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Clássicos

Os Incompreendidos (2014)

O eterno encanto de um clássico

Por Luiz Joaquim | 12.04.2014 (sábado)

“Fazer filmes com crianças é bastante tentador antes das filmagens, muito preocupante durante, mas extremamente satisfatório depois. Mesmo quando parece que tudo começa a ir sem rumo, sempre há alguma coisa que faz valer a pena, e a criança é sempre a melhor coisa na tela. A verdade de uma criança é realmente algo absoluto”. O autor da oração é François Truffaut (1932-1984). Falar muito sobre ele e sua obra é sempre insuficiente. Melhor é ver seus filmes.

E é exatamente focado no mundo juvenil o objeto de “Os Incompreendidos” (Les 400 Coups, Fra., 1959), seu primeiro longa-metragem que exibe hoje no Cinema da Fundação (14h30) e no UCI/Kinoplex Recife (15h40) como parte da programação do Festival Varilux de Cinema Francês.

A última exibição no Recife aconteceu em 2008, numa cópia em 35mm de 2001, já cansada pelos sete anos de uso. Hoje a projeção será em digital DCP, feita a partir de uma matriz restaurada. Ou seja, a oportunidade é rara para (re)ver o clássico numa sala de cinema.

Dono de uma encanto que parece nunca envelhecer, é preciso dizer que o belo relato que se vê em “Os Incompreendidos” é em parte autobiográfico, da infância do próprio diretor. Filme fundamental da história do cinema, a produção foi, na sua época, apontado como um novo modo de fazer cinema. Inaugurou o que os críticos batizaram como Nouvelle Vague (a nova onda), movimento criativo de jovens cineastas franceses que influenciou o cinema do mundo inteiro e, até hoje, é referencial de estilo narrativo.

Pela Nouvelle Vague valia a simplicidade, a filmagem rápida, a história e locações reais, elenco anônimo, predominância de cenas externas, uso de luz natural e minimalismo dos recursos técnicos. As técnicas utilizadas pelo cineasta fancês, embora familiares hoje em dia – por terem sido imitadas por anos e anos – foram uma inovação radical nos anos 1950. Especialmente a cena final do filme, uma das mais marcantes – sem exagero – da história do cinema. É um daqueles raros momentos cinematográficos que simplesmente ficam grudados lá na memória.

Fazer um filme com essa sensibilidade e permanência, é claro, não se sustentaria apenas pelas inovações técnicas. François Truffaut era um apaixonado por literatura, mas também pelo cinema essencialmente visual de Alfred Hitchcock.

De todos os cineastas da Nouvelle Vague foi o que mais buscou fazer um cinema que não fosse limitado ao realismo psicológico, enredo e diálogos. O roteiro, para ele, era um estágio fundamental para a concepção dos filmes, mas no sentido de buscar traduzir as palavras em imagens. Um cineasta que “filmava com a câmera como um escritor escreve com sua caneta”.

Isto é o que faz o filme tão especial. O talento de um cineasta com um olhar único para os pequenos detalhes, para captar o turbilhão de emoções do jovem Antoine Doinel (Jean-Pierre Léaud) com uma honestidade quase documental.

“Os Incompreendidos” é um filme que fala de pessoas e situações comuns, dialogando na linguagem real e reconhecível do dia-a-dia, onde Truffaut registra as emoções se colocando de igual para igual com os personagens. É por isso que você sai do cinema com a impressão de que aquele garoto existe de verdade. Antoine Doinel é um menino com sonhos e frustrações, como todos já fomos um dia.

LONGEVIDADE – O ator Jean-Pierre Léaud (hoje com 70 anos) ainda viria a interpreta Antoine Doinel em mais quatro filmes: “O Amor aos 20 Anos: Antoine & Colette” (1962); “Beijos Roubados” (1968); “Domicílio Conjugal” (1970) e “O Amor em Fuga” (1978). É um caso único na história do cinema de tanta longevidade com um personagem vivido pelo mesmo ator.

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