Horas de Desespero
Horas de ação e reflexão
Por Luiz Joaquim | 08.10.2015 (quinta-feira)
Uma pena que a estreia no Brasil de “Horas de Desespero” (No Escape, EUA, 2015), escrito e dirigido pelo jovem e talentoso John Erick Dowdle tenha sido adiada de 17 de setembro para 8 de outubro. Pena porque duas semanas antes da original data de lançamento do filme, o mundo concentrou-se em uma foto jornalística que mostrava o menino sírio morto na praia da Turquia, vítima da crise migratória que matou milhares do Oriente Médio e da África.
Mas qual a relação entre a emblemática tragédia e o novo filme estrelado por Owen Wilson? Em primeiro lugar, não vá atrelar aqui a imagem de Wilson ao humor. “Horas de Desespero” é um dos melhores filmes de ação deste 2015 e, invariavelmente, vai colocar o espectador num crescente de tensão, mais e mais insuportável a cada dez minutos de projeção por toda sua extensão.
Assim como o menino sírio da realidade, Wilson é no filme uma pessoa vulnerável que depende de sua perseverança e da política internacional para sair daquilo que pode ser descrito como o inferno sobre a Terra. Ele é Jack. Um norte-americano que em mudança com a família – a esposa Annie (Lake Bell) e duas filhas pequenas (Sterling Jerins e Claire Geare) – para um país indefinido no sudoeste da Ásia.
Engenheiro de uma grande empresa de tratamento de água, ele ganha a função de gerenciar um grande projeto no tal país. Sem ninguém da empresa para recebê-lo, logo no primeiro dia no hotel descobre que não há eletricidade, telefone ou internet. A cidade inteira está assim.
No dia seguinte, ao sair para comprar jornal, depara-se com rebeldes enfrentando os militares do país num confronto sangrento e, já na fuga para o hotel, vê um norte-americano ser assassinado a queima-roupa pelos rebeldes. Tanto Jack quando o espectador são mantidos ignorantes sobre qual a real razão pelo ódio dos nativos aos sobrinhos do Tio Sam e estabelece-se, imediatamente, apenas uma urgência ao protagonista. Fugir. Encontrar uma saída de um país que inteiro, sob uma recém-instaurada guerra civil, tem pelo menos um objetivo bem claro (o único que sabemos inicialmente) bem claro. Matar estrangeiros.
Nesse sentido, “Horas de Desespero” assemelha-se ao filme que revelou Erick Dowdle – “Quarentena”, de 2008 (uma versão para os americanos do ótimo espanhol “Rec”, de 2007). Enquanto em “Quarentena” uma repórter tenta fugir de um prédio fechado com pessoas violentas e contagiosamente infectadas, Jack tentar sair daquele país onde todos querem executá-lo junto com sua família.
As razões da revolução no tal país são surpreendentemente bem explicadas pelo personagem de Pierce Brosnan, cuja importância é muito maior do que ele deixa transparecer no início do filme. E é por apresentar um enredo muito próxima da realidade que “Horas de Desesperado” soa tão mais assustador que “Quarentena”.
Em seu roteiro, Erick Dowdle cria circunstâncias de tensão tão absurdamente limítrofes para um pai que quer apenas proteger sua esposa e filhinhas que, uma vez ultrapassada, o espectador irá respirar aliviado achando que nada pode ser pior. A certeza cai por água abaixo em poucos minutos, quando um novo desafio e colocado à Jack.
Para quem não acredita na capacidade de Owen Wilson para sustentar tanta tensão de forma séria e convincente, este será obrigado a tirar o chapeu. Na verdade, os astros parecem ter se alinhados em todos os aspectos (leia-se talento e trabalho duro de todos os envolvidos) para tornar “Horas de Desespero” num filme em que ritmo, ação e (incrível!) reflexão socio-política são equalizados de maneira certeira.
Ao final, uma provocação. É na generosidade do Vietnã que está a única salvação de uma refugiada família norte-americana. E mesmo que o espectador não consiga, pelo filme, refletir sobre o momento delicado a respeito de refúgio político em que o nosso mundo real vive, sairá da sala de cinema fatalmente excitado com tanta emoção.
ELENCO – Michelle Monaghan estava originalmente escalada para o papel da esposa de Owen Wilson, mas as filmagens atrasarão e ela engravidou. Lake Bell assumiu então seu personagem.
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