85ª Oscar (2013)
O imprevisível mundo do Oscar
Por Luiz Joaquim | 23.02.2013 (sábado)
Quando em 2009 a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood mudou as regras na quantidade de indicações ao Oscar de “melhor filme” do tradicional número de cinco para dez, estava claro que ali havia um movimento estratégico para reforçar um mercado em crise financeira. Afinal, com a festa de maior audiência do planeta divulgando dez filmes ao invés de cinco, poderia resultar numa maior procura do público em busca de ver “o filme do Oscar” em cartaz. A estratégia deu certo. Não é a toa que os exibidores, no Brasil, por exemplo, se apressam para colocar todo o time de indicados a “melhor filme” em cartaz antes da cerimônia acontecer. O que dizer então do mercado home-video, que lucra duplamente após a cerimônia?
Dois anos depois, a decadente qualidado do cinema hollywoodiano mostrou que os membros da Academia se meteram numa saia justa. Em outras palavras, estava difícil encontrar dez filmes dignos de concorrer a vaga de “melhor filme”. Tanto que em 2011, a regra foi revista e desde 2012 que os sócios podem decidir entre cinco e dez indicações. Este ano de 2013 temos nove concorrentes e, pela primeira vez depois destas mudanças temos títulos dignos, que justificam a quantidade, para brigar pelo posto de melhor filme. A cerimônia do 85º Oscar é exibida amanhã pela TNT a partir das 22h, pelo canal E! a partir das 20h30 e pelo Rede Globo a partir das 23h30.
Os principais filmes da festa são: “Lincoln”(12 indicações), de Steven Spielberg; “As Aventuras de Pi” (11 indicações), de Ang Lee; “O Lado Bom da Vida”, de David O. Russell, e “Os Miseráveis”, de Tom Hooper (cada um com oito indicações); “Argo” (sete indicações), de Ben Affleck; o austríaco “Amor”, de Michael Haneke; “Django Livre”, de Quentin Tarantino, “A Hora Mais Escura”, de Kathryn Bigelow; e “Indomável Sonhadora”, de Benh Zeitlin – que estreou ontem no Recife – (cada um destes com cinco indicações).
Se desconsidermos a inflação da mídia a respeito de três títulos no páreo, ficam seis outros de valor memorável. O primeiro do trio e mais frágil é “O Lado Bom da Vida” – que conseguiu a façanha de incluir as quatro categoria de atores concorrendo (atriz, ator e coadjuvantes) por uma trivial comédia romântica disfarçada com dicas para se viver feliz. Depois há o fofo e exótico “Indomável Sonhadora”, cuja coqueluxe está na menininha Quvenzhané Wallis – a atriz mais jovem a concorrer a uma estatueta (tinha seis anos quando rodou o filme).
O terceiro é um filme deslumbrante, particularmente por utilizar-se de forma eficiente em função da linguagem com a tecnologia 3D digital. É “As “As Aventuras de Pi”, que não por acaso, pode ser referenciado com o êxito no ano anterior alcançado por “A Invenção de Hugo Cabret”, de Scorsese (que perdeu para “O Artista”, de Michel Hazanavicius). Se seguirmos esta linha de raciocínio, a de que a Academia prestou mais atenção a um filme estrangeiro (francês), que para uma megaprodução de um mestre americano, então não podemos descartar a muito boa chance de “Amor” levar o principal prêmio da noite, assim como o de filme estrangeiro (um feito inédito).
Celebrado na Europa, Haneke vem arrebatando todos os prêmios aos quais concorre, tendo iniciado a carreira de sucesso com a Palma de Ouro em Cannes 2012. A história do casal de idosos (Jean-Louis Trintignant e Emmanuelle Riva) que se vê diante de um novo desafio ao final de vida também saiu exitosa no Globo de Ouro e foi eleito pela crítica americana o melhor filme estrangeiro do ano passado.
Engane-se quem acredita que Riva – que aniversaria amanhã, na noite do Oscar e foi eternizada pelo filme “Hiroshima Mon Amour”, feito por Resnais em 1959) – está fora do páreo por conta da campanha em torno da absolutamente ordinária performance de Jennifer Lawrence em “O Lado Bom da Vida”. Os 5.800 mil votantes da Acadêmia parecem estar mais atentos às jogadas marqueteiras e sempre pensam nas muito jovens atrizes despontando com futuras outras possibilidiades. Resumindo: Jennifer pode esperar. A grande Riva não.
Mas, como “lógica” não vale R$ 1 para os resultados do Oscar, é bom não esquentar a cabeça por esse raciocínio. O mesmo vale para a ideia de que o senso patriótico norte-americano sempre fala mais alto quando a questão é julgar. Isto daria crédito a “Lincoln”, burocrático e didático (mas bom) filme de Spielberg. O mestre foi rechaçado em 2012 pelo ainda melhor “Cavalo de Guerra” (não levou nenhuma das seis indicações), mas a vinda amanhã de um “Oscar de desculpas” pelo patriotismo também pode perder para o militarista “A Hora Mais Escura”, de Kathryn Bigelow, respeitada em Hollywood como a primeira mulher a levar o título de melhor diretora por “Guerra ao Terror” (2008).
Com o novo filme, que mostra os bastidores da captura de Osama Bin Landen, Bigelow encontra elogios da crítica especializada (fez um belo filme), mas também enfrenta uma rejeição violenta de militantes que levantam a voz contra a prática da tortura. A acusação é que, ao mostrar cenas de tortura dando atenção apenas ao seu fim (os fins justificam os meios aqui?), esta seria uma forma de concordar com a prática. Bigelow, à propósito, deve encontrar uma forte manifestaçõe amanhã no tapete vermelho, contra “A Hora Mais Escura”. Vai ser quente.
E Tarantino? Este é seu terceiro filme na disputa, junto a “Bastardo Inglórios”(2009) e “Pulp Fiction” (1995) pelo qual levou o prêmio de roteiro adaptado (co-escrito com Roger Avary). Mas apesar do sucesso de “Django Livre”, alguns o consideram um filme “menor” do inquieto cineasta em relação a outros anteriores. Seria curioso então que ele fosse lembrado pela história do Oscar por “Django”.
Mas a grande incognita mesmo é “Argo”, competente e simpático filme de Ben Affleck que aos gringos pega pelo patriotismo por lembrar outro momento histórico, o do resgate de seis norte-americanos refugiados na Embaixada Canadense do Irã em 1980. Das sete indicações do filme, nenhuma foi para Affleck como diretor ou ator. Isto tem encafifado a comunidade cinematográfica americana, que cultiva um carinho especial pelo ator, agora amplificado por “Argo”. Tudo pode acontece, enfim, e para descobrirmos, temos de assistir a cerimônia.
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