Selma
Pelo não ao voto branco, ou preto, mas sim universal
Por Luiz Joaquim | 05.02.2015 (quinta-feira)
Uma boa cena chave, entre várias, em “Selma: Uma Luta Pela Liberdade” (Selma, EUA, 2014) sintetiza bem o que o filme de Ava DuVernay quer ilustrar com a longa jornada de Martin Luther King Jr. (1929-1968). No caso, a jornada focada pela produção parte em 1965 do município de Selma, no estado norte-americano do Alabama, até Montgomery, capital do mesmo, em busca de igualar com os brancos o direito ao voto para a população afro-americana.
A tal cena acontece quando o ativista político vai consolar um octogenária negro que vela a morte do neto de 27 anos, Jimmie Lee Jackson (Lakeith Lee Stanfield), assassinado a sangue frio num confronto contra a polícia. Aos 85 anos, tendo nascido na época do processo do fim da escravatura nos EUA, o velho segura o choro pela morte do neto e segreda a Luther King (David Oyelowo) o argumento esperançoso que o neto lhe dizia para participar da luta pela causa. Ele dizia: “O senhor irá votar mais cedo do que pensa”.
São conversas como estas, criadas pelo bom roteiro de Paul Webb, que revelam um lado humano e titubeante diferente daquele da figura pública inabalável que se tornou Luther King ao longo das últimas cinco décadas com sua conhecida fé pela conquista dos direitos civis.
“Selma” reforça sim a coerência do discurso do pastor protestante – principalmente nas conversas dele com o presidente Lyndon Johnson (Tom Wilkinson) -, mas também o mostra em sua solidão diante de decisões que envolvem a vida de milhares que o seguem, e o sacrifício e a distância que precisa tomar de sua família em todo esse processo.
Com direção de arte impecável, canções afinadas ao tom do drama (“Glory” concorre ao Oscar), e atores como Giovanni Ribisi, Tim Roth e Oprah Winfrey (também produtora) afiados com o embate de ideias instigadas pelos belos e inspirados discursos públicos de King, “Selma”, o filme consegue nos colocar dentro da sensação de urgência daquele momento e desenhar a dimensão da tensão no desenrolar das manifestações lideradas pelo ativista, nas quais seu plano sempre era nunca reagir para ressaltar ainda mais a agressão física das autoridades racistas e daí ganhar o apoio da opinião pública pela imprensa.
Ao recontar estas circunstâncias reais que mobilizaram os EUA numa mesma época em que o País empregava milhões numa guerra “para resgatar a paz” (sic) no Vietnã, “Selma” consegue amarrar uma bela história a partir de dados verídicos (por relatórios do FBI) com os possíveis dramas vividos por um homem que, como ele diz, não era diferente dos outros, querendo apenas viver muito e ser feliz, mas que para isso precisava constantemente desviar seu foco pelo luta em direção a igualdade, que até ele mesmo, às vezes, relativizava.
HOLLYWOOD – “Selma” concorre em duas categorias do Oscar no dia 22 de fevereiro: ao título de melhor filme e melhor canção. Quando foi divulgada a lista dos indicados em 15 de janeiro, parte da crítica norte-americana manifestou-se indignada pela chance que a Acadamia perdeu de dar a Ava DuVernay de ser a primeira diretora afro-americana a concorrer ao Oscar pela direção de um filme.
0 Comentários