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Críticas

Eles Voltam

Cris no país das realidades

Por Luiz Joaquim | 07.03.2014 (sexta-feira)

A primeira menção pública sobre o projeto “Eles Voltam” (Bra., 2014) – primeiro longa-metragem de ficção de Marcelo Lordello que entra em cartaz hoje no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco e Cine São Luiz – aconteceu há oito anos. Era dezembro de 2006 quando a coordenação do concurso de roteiros Ary Severo/Firmo Neto anunciou que os roteiros de Lordello e de Eric Laurence (por “Azul”) eram os contemplados daquela edição com R$ 80 mil (cada um) para realizar um curta-metragem.

“Azul” cumpriu seu contrato e veio ao mundo como um curta no 42º Festival de Brasília (2009), onde foi premiado pelo som. Já “Eles Voltam” extrapolou todas as expectativas. Primeiro pelo projeto ter recebido mais fôlego desenvolvendo-se como um longa-metragem com custo total de produção em torno de míseros R$ 250 mil. Segundo por ter sido eleito o melhor longa do 45ª Festival de Brasília (2012) – ao lado de “Era Uma Vez Eu, Verônica”, de Marcelo Gomes.

Lá, foi também contemplado pela crítica e deu ainda os Candangos de melhor atriz para as meninas Maria Luiza Tavares (ou apenas Malu), e Elayne Moura (coadjuvante). Daí por diante, foram mais de 20 festivais ao redor do mundo, incluindo Roterdã e o New Director s New Film, em Nova Iorque.

O maior valor de “Eles Voltam”, entretanto, não está em nenhum troféu mas em si próprio. Está na beleza e na riqueza de sugestões visuais e humanas que os olhos da menina Cris (Malu), aos 12 anos de idade, testemunham durante sua forçada peregrinação. Está na composição cinematográfica deste compulsório percurso em direção a um mundo no qual a menina é quase uma estrangeira.

Sua odisseia inicia ao ser deixada por seus pais no meio do nada, à beira de uma estrada na Zona da Mata pernambucana com seu irmão mais velho, Pêu (Georgio Kokkosi). O que deveria ser um susto como castigo por um mau comportamento transforma-se numa longa espera sem a certeza da volta. Ainda no prólogo de “Eles Voltam”, Lordello auxiliado pela bela fotógrafia de Ivo Lopes Araújo, constroem a perfeita atmosfera na margem da rodovia como um lugar como inóspito tanto para a pré-adolescente sozinha quanto para nós espectadores.

Cris, como menina de classe média-alta no Recife contemporâneo, assusta-se com qualquer estranho que se aproxima. Mas basta encerrar os crédito de abertura, ao som de Milton Nascimento – com música do clássico álbum “Clube da Esquina” -, que Lordello inicia seu processo de desconstrução do outro como uma potencial ameça. O garoto que passa na bicicleta, por exemplo, é o primeiro destes personagens que irão cruzar pela vida de Cris e apresentar-lhe uma nova perspectiva social. São eles que lhe irão ensinar o que não se aprende em livros, nem na televisão ou nas redes sociais virtuais.

Um parágrafo a parte deve ser dedicado a atuação de Maria Luiza, cuja preparação passou orientação da atriz Amanda Gabriel. O olhar ora tímido,ora desconfiado e assustado que Malu dá a sua Cris imprimem o tom preciso àquilo que o roteiro de Lordello pede. É, inicialmente, o olhar de quem não entende seu novo ambiente, e depois vai olhando para ele e para seus personagens com carinho e compreensão. Ao final, ela terá amadurecido, e sua relação não será a mesma nem com sua família nem com a vida social que a cerca.

“Eles Voltam” é filme para ser visto e revisto. De preferência com pais e filhos juntos, compartilhando o aprendizado dessa viagem em direção ao amadurecimento humano.

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