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Festivais

4o Olhar (2015) – A Vida É Estranha

Um novo Glauber

Por Luiz Joaquim | 15.06.2015 (segunda-feira)

CURITIBA (PR) – É provável que entre toda seleção dos 92 filmes deste 4o Olhar de Cinema: Festival Internacional de Curitiba não houvesse obra mais curiosa a ser vista que um registro de viagem com 39 minutos, realizada em 1973 na bitola Super-8, de nome “A Vida É Estranha”.

A razão de tanto interesse? Quase que a totalidade das imagens foram feitas por Glauber Rocha (1939-1981) junto a sua então namorada, a musicista novaiorquina Mossa Bildner – hoje residente em Curitiba – quando eles estavam na cidade de Essaouira, no Marrocos. São imagens que nunca saíram da estante da cantora.

“Ao longo da vida, passei as imagens de Super-8 para VHS, depois para DVD. Mantinha comigo e só mostrava a alguns amigos. Sei da importância da figura de Glauber para mundo, mas nunca pensei que alguém pudesse se interessar por estas imagens”, comentou uma emocionada Mossa, hoje uma senhora sexagenária, na noite de sexta-feira após a primeira exibição pública do filme que foi restaurado e convertida paro o formato digital profissional, DCP, pela produção do Olhar de Cinema.

Mossa conheceu Glauber ainda adolescente, em Ipanema, “mas só anos depois, numa festa em Nova Iorque, na casa de um parente, nos reencontramos e houve um clique entre nós. Em 1973 eu estava no Marrocos, ele soube e me enviou um telegrama dizendo queria muito ir lá conhecer”, relembrou.

“A Vida É Estranha” inicia com imagens feita pela própria Mossa, mostrando um Glauber aos 34 anos numa barbearia marroquina sendo que, o que vem na sequência, são imagens captadas pelo cinemanovista. “A câmera parecia atachada na mão dele, não havia outro assunto que não fosse cinema. Naquela época, ele dizia que queria adaptar ‘Palmeiras Selvagens’, de William Faulkner, e que iria ser o filme de sua vida”, recorda.

E arrisca: “Eu, na minha cabeça, ao ver alguns imagens feitas no Marrocos, penso que ali havia um espécie de experimentação para o que ele gostaria de fazer para este projeto”.

ESTETICA
Entre as imagens aqui feitas pelo diretor de “Deus e O Diabo na Terra do Sol”, vemos seu interesse pelas mulheres de burca que andam pelas ruas e tentam evitar a câmera insistente do cineasta; vemos pessoas interagindo numa praça, muitos hippies, enquanto compartilham um narguilé (cachimbo de água para fumar tabaco aromatizado); além dos arredores do hotel, quando ele concentra-se na vegetação ao redor.

Sem alterar a sequência das imagens originalmente captadas para a versão que veio a público, Mossa apenas interveio na definição da trilha sonora que climatiza (bem) toda a extensão da obra. “Não tive coragem de mudar a ordem das imagens, não era da minha competência. Já para a trilha sonora começamos com o som da Gnawa Lila (estilo marroquino) e queria encerrar com algo mais lúdico, daí a canção musicada por mim em 2009 em Londres para uma poesia de Clarice Lispector, de quem sou fã”, concluiu.

Para Aly Muritiba, um dos diretores do festival, “A Vida É Estranha” agora terá uma vida pública e o “calvário”, como disse Mossa, para ressuscitar esse registro já valeu a pena, uma vez que ele poderá suscitar interesse no mundo inteiro, como aconteceu na primeira exibição em Curitiba.

ANTONIONI – Em sua estada na Itália, Mossa Bildner conheceu Michelangelo Antonioni (1912-2007) e foi convidada para interpretar o papel da turista em “Profissão: Repórter” (1975), que acabou sendo defendido pela francesa Maria Schneider (de “O Último Tango em Paris”) porque Mossa precisou voltar ao Brasil em função da morte de sua mãe.

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