A Entrevista
E a ameaça acabou com sorrisos
Por Luiz Joaquim | 29.01.2015 (quinta-feira)
Incensado pela mídia mundial em função do ataque de hackers da Coreia do Norte em dezembro do ano passado sobre o site da Sony Pictures – informando que se o filme “A Entrevista” (The Interview, EUA, 2014) fosse lançado o “mundo seria tomado pelo medo” – esta produção dirigida por Evan Goldberg com Seth Rogen (e protagonizada por este com James Franco, também produtor) – tornou-se o filme mais comentado do mundo nos últimos 50 dias.
No 18 de dezembro, a Sony chegou a anunciar que o filme não estrearia no Brasil até “segunda ordem”. Eis que chega o dia, amanhã, em que o polêmico filme irá invadir centenas de salas de todo o País, aparentemente sem nenhum pudor ou medo de represálias. A saber, o enredo da assumida comédia “A Entrevista” apresenta um plano fictício para matar o ditador coreano, Kim Jong-Un (no filme, o ator Randal Park).
Quando algumas poucas e pequenas salas nos EUA decidiram lançar o filme de toda forma, dia 24 de dezembro, a busca pelo acesso por lá tornou-se uma febre e alguns críticos apressaram-se em anunciar que o filme era ruim. Precipitaram-se.
É certo que se “A Entrevista” for lembrado pela história não será pela sua sutileza cinematográfica, mas pela repercussão política internacional. De qualquer forma, entrar no enredo alucinado criada pelo roteiro de Rogen, Goldeber e Dan Sterling é divertido sim. E, mais que isso, consegue-se enxergar ali sugestões de reflexão a respeito da estupidez da mídia do entretenimento.
Nesse sentido, Dave (Franco) é a figura icônica dessa estupidez. Parecendo ter a idade mental de um adolescente de 13 anos, e apresenta na tevê o Skylark Show. Um programa de entrevistas cuja semelhança brasileira mais próxima está no formato da Marília Gabriela.
A fama do show, entretanto, está em trazer revelações bizarras com estrelas hollywoodianas, como a entrevista (fictícia) com o rapper Eminem, que se revela gay; ou o bonitão Rob Lowe, que declara usar peruca pois sofre de queda de cabelo desde 1983; ou ainda sobre as preferências zoofílicas de Matthew McConaughey.
Mas o sério Aaron (Rogen), amigo de faculdade de Dave, sente-se ofendido pelo produtor do respeitado jornalístico “60 Minutos” justo na comemoração dos dez anos do Skylark Show. É quando Dave sugere a Aaron organizar uma entrevista com o homem mais inacessível do mundo e daí provar sua competência.
Uma vez conseguida a entrevista – numa facilidade que o roteiro não está interessado em detalhar -, agentes da CIA entram em ação determinando que os dois jornalistas irão virar espiões e aproveitar a situação para eliminar o ditador coreano.
Estereótipos ofensivos contra a figura do ditador Kim são disparados a cada minuto em que a condição política da Coreia do Norte e as esquisitices de seu lider são lembradas pelos dois jornalistas.
Não são ofensas leves, mas parecem fazer parte de um elenco de xingamento que caberia a qualquer personagem público – seja do show business ou não – que promova ações inusitadas, como a realizada pelo verdadeiro Kim Jong-Un, um comunista linha dura que em 2012 organizou um show pirata em seu país da turma do Mickey Mouse, de quem é fã.
Outro fator que amarra bem o humor de “A Entrevista” está nas constantes relações que faz com o próprio universo do cinema – uma marca nos filmes de Rogen (vide “Ligeiramente Grávidos”, “É o Fim”). Um exemplo disso em “A Entrevista” está em Dave medir sua amizade com Aaron relacionando a proximidade dos personagens de “O Senhor dos Anéis”.
Nas piadas aqui é bom não esperar nada mais sofisticado do que situações sexuais, particularmente com circunstâncias, digamos, anais. Mas, curiosamente, “A Entrevista” faz piada de si próprio quando, a certa altura, uma interprete norte-coreana pergunta a Aaron porque a insistente fixação dos norte-americanos com conotações sexuais. Aaron fica sem resposta. É quase como se Seth Rogen dissesse aos espectadores: nada melhor que rir de nossas próprias fraquezas. Coisa que ditadores, definitivamente, não fazem e nem toleram.
HISTÓRICO – No início de janeiro, com apenas seis dias de disponibilidade na internet pelo GooglePlay e YouTube Movies, “A Entrevista” tornou-se o filme mais rentável nestas plataformas. Especialistas dizem, entretanto, que o caso, muito específico, não serve de referência como mudança para a indústria.
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