45o. Brasília (2012) – noite 2
Pernambucanos fazem bonito em Brasília
Por Luiz Joaquim | 19.09.2012 (quarta-feira)
BRASILIA (DF) – Pode soar exagerado ou prematuro mas, com seu “Eles Voltam” – que abriu a competição de longas-metragens de ficção na noite de terça-feira aqui no 45o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro – o cineasta Marcelo Lordello, 31 anos, parece ter aberto a vereda para se trilhar um novo caminho temático no contemporâneo e deprimido cinema nacional.
Dono de uma consciência da força da imagem cinematográfica que, pela pouca idade, impressiona, Lordello reforça o que já tinha revelado com seu curta-metragem “No. 27” – que exibiu neste mesmo festival em 2008. Isto que o jovem diretor reforça é exatamente sua capacidade para casar as nuances da beleza imagética com uma dramaturgia de sutilezas. Dramaturgia seca e (por isso) forte. Econômica e (por isso) precisa. Honesta e (por isso) que reverbera dentro da cabeça.
Mas não é por nada dessas qualidades técnicas que “Eles Voltam” deverá ser lembrado. Estes aspectos apenas lhe creditam as vitórias conquistadas pela sua equipe. O que deverá fazer de “Eles Voltam” um filme inesquecível daqui por diante é aquilo a que propõe falar. Lordello fez um filme otimista. “Otimismo” é uma palavra quase que proibida dentro das intenções do que o cinema brasileiro nos últimos, talvez, dez anos vem nos oferecendo.
Longe da violência humana (plástica e psicológica), longe da depressão íntima, longe da opressão urbana ou política, “Eles Voltam” dá partida a um percurso oposto. Nele é possível a gentileza, a alegria simples, a tranqüilidade (como a sugerida por um bambuzal que “canta”), e a relativização das diferenças sociais.
São questões difíceis de convencer o espectador com dignidade audiovisual, sem apelar para a emoção fácil da lágrima. E o filme só alcança o êxito pelo absoluto controle de Lordello sobre a história da menina Cris (a bela e expressiva Maria Luiza Tavares).
Ela e o irmão mais velho, Peu (Georgio Kokkosi), são deixados pelos pais numa rodovia, no meio do nada (a situação já abre o filme numa solução de enquadramento perfeita para dimensionar o isolamento dos personagens). Depois de muita espera, Peu deixa Cris em busca de ajuda e nunca retorna. Começa então a peregrinação solitária da menina rica num mundo em que não é o seu, mas vai passar a ser, tornando-a mais madura.
Conhecendo a história da produção de “Eles Voltam”, ter um filme dessa qualidade pronto e competindo em Brasília é quase um milagre. Sabe-se que a ideia nasceu como curta-metragem a partir da contemplação em 2006 do prêmio de roteiros Ary Severo, da prefeitura do Recife (R$ 80 mil, menos impostos).
Cercado de amigos competentes – com a fotografia do cearense Ivo Lopes, o som do técnico Guga Rocha, a arte de Iomana Rocha, o figurino de Carol Oliveira, a preparação de elenco de Amanda Gabriel, e a precisa trilha sonora de Caçapa – Lordello deixou mais uma vez sua marca em Brasília, assim como o fez há quatro anos quando seu “No. 27” tanto impressionou Carlos Reichenbach (1945-2012), a quem o diretor radicado em Pernambuco dedicou a primeira sessão de “Eles Voltam”.
CURTAS
Com o intrigante “Câmara Escura”, curta-metragem que estreou aqui no Festival de Brasília, Marcelo Pedroso vai se firmando como a cabeça que no Brasil melhor problematiza, através de filmes, a questões da imagem nos dias de hoje.
Como uma espécie de “atentado audiovisual”, Pedroso deixava na soleira da porta de algumas mansões recifenses uma engenhoca criada por ele e depois ia embora. Trata-se de uma caixa de madeira com uma micro-câmera dentro. No dia seguinte, ele retornava para explicar a situação e resgatar a imagem. Ao diretor, interessava a reação, na intimidade, do proprietário ao se perceber “invadido” em seu território.
“Câmera Escura” concretamente se resume a exposição do funcionamento deste dispositivo e suas conseqüências (inclusive legais). Só que, mais do que isso, Pedroso nos põe para pensar sobre quem detém o direito da imagem. A quem e por quem foi delegado este controle audiovisual, e o porquê da imagem em movimento hoje ter chegado a um patamar que intimida tanto quanto uma arma de fogo.
Já “Canção para Minha Irmã”, que Pedro Severien exibiu na mostra local do Cine-PE em abril, finalmente ganhou o espaço que merece aqui em Brasília. Com destaque para a combinação das ruínas no município de Barreiros (PE) pelas enchentes de 2010 com a performance hipnótica de Sanda Possani, o filme vai ganhando admiradores e promete ainda mais marcar seu terreno.
Ainda na noite de terça-feira, foram exibidos o documentário de longa, “Um Filme para Dirceu”, da paranaense Ana Johann, e a intrigante animação curta “Linear”, de Amir Admoni, já exibido em Gramado 2012.
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