19ª Tiradentes (2016) – Balanço
Um edição especial
Por Luiz Joaquim | 31.01.2016 (domingo)
TIRADENTES (MG) – Há, e não é de hoje, uma certa cisão entre as opiniões no meio cinematográfico a respeito do nível da elaboração intelectual gerado nos debates chamados “Encontro com o Diretor, a Crítica e o Público”, promovidos nos últimos dez anos pela Mostra de Cinema de Tiradentes.
O debate consiste numa análise diária, pela manhã, de um critico convidado , após ter visto um filme brasileiro inédito na noite anterior, para depois escutar as imediatas considerações do diretor ao seu lado e, na sequência, questões levantadas pela platéia. Platéia que quase invariavelmente lota o auditório do Cine-Teatro Sesi na cidade.
Na cisão, de um lado ficam aqueles que enxergam os discursos desenvolvidos como engessados em conceitos teóricos, com retóricas escapistas e inacessíveis, sem encarar a problemática dos filmes de frente, enquanto outros enxergam aqueles encontros como a maior e melhor oportunidade no Brasil para se discutir em profundidade um novo filme nacional.
Seguindo tranquila, a Mostra, ela própria, não assume absolutismos, ou seja, não preocupa-se com as condenações totalitárias ou com os altos elogios, tendo encerrado sua 19a edição, ontem, estabelecendo-se por uma certeza. De que é o festival do Pais no qual, de fato, um filme é melhor dissecado por quem pensa cinema. Independente de erros ou acertos, isso é muito valioso para o realizador, seja lá quem ele for.
E, particularmente neste 2016, agregou uma boa safra em torno de um tema conceitual – “Espaços em Conflito” -, cujo programa “Aurora” o atendeu com visível coerência.
Em todos os sete filmes que competiram no programa, alguns com menos intensidade, outros com mais, o espaço geográfico estimulava a tensão entre os personagens.
Se em “Animal Político”, de Tião é pelo “pensamento” de uma vaca que refletimos sobre as inquietações pessoais e sociais do Recife, em “Aracati”, de Aline Portugal e Júlia De Simone, é o aproveitamento industrial do vento que gera uma mudança de vida nos moradores no Vale do Jaguaribe, Ceará.
Já em “Jovens Infelizes ou Um Homem que Grita não É um Urso que Dança”, de Thiago B. Mendonça (eleito o melhor filme da “Aurora” pelo júri oficial), nos aproximamos de um jovem grupo teatral que reivindica seu espaço, ou melhor o espaço da arte por meio da destruição para uma nova construção. Os jovens também aparecem em “Filme de Aborto”, no qual Lincoln Péricles brinca com a ideia de homens que engravidam para ressaltar o desconforto das mulheres na nossa sociedade.
Os mais radicais mergulhos sobre as tensões entre o homem e seu ambiente aparecem no excelente “Banco Imobiliário” – quando Miguel Antunes Ramos nos coloca por dentro do cruel e até patético universo da especulação imobiliária – e nos dois filmes com protagonismo indígena: “Índios Zoró: Antes, Agora e Depois?”, de Luiz Paulino dos Santos; e “Taego Ãwa”, de Marcela e Henrique Borela.
Sendo o primeiro uma investigação, hoje, sobre o estilo de vida dos Zoró, 30 anos depois do primeiro contato em Rondônia; e “Taego Ãwa” o registro contemporâneo sobre a tribo dos índios no titulo, que se viu caçada como bichos no inícios dos anos 1970, entre Tocantins e Mato Grosso.
Mesmo sem detalharmos uma outra dezena de programas desta 19a Mostra, o que fica é a sensação de que os conflitos gerados neste espaço histórico de Minas Gerais soa mais e mais como necessário para se pensar o futuro de um cinema criativo no Pais.
Notinhas
TIAO – Sem poder acompanhar ontem à noite a cerimônia de premiação da 19a Mostra de Cinema de Tiradentes, o diretor de “Animal Político”, Tião, precisou voltar ao Recife na tarde de ontem pois hoje embarca para Holanda, onde seu longa-metragem exibe no programa Bright Future (Futuro Brilhante), no Festival de Roterdã, quando exibirá quinta-feira (4/2).
CARDOSO – De Tiradentes, Joel Pizzini (de “Olho Nu”) conta que desenvolve projeto para rodar no Recife sobre o poeta pernambucano Joaquim Cardoso (1897-1978). Ainda em elaboração e busca por captação de recurso, o realizador deve ir ao Recife até 2017, onde também fará pesquisa na Fundação Joaquim Nabuco sobre o personagem.
MURITIBA – Empolgado com o lançamento para março nos cinemas de seu “Para a Minha Amada Morta” (que encerrou ontem Tiradentes), Aly Muritiba programa-se para partir em seguida à Itália, onde seu próximo filme, “Barba Ensopada de Sangue”, participa do laboratório de roteiro em Torino, com duração de seis meses. Muritiba rodará o filme apenas em 2017.
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