39ª Mostra de SP (2015): Todas as Cores da Noite
Pedro Severien investiga o universo feminino
Por Luiz Joaquim | 24.10.2015 (sábado)
SAO PAULO (SP) – A noite de quinta-feira teve na 39a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo o palco para o nascimento no Brasil de um novo filme de Pernambuco. Falamos de “Todas as Cores da Noite”. Estreia num longa-metragem de Pedro Severien, autor de curtas-metragens como “Canção para Minha Irmã” (2012), “Loja de Répteis” (2014), e que aqui arrisca-se no seu primeiro vôo de maior fôlego, cuja primeira exibição já aconteceu no Festival de Atlanta (EUA), também em sua 39a edição.
Amparado pela adesão e comunhão de vários amigos de longa data (o roteirista Luiz Otávio Pereira, os fotógrafos Beto Martins e Daniel Aragão, o músico Tomaz Alves Souza), e de novos amigos que souberam submergir com elegância ao particular mar da dramaturgia intimista de “Todas as Cores…” (como a atriz paulista Sabrina Greve, a dona da galeria em “Permanência”) -, Severien conseguiu acrescentar agora a sua filmografia mais uma obra que o vai colocando num lugar de risco no cinema brasileiro, mas que é, ao mesmo tempo, gerador de um instigante prazer estético.
O risco que Severien assume é o de modular sua história num universo fantástico. Como ele bem disse na conversa após a sessão, os ambientes fechados e os demônios que podem surgir dessa clausura física – como há num de seus filmes prediletos “O Anjo Exterminador” (1962), de Buñel – lhe interessam, e muito.
E o apartamento com vista para a praia de Boa Viagem, onde vive Iris (Greve), serve como espaço que a aprisiona com seus fantasmas particulares. Tudo isso é estimulado pelo cadáver de um homem (Rômulo Braga) que ela encontra na sala de estar como legado da festa na noite anterior. Quem é ele? Iris não sabe.
Podendo ser enxergado por três módulos distintos “Todas as Cores…” chama a atenção para um encadeamento de relações que envolvem julgamento e culpa de quatro personagens femininas, da classe média alta, que dominam todo o enredo.
No envolvente prólogo, antes mesmo dos créditos surgirem, conhecemos exclusivamente pela perspectiva de Iris, narrando em off, a história de sua amiga de infância, a médica Tiara (Giovanna Simões) com seu desfecho trágico. A composição plástica rigorosa e de combinações de som reforçam a firmeza na mão do cineasta como assinatura ao difícil universo fantástico.
O som (Guga Rocha e Simone Dourado), a propósito, é outro ponto fortíssimo em “Todas as Cores…”. Este é um filme cuja parte vigorosa que o torna envolvente encontra na boa projeção sonora um elemento imprescindível.
A montagem de Daniel Bandeira e Maria Cardozo também tem sua lógica particular na evolução das emoções de Iris. Se no episódio de Tiara a dinâmica da edição anda num ritmo frenético fazendo correlações entre a feiúra e a mentira por trás das relações civilizadas da burguesia – atenção ao jogo aqui feito com decorações para casamentos -, num segundo instante esse rotação diminui.
Ela vai se encaminhando de forma gradativa até o final para a introspecção por meio de monólogos, inclusive com Nanda (Brenda Lígia) a amiga de Iris que vai lhe ajudar com o cadáver; e com uma mulher mais experiente, Elga (Sandra Possani, de “Cão sem Dono”); e até com o cadáver.
Ao final, uma deslumbrante cena de amor quase redentora, com o mar ao fundo como que invadindo o apartamento casulo e sugerindo uma libertação que em nenhum momento é sentida ao longo de “Todas as Cores da Noite”. Falar-se-a muito sobre a obra de Pedro Severien. O filme exibirá na 8a. edição do Janela Internacional do Recife.
DUPLAS – O preâmbulo que conta a história de Tiara em “Todas as Cores da Noite” foi fotografado por Daniela Aragão. Beto Martins assumiu o que se vê na sequência. A edição inicial foi tocada por Daniel Bandeira, enquanto Maria Cardozo finalizou seu processo.
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