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Festivais

16o. Tiradentes (2013) – Lordello x Inácio

Saiba como foi o debate entre Inácio Araújo e Lordello

Por Luiz Joaquim | 20.01.2013 (domingo)

TIRADENTES (MG) – Encontro histórico aconteceu aqui na 16a Mostra de Cinema de Tiradentes na manhã deste domingo (20/01). Dentro do projeto que promove um debate entre um critico convidado e o realizador e equipe do filme exibido na noite anterior, o encontro se deu hoje com Marcelo Lordello e o critico de cinema do jornal Folha de S. Paulo, Inácio Araújo. Mediado pelo produtor, pesquisador e cineasta Francisco Cesar Filho, o debate contou ainda com Leonardo Lacca e Ivo Lopes, produtor e fotógrafo, respectivamente do longa-metragem “Eles Voltam”, a obra em questão.

O CinemaEscrito transcreve aqui os mais importantes itens levantados nessa conversa histórica.

Inácio abriu o debate revelando que sempre há um novo cineasta pernambucano surgindo com um primeiro longa-metragem, e nunca se decepciona com esse novo trabalho. “O que há em Pernambuco? Como se dá essa cinefilia? Ela é conjunta? Vocês trocam idéias?”, perguntava-se em voz alta Inácio.

Inácio disse que se surpreendeu pela apresentação de “Eles Voltam”, lembrando-se de “Alemanha Ano Zero” (1948), de Rossellini, assim também como várias obras de Bresson. “Acredito nessa proximidade com Bresson e na hiptose de uma redenção no final, da menina em “Eles Voltam”., disse.

Inácio também relativizou alguns pontos do filme pernambucano, em particular a ausência do irmão, que deixa uma menina sozinha na estrada. “Quando o irmão sai, o filme corre um risco de perder o interesse. E ainda, quando a menina passa de uma família para outra, ao encontrar e menina mais velha, na casa de praia vizinha, senti um enfraquecimento. As coisas começam a ficar confortáveis para a menina”, colocou o critico.

Lordello responde que não saberia responder como um sociólogo cultural o que acontece na região. Citou como um possível resposta a proximidade das pessoas, o Cinema da Fundação Joaquim Nabuco como um espaço agregador dessas pessoas, e dos compartilhamentos das ideias individuais de cada um.

Inácio retomou a palavra para lembrar que ainda há um pensamento de que fora do Rio de Janeiro e de São Paulo não há mais nada, “quando a gente sabe que Pernambuco é culturalmente muito ativo. Me parece que o filme de vocês não tem apoio da Petrobrás. Como é isso de jovens conseguirem fazer seus filmes?”

Marcelo destacou que o filme foi feito com o dinheiro da Prefeitura do Recife, dado para rodar um curta-metragem, e finalizado com dinheiro do Governo do Estado. “Acho que não seguirmos um modelo mais tradicional em que o produtor fica regulando nossas idéias ajuda a chegarmos onde queremos. Os filmes são frutos de um ambiente saudável. Vou levar o jogo de cintura que aprendi ali para o resto de minha vida”.

“Interessante você lembrar do Rossellini”, disse Marcelo, “Antes do filme, li Notas Sobre o Cinematógrafo, de Bresson, e pensava, que consciência sobre o estilo é essa de Bresson? Gosto dos filmes que me fazem esquecer que estou vendo um filme. Nos filmes de Rossellini ele agrega a questão política de maneira muito forte no contar da história. E lembro que o compósito de Eles Voltam, Caçapa, ficava me dizendo: Marcelo, tu tá muito neo-realista.

“Gosto do cinema que propõe ao público uma jornada. Propor ao publico tirar seu chåo e fazê-los ir sem saber aonde vão. Não é redenção o que sofre minha personagem, é mais uma maturidade de uma alma humana em formação”, explica Marcelo.

Quando começa a falar sobre a ausência do irmão da protagonista Chris no filme, o cineasta se emociona, pede desculpas, e chora.

“Não queria criar personagens para defini-los”.
Pára de falar novamente emocionado. “E que quando envolve pessoas reais, emociona”, explicou.

Leonardo Lacca toma a palavra e fala da expressão de Maria Luisa Tavares, a Malu, que interpreta Chris.

“O personagem seria um menino”, diz Lacca, “mas depois que Marcelo encontrou Malu… Ela tem uma inteligência cênica impressionante, que respondia muito rapidamente. Marcelo queria promover encontros. E Eles Voltam provocou isso com toda a equipe. Eu raramente teria tido contato com essas pessoas que vemos no filme”.

Lordello pede a palavra para explicar algumas coisas que Inácio comenta como ausências no filme: “A ideia era reverberar na gente essas ausiencias. Tenho a impressão que a gente nunca conhece todo mundo totalmente”. E continua: “O irmão de Chris vive um outro filme, o dele. Dava pra fazer um filme sobre o irmão. Aí a gente abre uma lacuna para o espectador criar junto com você no filme”.

“A vontade do extra-campo é uma pesquisa minha. Tá tudo associado, mas não de forma a enganar o público e sim propondo, convidando. O meu curta, “no. 27”, já tem isso. A ausência e os tempos fortes, naquele prólogo, você tinha de sentir na pele”.

“Pensava muito em como criar um cena densa, sobre o conforto da classe média e dela se ausentando das responsabilidades. Sobre os contatos entre as classes. Eles Voltam tinha mais de mim, nas conversas com Ivo (fotógrafo) acabei entendo que tinha que cortar muito. E foi para isso que o chamei, para ele contribuir aí também”.

Ivo toma a palavra a pedido de Francisco Cesar Filho: “Tem romantismo nisso de fazer cine sem dinheiro. Você tem de ter uma coisa extra. Todos com a própria família estavam ali e era um longa com 69 locações. Uma equipe pequena e todos acreditando no que estavam fazendo. E Marcelo comandava com sua energia e disposição fora do comum. Para reunir e manter as pessoas no projeto ele era bem bom. Ele tem um visão e consegue passar isso. Quem viu “no. 27” percebe bem como ele trabalha a imagem. Somos afinados na construção da cena e isso facilita. Já a Malu é incrível. Se não tivesse Malu, não tinha nada”, concluiu.

Após algumas perguntas da platéia, Inácio deu a palavra final comentando que aprendeu muito com a conversa e disse achar interessante três possíveis noções sobre o cinema pernambucano.

“Me toca a ideia de liberdade, que foi uma ideia que tocou minha geração. A ideia de autoria, mas partilhada por pessoas queridas num grupo pequeno. A equipe pequena é uma equipe que se joga no recurso contado. E o resultado aparece nessa a tensão que envolve a todos, todos confiam um no outro e isso transparece no resultado magnífico que temos em Eles Voltam”, disse Inácio.

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