A Primeira Coisa Bela
Acerto sentimental a italiana
Por Luiz Joaquim | 29.06.2012 (sexta-feira)
Não há nenhum cinema como o dos italianos para tratar questões familiares com tanta desenvoltura, leveza e graça. O Cinema da Fundação Joaquim Nabuco coloca em cartaz hoje “A Primeira Coisa Bela” (La Prima Cosa Bella, Ita., 2010), filme de Paolo Virzi que, por esta obra, concorreu ao título de melhor diretor no festival europeu de cinema há dois anos.
A estrutura usada na história escrita a três mãos por Virzi, Francesco Bruni e Francesco Piccolo não é nova. Começamos em 1971, numa pequena cidade litorânea quando o menino Bruno que acompanha, com a irmã pequena e seu pai, a sua bela mãe Anna (Micaela Ramazzotti) ser eleita a mais bela mãe da comunidade.
A eleição e seus efeitos desencadeiam a separação da família e um trauma no garoto, sempre vendo sua bela mãe sendo cortejada por vários homens (e atendendo-os). O trauma no garoto é mais perceptível em sua vida adulta.
Quase 40 anos depois, vemos o professor Bruno (Valério Mastrandeia) comemorar seu aniversário deitado na grama da praça, chapado de entorpecente, enquanto a noiva o espera para jantar em casa. Decidido a encerrar o relacionamento, Bruno recebe a visita da irmã que veio lhe informar do estado terminal da mãe Anna – na fase idosa, na pele da ótima atriz Stefania Sandrelli.
Relutante, Bruno volta à cidade de onde saiu na adolescência sem falar com a mãe. Ao chegar lá, as recordações tristes de sua infância vão surgindo e alternando com a forma como Anna encara a doença hoje. Muito além de apenas querer apresentar os efeitos de uma infância traumática moldando um adulto deprimido, o filme chama mais a atenção para como duas pessoas tão próximas podem encarar a vida de maneira tão distinta.
A figura de Anna (jovem e idosa) é solar. A de Bruno é lunar. Anna na juventude representa a mulher bonita e de espírito livre, combinação que facilmente ajudava a confundí-la com “vadias” no passado. Nada a ver com a boa mãe, que o filme exemplifica quando ela, mesma dilacerada pela violência dos homens, tenta acalentar e distrair os bambinos com uma música.
Para ela, a vida é algo a ser aproveitado, enquanto que Bruno cresceu sempre sentido-se responsável por algo, e entre este algo estava a irmã pequena. A fuga na adolescência o libertou da família, mas o aprisionou em remorso tornando-o um frustrado.
Um mérito do filme é contar as duas histórias, a do passado e a do presente, com uma fluidez competente. No fim da vida, ainda sedutora e tão cheia de vida que nem parece condenada a poucos dias pela medicina, Anna e sua morte funcionam como uma redenção familiar. Mais uma vez, sim, esta é uma fórmula gasta. Mas a mesma receita, sabe-se, pode render um bolo ruim ou bom. O detalhe aqui é que Virzi tem boa mão.
Outro mérito em “A Primeira Coisa Bela” é não exagerar na atmosfera da reconciliação familiar. Mesmo com uma trilha sonora insistente, mas calibrada, o filme conduz o espectador aos momentos certos, e encerra com um final solar, que vai deixar boa parte dos espectadores querendo dar um mergulho no mar.
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