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Críticas

O Grande Hotel Budapeste

Resquícios da civilidade

Por Luiz Joaquim | 03.07.2014 (quinta-feira)

Apresentado pela primeira vez no Brasil na abertura do 18º Cine-PE, há cerca de três meses, “O Grande Hotel Budapeste” (The Grand Budapest Hotel, EUA, 2014) chega hoje aos cinemas. Vindo do festival de Veneza 2013 com o prêmio especial do júri, pode-se dizer que este oitavo longa-metragem de Wes Anderson é o seu maior feito sob todos os aspectos cinematográficos.

Se o cineasta americano já chamara a atenção na construção de universos muito particulares habitados por personagens ainda mais intrigantes, como em “Os Excentrícos Tenebaums” (2001), “A Vida Marinha de Steve Zissou” (2004), “Viagem Darjeeling” (2007) ou mesmo na animação “O Fantástico Sr. Raposo” (2009), desta vez Anderson parece extrapolar essa sua competência.

Com um roteiro (também de Anderson) inspirado nos escritos do austríaco Stefan Zweig (1881-1942), “O Grande Hotel…” parece não conhecer os limites para onde o humor pode ir se bem guiado e embalado – como é aqui – com a refinadíssima trilha-sonora de Alexandre Desplat, incluindo corais e a agitação de melodias russas.

Atribua-se a isto diálogos memoráveis, uma decupagem matematicamente ritmada, uma rica paleta de tonalidades na fotografia e uma direção de arte de encher os olhos em todos os instantes. Mas todos esses elogios técnico-criativos não teriam tanta importância se, acima de tudo, Anderson não tivesse ao alcance da mão uma invejável trupe de atores.

F. Murray Abraham, Mathieu Amalric, Adrien Brody, Willem Dafoe, Jeff Goldblum, Harvey Keitel, Bill Murray, Edward Norton, Jason Shwartzman, Léa Seydoux, Tom Wilkinson e Owen Wilson, todos estão afinadíssimos na atmosfera burlesca do filme. Eles compõem a mais de uma dúzia de personagens satélites que giram em torno de Monsieur Gustave (Ralph Fiennes, em estado de graça) e do seu fiel mensageiro Zero (o iniciante e bom Tony Revolori).

Acompanhar o ritmo do exigente Ms. Gustave, gerente do Hotel Budapeste – encravado em algum lugar gélido da Europa -, não era para muitos. Em seus tempos áureos, até o início da Segunda Guerra Mundial, a construção rosada era a referência máxima em hotelaria graças ao espírito disciplinado, erudito e elegante de Gustave, cujo habito de prestar favores sexuais as suas influentes hóspedes anciãs lhe rendeu a herança de uma delas (Tilda Swinton).

A lembrança por Gustave na partilha de bens cria, claro, conflitos entre os descendentes sanguínios da falecida, o que o leva a um roubo, uma prisão, uma fuga e a busca pela sua inocência.

Perfumado para todas as ocasiões, sempre com um poema de 46 estrofes na ponta da língua para momentos especiais (ou não), o diplomático Gustave e seu fiel escudeiro Zero fazem parte de um mundo que parece não existir mais: o da primazia da civilidade. E, por isso mesmo, todo o filme é contado em forma de uma fábula oral, ali pelos anos 1960/70, pelo já velhinho e saudoso Zero a um curioso escritor (Jude Law), que perpetua a sua história num livro e a faz chegar até nós nos dias de hoje.

ZWEIG – A história de vida no Brasil do autor das obras que inspirou “O Grande Hotel Budapeste” – o escritor austríaco Stefan Zweig – pode ser vista num documentário e num filme dramatizado, ambos dirigido por Sylvio Back. Na dramatização, “Lost Zweig” (2002), quem vive o protagonista é Rüdiger Vogler, e sua esposa Lotte é representada por Ruth Rieser.

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