87º Oscar (2015) – premiação
A noite de Birdman e Grande Hotel Budapeste
Por Luiz Joaquim | 24.02.2015 (terça-feira)
Ah, o Oscar… Quantos eventos no mundo ganham a atenção de mais de 100 países simultaneamente? Quantas festas, no dia seguinte, são assunto obrigatório nas rodas de amigos do mundo inteiro? Por mais “quadrado”, cansativo e muitas vezes cafona a cerimônia de premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que na noite de domingo (22) promoveu sua 87ª edição no Dolby Theater em Los Angeles, sempre vence no quesito popularidade.
Objeto de apostas sobre quem leva a estatueta dourada, objeto de brincadeiras pelas gafes dos convidados, objeto de críticas pelas piadas de seu mestre de cerimônia (e também pelo seu mais tradicional comentarista brasileiro, o crítico Rubens Ewald Filho), além de foco de atenção pelos vestidos milionários das estrelas, o Oscar raramente surpreende em suas premiações – muito embora nunca deixe a todos satisfeitos com seus resultados.
Mas, em suas quase quatro horas de transmissão – que deu quatro troféus ao filmes “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância” (inclusive o de melhor filme e direção para o mexicano Alejandro González Iñárritu) -, a festa vem repleta de surpresas inesperadas que acabam dando uma especificidade a cada edição. Neste ano, os discursos sociais pautaram aqueles que foram os mais interessantes agradecimentos.
Logo no primeiro prêmio da noite, a atriz Patrícia Arquette (atriz coadjuvante por “Boyhood: Da Infância à Juventude), literalmente levantou a plateia e arrancou aplausos entusiasmados de sua concorrente Meryl Streep quando exigiu direitos iguais para as mulheres nos EUA enquanto agradecia pelo troféu. Qual a banda teria coragem de enxotar do palco, com música, a atual mãe mais querida da América.
Já nas redes sociais as piadas chamavam a atenção para a quantidade de figuras negras como convidados da Academia para apresentar as premiações. O assunto entrou em questão pois o ótimo filme “Selma”, sobre um episodio real e específico na luta liderada por Martin Luther King contra o racismo teve apenas duas indicações, melhor filme e canção (“Glory”). Nesta última saiu premiado e nos agradecimentos, seus autores Common e John Legend lembraram que “quando se marcha na China por democracia, ou se luta pelo direito de expressão em Paris, tudo isso está conectado com o espírito de “Selma” e “Glory”.
Curiosamente, menções a problemas sérios como o suicídio estiveram na fala de dois premiados. O mais contundente veio do jovem Graham Moore, vencedor pela adaptação do roteiro de “O Jogo da Imitação”. Moore revelou que aos 16 anos tentou o suicídio porque se sentia “diferente, deslocado da sociedade”. Encerrou dedicando o prêmio aos jovens que hoje sentem-se como ele se sentia e pediu para que eles continuassem “diferentes”, e quando estivem no palco como ele, que repassassem esta mesma mensagem. Detalhe, Alan Turing, protagonista do filme, cometeu suicídio em 1954 por ser punido como um homossexual declarado.
Um pouco antes, uma das premiadas – Danna Perry, pelo curta-metragem documentário (“Crisis Hotline: Veterans Press 1”, sobre veteranos de guerra em crise) – dedicou o prêmio ao filho que cometera suicídio. Num mau momento, o mestre de cerimônia Neil Patrick Harris soltou, na sequência, uma piada infame fazendo trocadilho com o vestido de bolinhas da premiada. “It takes a lot of balls to wear a dress like that” (“É preciso muito coragem para usar um vestido deste”).
Patrick Harris, a propósito, não conseguiu superar a simpatia de Ellen DeGeneres e seu famoso selfie de 2014. A piada mais surpreendente do apresentador ficou por conta da menção a sequência em que Michael Keaton aparece de cuecas na Times Square, em Nova Iorque em “Birdman”. Mas, o grande momento da noite, ninguém questionava, aconteceu com o videoclipe em comemoração dos 50 anos do filme “A Noviça Rebelde”, com a extravagante Lady Gaga, sob controle, oferecendo uma performance comovente da canção tema do filme, “The hills are alive”. Depois dessa, ninguém mais questiona os atributos musicais da moça, que recebeu no palco um abraço da atriz Julie Andrews, a noviça do filme.
