir orgasmos, eles vêm, mas para Brandon o sexo nunca é suficiente.

Após uma aparente boa noite de sexo, por exemplo, ele se masturba logo em seguida. No trabalho, Brandon nem precisa acessar seu computador – sobrecarregado da mais pesada pornografia -, para também se masturbar mecanicamente no banheiro do escritório.

Não é a toa que a primeira imagem do filme é a dele nu, em sua cama. É um recado objetivo de McQueen logo na abertura, como um prólogo visual avisando do que está por vir. O detalhe a ser observado: ele está só.

A ideia por tras da compulsão pelo sexo para suplantar uma ausência mais grave na vida (de carinho, por exemplo), não é tão estranha, assim como também não é a compulsão por comida, ou chocolate, ou por fazer compras, etc., para tapar o mesmo buraco emotivo. Mas o interessante, entre outras coisas, em “Shame” é a combinação feita por McQueen usando o sexo para contradizer exatamente uma ideia universal relacionada a sexo, ou seja, a de um êxtase físico como forma de satisfação.

O pavio que vai acender o conflito na vida superficialmente perfeita de Brandon é a chegada de sua irmã mais nova, Sissy (Carey Mulligan, linda e mais uma vez num personagem arrebatador depois de “Drive”). Ela se aloja em seu impecável apartamento e bagunça sua aparente harmonia confrontando-o com doses explícitas de autêntico carinho.

O desempenho da dupla de atores é preciso tanto na frieza quanto nos momentos quentes (atenção para Mulligan cantando “New York, New York”). À propósito, McQueen – não confundir com o astro de “Bullitt”, falecido em 1980 -, reforça em “Shame” sua potência como diretor depois de receber a Câmera de Ouro (para o melhor diretor estreante) em Cannes por “Hunger” (2008).

“Shame” (‘vergonha’, em inglês), antes mesmo de chegar ao final, traz consigo no mínimo três grande momentos cinematográficos. Num deles, Brandon troca olhares com uma mulher no metrô. Tudo é conduzido sem nenhum diálogo, mas qualquer um irá entende perfeitamente o que está sendo “dito” ali. Num segundo momento, é a nuca de Fassbender e de Mulligan que vemos enquanto os irmãos Brando e Sissy discutindo no sofá. O texto dito pelo roteiro – também de McQueen – é forte e não precisamos do rosto dos atores para sofrer com eles. Na terceira situação, Brandon janta num restaurante com uma colega do trabalho. Mais uma vez o roteiro se sobressai, e impressiona a dramaturgia no “balé” entre os clientes e o garçon do restaurante.

De volta a Brandon e à sua condição, “Shame”, o filme deverá atordoar muita gente. Menos pelo sexo, mais pela condição de vazio que carrega seu protagonista. Uma das forças do filme é mostrar o problema de maneira triste (trilha sonora é correta aqui também) de uma forma afiada exatamente por não soar como um problema, mas sim (distorcidamente) como um mérito: “Sexo é bom = Ele tem uma boa vida: Não necessariamente”. O sexo na vida de Brandon não é um complemento, mas um objetivo. E é assim pois não há nenhum outro ‘algo’ a alcançar, ao menos do ponto de vista sentimental.

No epílogo, McQueen nos dá um final devastador. Compõe o retrato de um homem absolutamente só. E nesta composição está representada toda a gravidade do que isto significa.

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