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Festivais

7o Janela (2104) – dia 6

Um homem só

Por Luiz Joaquim | 28.10.2014 (terça-feira)

Já em 1976, pelo filme “No Decurso do Tempo”, o cineasta alemão Wim Wenders ganhara o prêmio da crítica internacional no Festival de Cannes. Mas, mesmo depois de um relativo reconhecimento por “O Amigo Americano” (1977) e “O Estado das Coisas” (1982), foi só em 1984 que o mundo inteiro realmente pararia para tomá-lo como um dos nomes mais importantes do cinema contemporâneo. O responsável por isto foi seu 11º longa-metragem, “Paris, Texas”, que exibe às 21h30 no São Luiz, dentro do 7º Janela Internacional de Cinema do Recife.

Há 30 anos, portanto, o mundo começou a reverenciar aquela que era uma das mais agudas histórias sobre solidão e incomunicabilidade de nossos tempos. Tão aguda quanto a história do protagonista Travis (Harry Dean Stanton, inesquecível) são os primeiros acordes da guitarra afinada de Ry Cooder, que “chora” enquanto introduz ainda nos créditos de abertura o protagonista, pequeno, barbado caminhando pela imensidão de um deserto no oeste norte-americano, sozinho, com seu paletó empoeirado, uma garrafa d água e seu boné vermelho.

De onde ele vem? Para onde vai? Nem ele mesmo sabe. Sem memória, Travis apenas segue em frente, em linha reta. É a representação corpórea do homem movido pelo impulso, que quer fugir de seu fantasma e deixar para trás o que não consegue encarar de frente. Que fantasma seria este? O próprio Travis, ou melhor, o ciúme que sentia pela esposa Jane (Nastassja Kinski, deslumbrante).

É aos poucos, por um roteiro preciso escrito por L.M. Kit Carson e Sam Shepard, que Wender vai nos apresentando o passado deste Travis como igualmente o apresenta ao protagonista desmemoriado. Encontrado, pelo irmão Walt (Dean Stanton), Travis volta ao convívio familiar após quatro anos sumido. Neste lar do irmão estão também sua cunhada e seu filho Hunter (Hunter Carson), que teve com Jane.

Na escalada pelo reconhecimento de si próprio, Travis vai redescobrindo o filho que esqueceu e o leva junto numa viagem em busca de Jane. Com seus diálogos lacônicos, “Paris, Texas” nos dá o personagem masculinos que é um dos mais duros consigo mesmo, mas também aponta para sua redenção quando ganha consciência de suas próprias fraquezas.

Assim, Travis vai encontrar Jane trabalhando na cidade de Paris, no estado do Texas, como uma stripper que, num quarto privado faz o que lhe pedem os clientes, com eles invisíveis aos olhos dela por conta de um vidro espelhado.

Só por este aspecto, “Paris, Texas” continua atual. Aquilo que não se consegue dizer olhando nos olhos, ganha aqui a possibilidade de ser esclarecido pelo intermédio de um espelho e um interfone entre o casal. Quem sabe se “Paris, Texas”, hoje refeito, não tivesse o vidro entre Travis e Jane retirado – permitindo que a verdade fosse dita – e em seu lugar estivesse um outro instrumento chamado “Whatsapp” ou “Facebook”.

RECONHECIMENTO – Em Cannes, “Paris, Texas” levou a Palma de Ouro de melhor filme, o prêmio da crítica internacional e o do júri ecumênico. Também concorreu ao Globo de Ouro de filme estrangeiro e foi eleito o filme do ano pela crítica londrina.

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