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Críticas

3x3D

Aonde vamos com o hiper-realismo?

Por Luiz Joaquim | 24.01.2014 (sexta-feira)

É bem raro o Recife poder conferir na mesma semana a estreia de novos filmes de dois titãs do cinema. Se juntássemos a dedicação de Martin Scorsese e Jean-Luc Godard a este universo somaríamos mais de 110 anos de história, totalizando mais de 50 filmes. Para muito além dos dados numéricos, estes dois tornaram-se gigantes pelo talento e renovada capacidade de reiventar o cinema, alargando para os lados sua linguagem e oxigenando sua longevidade. Os novos “O Lobo de Wall Street”, de Scorsese, e “3x3D” (o segmento “3 Des-Astres”), de Godard, demonstram que o cinema destes dois senhores está cada vez mais jovial, no sentido vigoroso da jovialidade. Confira abaixo.

Aonde vamos com o hiper-realismo?
Sobre o experimento estético chamado “3x3D” (Por., 2013), exibindo a partir de amanhã no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco, é valioso destacar que o rápido longa-metragem de 70 minutos é um trabalho sob encomenda que contempla o município de Guimarães, em Portugal.

Tida como a cidade europeia da cultura em 2012, três diretores – o inglês Peter Greenaway, o português Edgar Pêra e o suíço Jean-Luc Godard – foram convidados a promover esta celebração explorando as possibilidades da tridimensionalidade no cinema.

Independentes entre si, os três segmentos – “Just In Time”, “Cinesapiens” e “Os 3 Des-astres” – buscam chamar a atenção do especatador por motivos diferentes. Condizente com seus histórico nas artes plásticas, Greenaway, por exemplo faz das lentes duplas em seu “Just in Time”, um observador (nós, espectadores) que transita livremente num longo plano-sequência por Guimarães, enquanto os dois mil anos de história da cidade são mostrados ora por personagens caracterizados, ora por palavras digitais integradas às imagens reais. É provavelmente o mais sedutor dos três filmes pelo aspecto visual.

O português Pêra e seu “Cinesapiens” oferece uma provocação humorada ao recontar a evolução do cinema e sua capacidade de gerar espanto nos espectadores. Estampando dizeres como “O cinema traiu sua vocação sacrificando a fraternidade da metáfora para o bussiness das estórias”, Pêra distingue o espectador fiel do cético.

Enquanto um acredita na fantasia, o outro só procura a razão e, mesmo com o casamento entre os dois, parece não haver salvação para o cinema tal qual veio ao mundo, quando espantava seus espectadores com o trêm que “saía da tela” na primeira sessão do Lumière no século 19.

Por fim, chega Godard já brincando com seu título: “Os 3 Des-Astres”, que pode ser lido como ‘desastres’ ou “dos astros”, no francês. Cobrindo textos lidos pelo próprio autor, as 3 partes surgem com imagens “roubadas” de outros filmes, vulgares ou não, para ilustrar o que o cineasta quer destacar: para onde iremos com a banalização da tridimencionalidade? Com a tentativa de transformar o real em algo ainda mais fiel que o próprio real?

Já de início, Godard lembra que de uma hora para outra, assim como o prédio tridimencional que tomba e junta-se a sua sombra no chão, voltando a bidimencionalidade, o 3D no cinema também é frágil. Apenas engatinha enquanto o cinema ou simplesmente a pintura, em suas tradicionais duas dimensões, já fez nos levou a reflexões muito mais sofisticadas apenas com a profundidade de campo.

São observações que levam o cinema a um patamar filosófico, e pelas anotações do mestre, uma espécie de Nouvelle Vague com o 3D estaria longe de acontecer. E a ditadorial técnica que Hollywood hoje domina talvez leve, por enquanto, à fadiga da falsa hiper-realidade.

Jean-Luc Godard, 83 anos, 34 longas-metragens de ficção para o cinema. O eterno enfant terrible, junto aos críticos da revista Cahiers du Cinéma – Truffaut, Romer, Rivette, Chabrol, entre outros – abriram os olhos do mundo para um novo cinema francês nos anos 1950, criando a Nouvelle Vague. Inventivo e provocador, Godard é já há seis gerações, não por acaso, citado como um Deus (God-ard) do cinema moderno em todo o mundo. Com sua obra, deu um novo sentido os filmes para além do contemplativo. Criou por ele, um compromisso político e humano, entrelaçado com as possibilidades que a arte pode gerar. Seu vanguardismo abriu, e abre até hoje, a cabeça de cineastas do mundo inteiro, como o fez com o então jovem estudante de cinema, Martin Scorsese, nos anos 1960.

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