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Críticas

Boa Sorte

Judite e seu cachorro

Por Luiz Joaquim | 19.11.2014 (quarta-feira)

O argumento não podia ser mais eficiente em atrair como um imã aos multiplex o espectador de cinema interessado numa melancólica comédia romântica. Senão, vejamos: adolescente virgem é internado pelos pais em clínica para tratamento de dependentes químicos e lá conhece uma experiente e sedutora jovem soropositiva.

Paixão e dor prenunciados numa mesma oração. Não estamos falando de mais uma produção hollywoodiana sobre o amor impossível entre jovens apaixonados até a morte. O filme é nacional, chama-se “Boa Sorte” (Bra. 2014) e é o primeiro longa-metragem de ficção dirigido por Carolina Jabor (filha do Arnaldo), em cartaz amanhã. Há ainda outro chamariz de público que atende por duas palavras: Deborah Secco

Na produção o garoto é o iniciante João Pedro Zappa (como João), e ela é Secco (como Judite). Por meio de sua Judite, a atriz espera iniciar uma volta de 180 graus para sua carreira. Eleito pelo público como o melhor filme do 6º Festival de Paulínia do Cinema Brasileiro – também foi lembrado pela direção de arte -, “Boa Sorte” realmente chama a atenção pelo empenho e entrega da atriz, que várias vezes entra em cena despida literal e metaforicamente de seus atributos físicos.

Tendo perdido 14 quilos para encarar a garota drogada, portadora de HIV, que não tem nada a perder mas ainda assim é cheia de vida no confinamento em que vive na clínica, Secco encarou o filme de Jabor como seu “Filadélfia” (1993), aquele que deu o Oscar a Tom Hanks, ou “Bicho de Sete Cabeças” (2001), que veio a ser o melhor do portfólio de Rodrigo Santoro para o mercado exterior.

Menos soturno que os dois filmes citados, “Boa Sorte” pode funcionar nos circuito comercial não só pelo apelo melodramático que vive o casal, mas também pelo humor próprio do conto do qual foi adaptado: “Frontal com Fanta”, escrito pelo craque Jorge Furtado, que também fez a adaptação para o roteiro com o auxílio de seu filho, Pedro Furtado.

Curiosamente são as, digamos, digressões cômicas que deixam seus personagens menos consistente do que acreditamos serem. Se vemos na nossa frente se desenrolar o início de uma honesta paixão sem freios por parte de João para Judite, e de outra paixão – esta mais cautelosa – por parte de Judite para João, por outro lado testemunhamos os vícios da escrita dos Furtado pontuando um humor um tanto acima do tom para a circunstância dura que é a vida dos personagens.

Um exemplo simples para isto está em Judite acompanhando a piração de João em “brincar” de invisível na rua, após tomar sua dose de Fanta com a medicação Frontal. Nesse contexto os personagens não convencem pela loucura, ou pela alegria da irresponsabilidade própria da liberdade. Soam, ao contrário disso tudo, apenas como bobos. Sem falarmos nos trocadilhos, já cansados, tão repetidos nos trabalhos de Furtado. “Eu decidi que vou me manter na clínica”, anuncia João já apaixonado por Judite. Ela reaje: “Você tá louco!”. E ele: “Se eu tô louco, então devo mesmo ficar na clínica”.

De qualquer forma, Jabor fez um filme fluido. E a dupla João e Deborah funcionam na tela. Além deles parecerem estar se divertindo ali (o que ajuda a envolver o espectador), temos um instante de real beleza no filme com a entrada das ilustrações de Rita Wainer que se transformam em animações, envolvendo um cachorro e assinadas por Paulo Muppet. Elas surgem para compreendermos como Judite enxerga seu amor por João. É um momento delicado, que faz abrir bem nossos olhos.

APOSTA – No Festival de Paulínia, Deborah Secco disse com todas as palavras que era o trabalho “mais importante de sua vida”. Sabe-se, inclusive, que Secco lutou para conquistar esse papel, passando até a investir recursos próprios na produção.

TALENTO – Fernanda Montenegro tem participação especial como a avó descolada de Judite. A cena de “confronto” entre Fernanda e Secco é marcante. Débora está tranquila e bem, mas Fernandão, com tanto talento, parece estar brincando em cena.

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