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Reportagens

Casa Cheia: filmagens

A casa do terror

Por Luiz Joaquim | 24.03.2014 (segunda-feira)

Os vizinhos do edifício Moradas Bento-Ilá, número 345 da rua Desembargador Martins Pereira, no bairro dos Aflitos, Recife, nem sequer desconfiavam na quarta-feira da semana passada que naquele dia o prédio estava infestado de fantasmas. Bom é saber que eram todos de mentirinha, ou melhor, atores caracterizados para compor a ambientação cinematográfica do curta-metragem “Casa Cheia”, que o diretor Carlos Nigro rodava em um dos apartamentos do edifício.

Com mais de 50 pessoas entre equipe técnica e elenco de apoio circulando pelo apartamento 02 do prédio, a produção realizada pela Nahsom Filmes tratou de retirar todos os moradores do edifício para as filmagens correrem com o silêncio e tranquilidade necessária que um filme de suspense necessita.

No enredo, uma adolescente asmática (Inês Maia, 16 anos) acorda de um pesadelo com falta de ar. Enquanto toma seu medicamento e assiste tevê, ela percebe que há mais uma presença na sala. É um menino (João Victor, 10) que tenta tocar em seu pescoço. Mas, por que?

Com todas as ambientações acontecendo à noite e ao amanhecer, a locação era algo fundamental na busca do diretor Nigro. “Foram quase dois meses de busca e decidimos por esse espaço, onde estamos usando como cenário a sala, a cozinha, o banheiro, o corredor e dois quartos do apartamento”, conta.

Interessado mais em sensibilizar seu espectador pela tensão psicológica do que pelo susto, Nigro explica seu cuidado com o próprio ambiente, que vai se modificando dentro da história à medida em que a menina vai conhecendo os mistérios daquele apartamento. Para tanto, a comunhão entre a figurinista Andréa Monteiro, a diretora de arte Helga Queiroz, o maquiador Marcos Freire, e diretor de fotografia Roberto Iuri precisava estar em sintonia fina.

Monteiro conta que Nigro a deixou totalmente livre para sugerir a gama de texturas das roupas com a qual is figurantes surgem em cena. Já Queiroz, buscou inspiração no cenário de “O lluminado”, de Kubrick, mas também usou o trabalho da fotógrafa Francesca Woodman (1958-1981) como referência para o constante envelhecimento do apartamento, com assombrações fundindo-se contra as paredes falsamente descascadas do local. “Dividi a arte em três fases: Há o envelhecimento real do imóvel. Há as camadas do tempo, quando usamos um pó tanto para o cenário quanto para os móveis e figurino. E há a ambiência final, na sala, com a casa fechada”, adianta Helga.

Com tantos detalhes em jogo, o cuidado tomado por Iuri na fotografia – que usou uma câmera com tecnologia RED (que captura com resolução de 4520 x 2540 pixels, ou 4K) – diz respeito às sutilezas, com sombras. “O plano é que a simplicidade da iluminação, por conta do orçamento limitado e também do espaço físico limitado, não deixe transparecer na tela como algo simples, mas sofisticado. Queremos que quem veja o filme se envolve assim”, diz o fotógrafo.

Também pelo som e trilha sonora, Nicolau Domingues adianta que tais elementos devem dialogar com a arte. “Teremos uma sonoridade que não deve interferir exageradamente na dramaturgia, mas vai ser sim mais um elemento para compor a crescente sensação de loucura da menina”, finaliza.

A lógica do esmero dos técnicos é a mesma da produção, que investiu os R$ 93 mil conquistado no edital de 2012 do Fundo Pernambuco de Incentivo à Cultura (Funcultura) para esta fase da produção do curta. “Fomos contemplados também pela Lei Rouanet, e agora vamos correr atrás de investidores para aplicar no finalização”, revela a produtora executiva Anny Fernandes.

Atores mirins, espírito de veteranos
Fã de cinema, a adolescente Inês Maia já viu seu pai, Dida Maia, atuar em um dos filmes mais celebrados da recente produção de Pernambuco. Dida aparece como o marido de Bia, personagem de Maeve Jinkings em “O Som ao Redor”. Agora assumindo o protagonismo do curta “Casa Cheia”, sem nunca antes ter atuado na frente de uma câmera, a jovem dá seu recado bastante à vontade.

Tranquila e já falando como um veterana, Inês destaca que precisou passar por um teste de elenco, com um exercício respiratório, uma vez que sua personagem é asmática. “Eles queriam um tipo físico magrinho, ressaltando a fragilidade dessa menina sozinha em casa”, recorda. Sobre o ato de filmar repetidas vezes uma mesma cena, comum no cinema para se chegar na ideal, Inês vê a prática como algo comum com a qual tem de se manter tranquila para tudo correr bem.

Nas primeiras conversas com o diretor Carlos Nigro, ambos compartilharam interesses em comum, como o filme “Anticristo”, de Lars Von Trier e falaram sobre a inocência de sua personagem.

Já o garoto João Victor era um velho conhecido de Nigro. Ele o dirigiu num comercial em Caruaru. “O garoto é incrível, muito expressivo”, elogia o cineasta. Chamando a atenção de todos pela sua tranquilidade na bagunça do set, João, fã da animação “As Aventuras de Tintim”, diz que o mais difícil ali e não rir. E justifica: “É difícil ficar sério com tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo”.

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