PREMIADOS – Os outros principais premiados foram “Grande Hotel Budapeste”, que levou pelo Figurino, Maquiagem, Direção de Arte e Trilha Sonora. “Para Sempre Alice”, deu a Julianne Moore seu primeiro Oscar. Eddie Redmayne ficou como melhor ator por “A teoria de tudo”. J.K. Simmons foi o ator coadjuvante por “Whiplash” – que ainda ficou com Montagem e Mixagem de Som. Já Edição de Som foi para “Sniper Americano”; e filme estrangeiro para o polonês “Ida”.
Para (ainda) ver no Recife
Dos 60 filmes que concorreram no último domingo a 87º premiação do Oscar, nove deles ainda podem ser vistos nas salas de cinema do Recife. Mas dois detalhes não facilitam a vida dos retardatários curiosos que querem tirar o atraso mesmo com o cerimônia já encerrada.
Muito deste filmes tiveram sua data de estreia em 2014 e se permanecem exibindo até hoje nos cinemas é por insistência das salas exibidoras mais alternativas da cidade, como o Cinema da Fundação Joaquim Nabuco (que exibirá o vencedor de melhor filme estrangeiro, o polonês “Ida”, a partir de quinta-feira); do São Luiz, que exibe hoje e amanhã às 15h30 “Grande Hotel Budapeste” (vencedor pelo figurino, direção de arte, maquiagem, trilha sonora), assim como o argentino “Relatos Selvagens” às 17h30.
Há ainda o Cine Rosa e Silva, que projeta junto ao Cinema da Fundação, o francês “Dois Dias, Uma Noite” em sessões diversas (ver roteiro no “Guia Folha”). O Rosa e Silva também é a única casa que abriga o grande vencedor desta edição do Oscar – “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”, eleito como melhor filme, direção, roteiro original e fotografia – mas em apenas em uma sessão diária, até amanhã, às 21h.
Esta situação também está relacionada às características dos filmes que predominaram a cerimônia deste ano, ou seja, produções com o perfil mais alternativo. Para o cineasta Kleber Mendonça Filho, “Birdman” não é o pior do Alejandro G. Iñárritu mas “a Acadêmia desperdiçou a chance de premiar autores, uma vez que este ano eles tinham três deles na principal premiação: Richard Linklater, Clint Eastwood e Wes Anderson”, pontua o diretor de “O Som ao Redor”.
Daniel Aragão, diretor de “Prometo Um Dia Deixar Esta Cidade”, concorda com o colega no que diz respeito a valorização pelo mainstream dos filmes mais alternativas, mas se diz satisfeito pelo reconhecimento de Iñárritu. “Tenho contato com pessoas que o conhecem e sei das dificuldades que ele passou para chegar onde está. É legal que seu cinema tenha chamado a atenção como o polonês Ida e o russo Leviathan”, diz o cineasta.
Para Leonardo Lacca, diretor de “Permanência” e fã de David Lynch, foi muito curioso ver três atrizes – Patrícia Arquette, Naomi Watts e Laura Dern – “descobertas” pelo diretor de “O Homem Elefante” concorrendo ao Oscar. Já o jornalista e professor de comunicação da Universidade Federal de Pernambuco, Thiago Soares, a grande vitória da cerimônia este ano foi o “surpreendente tom político nos discursos dos premiados, a começar por Reese Whiterspoon, que ainda no tapete vermelho falou a repórter do canal E! que não estava ali para falar do vestido, mas sim de seu trabalho; passando pelo discurso de Arquette em defesa da igualdade entre as mulheres, e o próprio agradecimento dos premiados por Selma contra o racismo. A cerimônia mostrou que há algo ainda de muito arcaico nos bastidores de Hollywood e que o Oscar pode ajudar a mudar esse cenário”, analisou.
Na outra mão dos títulos concorrentes, fugindo do padrão alternativo, e por isso mesmo ainda possíveis de serem encontrados em cartaz em vários multiplex da cidade e em diversos horários estão “Sniper Americano”, de Clint Eastwood, contemplado com o Oscar de edição de som; “O Jogo da Imitação”, com oito indicações e uma premiação (pelo roteiro adaptado); “A Teoria de Tudo”, que contemplou Eddie Redmayne como melhor ator; e “Caminhos da Floresta”, que deu a 19º indicação a Meryl Streep.
CINE-PE – A organização do Cine-PE prepara uma surpresa para sua abertura da edição 2015 (02 de maio) assim como foi em 2014, quando fez a primeira exibição no Brasil de “Grande Hotel Budapeste”, que levou quatro Oscars neste domingo. A direção do festival está em negociação com a Fox para fazer uma outra sessão inédita, agora na América do Sul. Satisfação também é a palavra para a quantidade de inscritos para a competitiva. Foram mais de 270 filmes, com preponderância da Argentina.
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