A hora do protagonismo feminino
Dívida de Honra, Soledad, Anedonia
Por Luiz Joaquim | 08.03.2015 (domingo)
No mundo ainda essencialmente masculino em que vivemos, o cinema segue nos surpreendendo dando pistas de universos tradicionalmente dominado por eles, mas que também poderiam ser protagonizado por elas. Um exemplo? O faroeste. O Cinema da Fundação Joaquim Nabuco dá uma prova disso hoje, em sessão única e especial às 18h10, de “Dívida de Honra” (The Homesman, EUA, 2014), filme dirigido e atuado por Tommy Lee Jones, mas tendo Hilary Swank (de “Menina de Ouro”, 2004) como protagonista.
Tendo feito parte da competição oficial do Festival de Cannes em 2014, “Dívida de Honra” (que só estreia 19/03) nos leva ao ambiente árido de Nebraska, velho oeste norte-americano, em 1854, onde três mulheres são confiadas à guarda de uma outra mulher. Ela é Mary Bee Cuddy, figura de personalidade forte e independente. Mary precisa levar as três para o Leste do país num vagão fechado. No destino, em Iowa, as três poderão encontrar refúgio das experiências duras que passaram pela vida.
“Para mim, o western não é exatamente aquele gênero onde apenas temos homens lutando contra índios. O western está mais para a complexidade de se lidar com espaços virgens, e como precisamos entender como estes espaços funcionam”. Quem comenta é o cineasta Daniel Bandeira, que divide a assinatura do inédito curta-metragem “Soledad” com Flávia Vilela e Joana Gatis. Esta última atuando também como protagonista deste faroeste pernambucano, rodado ano passado no Janga, Maria Farinha e no nascedouro de Peixinhos.
Assim como a heroína vivida pela oscarizada Hilary Swank, nossa Soledad é uma errante que sobre seu cavalo vai desbravando um western praieiro e enfrentando as dificuldades que lhe surgem a frente. “Ela é uma mulher misteriosa, que não se revela fácil. E sua força vem da dança, do flamenco. Ela é forte, mas não dura, mesmo tendo tido vivido talvez uma das piores traições. E isso não tem nada a ver com coisa de mulherzinha. Está lá mais num sentido simbólico, que todas as mulheres irão entender, e deve aproximar-se de alguns homens também”, adianta Joana.
“Nós ainda vivemos um período em que a gente tenta entender quais são os nosso papeis, e em como podemos coexistir”, chama a atenção Daniel Bandeira. Sua fala corrobora com a lógica do jornalista André Valença, que concluiu seu primeiro curta-metragem com características mais profissionais.
Em “Anedonia” – que é um dos indícios de depressão, significando a perda do desejo -, temos uma mulher (a atriz cearense Ceronha Pontes) que vive uma espécie de processo interno de libertação a partir de sua própria casa. “Há a sexualidade feminina no filme, mas ele fala essencialmente sobre estar bem com você mesmo, independente dos outros”, contextualiza André.
“O curioso é que quando as pessoas sabem que fiz um filme sobre a sexualidade feminina, há duas reações. Uma é -como é que você, em seu primeiro filme, não fez algo sobre você?-. A outra é uma espécie de acusação, dizendo que um filme assim deveria ser dirigido por uma mulher”, revela.
Para o realizador, a principal qualidade de uma obra de arte é a empatia que ela provoca. “Me pergunto se -Azul É a Cor mais Quente- fosse dirigido por uma mulher se ele seria melhor. Talvez sim, talvez não. Outro dia ouvi o refrão de uma música com Gilberto Gil que dizia: -Me dê um copo d água, tenho sede-. Acho que Gil nunca passou essa sede, mas nem por isso ele não pode interpretá-la?”, relativiza André.
Curtas mais próximo da estreia
“Anedonia”, curta-metragem de André Valença, está próximo de chegar ao espectador comum. O filme, que teve um time de craques na técnica – como Marcelo Lordello na fotografia, João Maria na montagem, e Simone Dourado na captação de som -, já está com o corte final de montagem e os processos de finalização concluídos. Nesta quarta-feira, o cineasta fará apenas um teste de projeção (fechada para a equipe) no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco.
“Muito despretensiosamente, começamos a inscrever o filme nos festivais. E o raciocínio foi ir do maior para os menores. Inscrevemos para a “Semana dos Realizadores” [em Cannes], e daí tentaremos outros. No Brasil, queremos tentar o Festival de Brasília, onde Lordello é inclusive respeitado”, lembra o diretor.
No caso de “Soledad”, sua equipe lança hoje seu crowdfunding para arrecadar recursos que possibilitem a pós-produção do filme. “Já temos o corte final. O filme ficou com 22 minutos. Mas ainda precisamos trabalhar na edição de som, na mixagem de som, na aplicação de efeitos e na correção de cor”, explica Daniel Bandeira.
O crowdfunding funciona de maneira que as pessoas doam deliberadamente recursos para a obra através de cotas a um site administrador do processo (no caso de “Soledad”, o endereço é http://catarse.me/pt/soledad ). “Estabelecemos o teto de R$ 30.510, que cobrirá todas as despesas, incluindo a confecção de um DCP [o arquivo digital profissional do filme para exibir nos cinemas]”, diz o diretor.
Daniel diz que quem contribuir com as cotas terá uma espécie de recompensa que será definida posteriormente. O valor total do teto só é destinado a equipe do filme pelo site quando atinge o valor estabelecido. “Se não atingirmos os R$ 30.510 até 08 de maio, o dinheiro que já foi depositado será devolvido as doadores”, concluiu.
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