17o Cine-PE (2013) – dia 4 (Rio Doce-CDU)
Vou de ônibus
Por Luiz Joaquim | 29.04.2013 (segunda-feira)
Lá pelo meio da década de 1980, havia no Recife um jovem grupo de entusiastas pelo cinema que ser reuniam regularmente para ver, pensar e tentar fazer filmes. Batizados de “Van-Retrô”, os garotos Paulo Caldas, Lírio Ferreira e Cláudio Assis, entre outros, também agitavam o Cineclube Jurando Vingar (onde hoje funciona o Cinema da Fundação Joaquim Nabuco). No meio da rapazeada, hoje cinquentões com no mínimo três longas-metragens de respeito no currículo, circulava uma garota chamada Adelina Pontual. É dela o longa-metragem “Rio Doce/CDU” que o 17º Cine-PE: Fesitval do Audiovisual apresenta em competição hoje às 21h15.
Reconhecida pela tranquilidade, simpatia e, principalmente, competência, o agora credenciamento como diretora de um longa-metragem nunca foi uma preocupação para Adelina. “Eu sabia que quando isto acontecesse, seria de forma muito natural”, confessou. De toda maneira, a experiência em estar a frente de um filme já data de 1991, com seu curta-metragem inaugural, em 16mm, “El Monstruo”, que rodou quando estudou em Cuba, na Escuela Internacional de Cine y Televisión de San Antonio de los Baños (EICTV).
Em sua conta somam-se no mínimo outras quatro obras que circularam em importantes festivais de cinema, como “O Pedido”, que revelou para o cinema a atriz Hermila Guedes em 1999. Adelina, à propósito, já esteve na tela deste 17º Cine-PE. Foi sábado, na Mostra Pernambuco, quando apresentou seu novo curta-metragem “ReTrato”.
Paralelo ao trabalho na direção, Adelina construiu uma sólida carreira nacional com continuísta – aquele profissional responsável pela coerência e harmonia entre cenografia, fotografia, figurino, maquiagem e sonoplastia do que se vê e escuta entre uma tomada e outra. Nesta função, a cineasta já conta com cerca de 20 filmes no histórico, entre eles “Central do Brasil”, de Walter Salles, “Carandiru”, de Héctor Babenco, e “O Palhaço”, de Selton Mello.
RIO DOCE/CDU – Com quase metade das produções pernambucanas, o projeto de seu primeiro longa-metragem não foi pensando originalmente para o cinema. “Em maio do ano passado, um versão com 52 minutos foi projetada pela televisão no SescTV”, lembra. “Contar essa história a partir de uma tão conhecida linha de ônibus local era um projeto pessoal. Inicialmente inscrevi o projeto no edital do audiovisual do Governo do Estado e com os recursos fizermos a versão para a TV, com filmagens durando uma semana”, lembra.
Uma vez na mesa de edicão com João Maria (o mesmo de “O Som ao Redor”, de Kleber Mendonça Filho), Adelina percebeu que o material rendia uma versão extendida. “Paramos, fomos atrás de novos aportes e conseguimos com o Sistema de Incentivo à Cultura (SIC) municipal para remontar e finalizar no formato digital para cinema”. Outro ponto técnico em comum com o filme de Mendonça está na trilha sonora, criado pelo DJ Dolores.
Nesta versão ampliada, Adelina adianta que o trajeto de retorno do ônibus em questão ganhou mais força. “A ideia aqui era seguir o percursso de ida e volta da linha. Lembro que no projeto até descrevi como um caminho que vai do litoral ao interior. O trajeto inteiro pode durar até 90 minutos, com o trânsito bom”. A própria diretora foi, por muito tempo, uma usuária do coletivo. Morando no bairro da Torre, precisva se deslocar para a Parabólica Brasil, antiga produtora onde trabalhava com o amigo Cláudio Assis, em Olinda.
“É uma linha muito antiga. Já existe há mais de 20 anos e passa por lugares muito distintos. Dessa forma o filme acaba tornando-se também um documento histórico sobre as transformações que as duas cidades vêm passando. É claro que falamos de aspectos da linha em si, porque o ônibus demora, anda lotado, etc., e até fazemos o que chamo de paradas exploratórias, quando decíamos nos pontos e entrevistávamos personagem interessantes; mas o foco mesmo está no recifense e no olindense”, explica.
Nesse ambiente móvel, de convivência compulsória entre tantos pernambucanos, Adelina, com seu filme, faz o convite para conhecermos os sons e as imagens dali. Além de contemplar uma identidade bem particular nossa. Quem for ver o filme, e nunca tenha tomado o transporte em questão, finalmente vai entender a famosa expressão local – “Tá mais lotado que o Rio Doce/CDU” – que perpassa por gerações.
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