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Livro: A Fábula Cinematográfica

O cinema e seu trajeto até a arte absoluta

Por Luiz Joaquim | 30.03.2013 (sábado)

As reflexões do filósofo francês Jacques Rancière movimentam-se entre a literatura, o cinema, a pedagogia, a historiografia e, claro, a filosofia. O professor emérito de filosofia na Universidade de Paris VIII (St.Denis), e professor visitante de universidades americanas (como Harvard e Berkeley) tem como motivo recorrente em sua obra o tema da relação entre a política e a estética, assim como seus diversos significados nos mais distintos contextos. Boa parte de seu trabalho pode ser caracterizado como um desejo de repensar e subverter categorias, disciplinas e discursos. De rever a experiência sensorial no rol das artes e da política. Àqueles cuja tema soa atraente, nada mais oportuno que conhecer “A Fábula Cinematográfica” (192p., R$ 69), lançamento que a Papirus Editora traz o Brasil, assinado originalmente por Rancière em 2001.

Neste trabalho, o autor revê a descrição do cinema e propõe um novo status para a estética e a ficção cinematográfica. O faz a partir do que denomina “políticas estéticas”, e nos leva à “poética da metamorfose”. Este procedimento parte da convicção de que o cinema não deveria ser utilizado para narrar literalmente histórias, a não ser que fosse para comover através de movimentos sensíveis da câmera e da capacidade polissêmica das imagens, agindo no estado de ânimo e na consciência social do espectador.

Se o habitual é privilegiar a racionalidade da intriga – a narração – sobre o efeito sensível do espetáculo – a estética pura -, Rancière defende o contrário: a verdade da sensibilidade deve prevalecer sobre “as estruturas canônicas do pensamento”. O filme deve nos conduzir a um estado de incômodo que nos obrigue a ver a contradição mostrada pelo que é visível contra o significado narrativo ou, de outro modo, unir e contrapor a emoção estética à angústia.

As estratégias pelas quais Rancière convida o leitor a “pensar cinematograficamente” aponta para o diretor utilizando-se de certos elementos figurativos em suas obras. Elementos que se tornam mais importantes que os próprios personagens, expressando a contundência desse conflito entre narratividade e plástica.

A análise do autor, para chegar a tais conclusões, perpassa por observações debruçadas sobre obras de Eisenstein, Fritz Lang, Anthony Mann, Nicholas Ray, Rosselini e Godard, e as opções desses realizadores, claro, que sempre conflituam a narrativa em sua forma.

Rancière é um otimista que crê na fé da imagem, mas isso não elimina sua fé também nas contínuas possibilidades de uma história. Já no prólogo de “Fábula Cinematográfica”, ele abre um espaço para Jean Epstein, quando o cineasta propõe que o cinema não é uma meio que faz juz ao enredo. De acordo com Rancière, Epstein queria um cinema descartando a “fábula” no sentido aristotélico do termo, ou seja, na estrutura de uma necessidade e verosimilhança de ações que levasse os personagens de uma felicidade para a desgraça, ou vice-versa.

Ainda assim, enquanto vários destes realizadores e teóricos puseram em questão a importância do enredo e demonstraram formas para contorná-lo, Rancière mostra-se não totalmente convencido. Um exemplo está no livro quando ele fala desses cineastas e suas chaves para essa questão: como a noção de Gilles Deleuze para o cinema como uma máquina sensorial do colpaso, ou com um luto que Godard diz o cinema nunca alcançar em sua total dimensão. Intrigante.

SERVIÇO:
“A Fábula Cinematográfica”
Jacques Rancière
Papirus Editora
192 págs., R$ 69

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