Terra de Maria
A fé que move montanhas de pessoas ao cinema
Por Luiz Joaquim | 28.10.2015 (quarta-feira)
Há um silencioso fenômeno cinematográfico acontecendo nesse momento no Cinemark RioMar – e em toda a rede de complexo de cinema no Brasil. Chama-se “Terra de Maria” (Mary s Land, Esp. 2013), um documentário espanhol que em sua estreia (12 de outubro) não teve campanha publicitária na mídia impressa nem no rádio ou tevê, não recebeu nenhuma crítica nos jornais ou em blogs de cinema, e não tem nenhuma estrela em seu elenco. Apesar disso, que hoje soa fundamental para um filme fazer sucesso, “Terra de Maria” vem esgotando com antecedência de um dia todos os ingressos das sessões programadas no Recife.
A premissa dramatúrgica é simples: um agente secreto (Juan Manuel Cotelo, também diretor do filme) é contratado para investigar ao redor do mundo o porquê das pessoas ainda no século 21 acreditam nas aparições da Virgem Maria e peregrinarem em multidões para os lugares dessas anunciadas aparições. O agente J. M. (satirizando James Bond) precisa descobrir porque essas pessoas não apenas tomam os ensinamentos de Nossa Senhora como guia para suas vidas mas também estimulam outras pessoas a segui-la.
O mote, levado em tom cômico, funciona principalmente como um laço narrativo para amarrar as entrevistas reais e documentais feitas em mais de dez países por Juan Manuel (ator conhecido pelo sucesso espanhol “Da Cama para a Fama”, 2003). O fio dramaturgico serve também para agir como uma espécie de “destencionador”. Com o humor (ingênuo, é verdade) posto do desconfiado agente, que se apresenta como “o advogado do Diabo”, o filme “Terra de Maria” vai sendo conduzido entre uma fala e outro de dez personagens, entre pessoas influentes e outras anônimas de fé inabalável no poder de Nossa Senhora.
Entre eles está John Rick Miller, ex-assessor do governo norte-americano, que deixou sua carreira para a partir de Londres divulgar os preceitos católicos a grandes líderes políticos. Na Colômbia, J.M. entrevista a top model Amada Rosa Pérez, que converteu-se após um aborto traumático. Já em Washington (EUA) vemos o depoimento do médico John Bruchalski que trabalhava legalmente num hospital fazendo abortos e, após visitar o campo santo de Medjugorje, na Bósnia e Herzegovina, abriu uma clínica onde atende fazendo partos.
Os depoimentos que vemos em “Terra de Maria”, a princípio buscados pela produção para reforçar a fé do espectador católico não-praticantes, não abusa desse objetivo. Não procura convencer mas apenas compartilhar experiências de vidas transformadas a partir de um ponto de inflexão na vida de pessoas que um dia eram céticas, como se apresenta “o advogado do Diabo”, a que tudo questiona, como um bom documentarista.
Mesmo fora do universo religioso, o filme pode ser visto como um interessante e inteligente projeto que vai na jugular de qualquer espectador sensível. Mostra pessoas ao redor do mundo que sofrem espiritualmente por questões particulares e alcançam conforto por passar a acreditar em algo além de si mesmo. Considerando que, em alguma escala micro ou macro, o espectador pode se identificar com algum conflito e daí atentar à palavra de ordem pacificadora replicadas nos depoimentos, “Terra de Maria” consegue prender a atenção. Já no caso particular dos católicos praticantes que lotam as sessões, “Terra de Maria” parece provocar uma catarse. Daí o boca-a-boca. Daí o êxito na bilheteria.
MERCADO
O plano original da Cinemark era realizar apenas três sessões do filme no Brasil: uma no 12 de outubro (dia de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil), e outras dias 14 e 17 do mês. Mudou de ideia logo após perceber a procura pelos ingressos no dia 12, e passou a programar, a partir do dia 13, uma sessão por dia (exceto no domingo). O sucesso garantiu uma segunda semana em cartaz – que encerra hoje com sessão às 20h50 -, e muito provavelmente ganhará uma terceira semana no Recife a partir de amanhã, muito embora até o fechamento desta edição a rede exibidora ainda não havia confirmado a continuidade das exibições por aqui.
SINOPSE –
“Adeus, Pai Nosso. Se não os vemos, não acreditamos. Decidimos viver assim, como se não existissem. Contudo… milhões de pessoas continuam a falar da Virgem Maria, a quem chamam “Mãe”. Acreditam que somos filhos de Deus e, por isso, chamam-no de “Pai”. O Advogado do Diabo recebe uma nova missão: investigar, sem medo, esses que ainda confiam nas receitas do céu. São uns enganadores ou foram enganados? Se as suas crenças forem falsas, a nossa vida continuará igual. Mas… e se não for um conto de fadas?”
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