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Críticas

Ninfomaníaca – volume 2

A humanidade e suas limitações

Por Luiz Joaquim | 13.03.2014 (quinta-feira)

E chega ao Brasil o segundo volume de “Ninfomaníaca – Volume 2” (Nymphomaniac, Din., Bel., Fra., Ale., UK, 2014), ou seja, a última parte da provocação sexual de Lars Von Trier. Uma primeira informação aqui é que: sim, o filme pode ser visto como um trabalho independente do primeiro, mas obviamente os espectadores que assim o virem não poderão chegar no alcance dramático daqueles que tiveram acesso ao volume 1 – lançado no início de 2014.

A segunda informação importante é que o volume 2 fecha um ciclo com um valor discursivo que consegue dar sentido (ainda bem) ao frágil volume 1. Se ali tínhamos uma história que parecia não levar a lugar nenhum, ou a diversos lugares ao mesmo tempo (e por isso mesmo de maneira inócua), nesta parte 2 “Ninfomaníaca” mostra-se mais consciente de onde quer chegar e onde quer nos levar.

Isto por que um personagem fundamental aqui ganha consistência. Ele é Seligman (Stellan Skarsgard, ótimo), o misterioso senhor que resgatou Joe (Charlotte Gainsbourg) da sarjeta e a ajuda, sempre indiferente, ouvindo-a falar de suas aventuras sexuais enquanto tenta convencê-la de que ela não é uma pessoa má por isso.

Logo no início, Seligman ganha a palavra e com ele nos informa que é assexuado. Que nunca teve relações com nenhum mulher, ou homem. E nem teve interesse por isso. Seu prazer está nos livros. E só. O sexagenário Seligman é um virgem; e por isso se diz “inocente”.

Este é um ponto chave em toda a trama e naquilo que o filme quer levantar, uma vez que Lars Von Trier põe em confronto a lógica de uma mulher que dormiu com milhares de homens contra a de um homem puro.

É basicamente pela diversidade de implicações que esse confronto pode sugerir que o volume 2 torna-se mais interessante que o volume 1, quando Seligman era basicamente um ouvido que abria a boca para algumas digressões bobas, mas disfarçadas de sagazes pela pretensão do roteiro do diretor.

Asssim como na parte 1, esta sequência também é dividida em capítulos (“O pato silencioso”; “o espelho”; e “a arma”). Curioso observar que, enquanto o excesso de capítulos (cinco) no primeiro filme parecia mais um refúgio estrutural para facilitar a condução do roteiro, os três de agora aparecem mais orgânicos, quase como necessários para dar ordem à cronologia das histórias de Joe.

Com cenas plasticamente mais picantes (e íncomodas, em algumas situações), esta parte dois inclui, entre outras situações, felação, masoquismo, a ideia de pedofilia, além de dois grandes africanos discutindo pelo direito de uma penetração anal.

Nesse leque de situações, todas elas não parecem estar ali em função do roteiro, ou das reais necessidades de Joe, mas sim em um função do desejo de Lars Von Trier em experimentar criar uma narrativa que lhe possibilitasse divertir-se, ou apenas provocar-nos dramaturgicamente com estas situações.

Acaba que, ao final de um longo blá-blá-blá – sem que ele esqueça o catolicismo e a culpa – Lars Von Trier resume seu filme numa conclusão um tanto simplista sob a qual recai a histórica opressão social masculina sobre as mulheres para justificar os atos de Joe e assim “absolvê-la” ou “provar” que ela não é má.

Como epílogo, uma nova situação, com uma cena sem imagem, apenas com o escuro onde não vemos nada e imaginamos uma tragédia, Lars Von Trier joga com algo ainda mais frágil, ou bobo, querendo nos convencer que a humanidade não merece confiança nunca.

CANÇÃO – A boa música que acompanha os créditos finais do filme, “Hey Joe”, é cantada pela atriz Charlote Gainsbourg (também com uma carreira de cantora), e tem arranjo da banda Beck, que já havia produzido os álbuns de Gainsbourg.

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