Praia do Futuro
Viajo porque preciso, mas não volto
Por Luiz Joaquim | 15.05.2014 (quinta-feira)
Karïm Ainouz, cineasta cearense com um pé em Berlim, lança hoje no Brasil seu quinto longa-metragem, “Praia do Futuro” (Bras., 2014). Exceto pelo belo filme que o lançou em 2002, “Madame Satã”, Karïm trabalha aqui, pela quarta vez, um tema que lhe parece caro: uma fuga, ou deslocamento geográfico, em função do alívio para uma dor interna.
Fosse por “O Céu de Suely” (2006) com Hermila Guedes chegando ou indo embora de Iguatu (CE); fosse por Irandhir Santos errando nas estradas do sertão em “Viajo porque Preciso, Volto porque Te Amo” (2010); ou fosse por Alessandra Negrini vagando a esmo pelo Rio de Janeiro, todos foram impulsionados pelo mesmo motivo. Um desconforto pessoal que os coloca em movimento na busca de uma relaxamento num outro lugar físico.
É exatamente por isso que passa Wagner Moura como o salva-vidas fortalezense Donato. Ele é homossexual e o filme sugere que Donato não vive à vontade com este seu segredo. Ao tentar salvar um motociclista na Praia do Futuro (local real em Fortaleza), ele conhece o alemão Konrad (Clemens Schick), apaixona-se e vai a Europa com ele.
A divisão do roteiro em três atos – “O abraço do afogado”, “Um herói partido ao meio”, “Um fantasma que fala alemão” – mastiga o drama para o público distinguir mais facilmente os três momentos vitais na vida do personagem.
No primeiro somos apresentados a origem da paixão do casal Donato/Konrad. No segundo, a dificuldade da vida de um cearense na fria Alemanha e a coragem para deixar tudo para trás em nome de um amor libertador. E na terceira, a necessidade de reencontrar um passado já enterrado, mas que renasce na figura do irmão mais novo Ayrton (Jesuíta Barbosa).
Ao longo da carreira do filme, Wagner Moura deverá receber uma batelada de elogios pelo papel que encarou. A maioria deles (os elogios) virão embalados pelas cenas de nudismo e das relações sexuais homossexuais. Mas, numa olhadela aguçada, veremos que não há nada de “perturbador” para além do que um ou dois corpos nus pode proporcionar. Ou seja, no que depende da arte de atuar de Moura, temos o que sempre tivemos, seu talento em interpretar, mas num grau não tão impressionante quanto alguns gostarão de afirmar.
Ao final, Aïnouz não apenas ratifica seu interesse no tema dos corpos se movimentando no espaço para encontrar descanso ou alento, como também reforça um particular carinho icônico por auto-estradas. É só colocar lado a lado o desfecho deste “Praia do Futuro” e o de “O Céu de Suely” quando, em ambos, a esperança de dias melhores segue em frente, montada noma moto, até sumir por uma rodovia deserta.
FESTIVAIS – “Praia do Futuro” esteve na seleção 2014 do Festival de Berlim, em fevereiro, onde concorreu ao prêmio máximo, o Urso de Ouro.
0 Comentários