19o Tiradentes (2016) – dia 5
Documentário -Aracati- propõe reflexão a partir do vento
Por Luiz Joaquim | 18.01.2016 (segunda-feira)
TIRADENTES (MG) – O segundo longa-metragem exibido na mostra competitiva “Aurora” na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, projetado na noite de terça-feira, é uma produção que se dividiu entre o Rio de Janeiro e o Ceará, mas os recursos vieram de dois editais, sendo um deles o pernambucano “Rucker Vieira”, em sua edição 2012, disponibilizado pela Massangana Multimídia, da Fundação Joaquim Nabuco, para desenvolvimento de um documentário.
E, a propósito do incentivo, Aline Portugal, – uma das diretoras do longa-metragem “Aracati”, junto com Julia De Simone – contou um caso curioso em entrevista ontem pela manhã.
“Tínhamos como prazo o mês de agosto para entregar o resultado do projeto. Aí escrevemos para eles dizendo que um de nossos principais elementos no filme se manifestava apenas entre agosto e dezembro e que a gente precisava de um novo prazo. Eles entenderam como uma demanda justa, e concederam a extensão do prazo. Acho muito especial essa situação em que as regras das instituições tenham de se dobrar diante de uma circunstância da natureza”, lembrou De Simone.
Tendo agradado quase como que uma unanimidade aqui em Tiradentes, “Aracati” nos coloca no Vale do Jaguaribe, Ceará, seguindo a rota do vento a partir do litoral para o interior. A proposta inicial é a da observação daquele espaço transformado por uma presença tecnológica, particularmente por maciços e gigantescos cata-ventos, captadores de energia eólica que interferem e prejudicam a paisagem original.
Diversos aspectos técnicos destacam-se em “Aracati” em função de seu rigor formal, com planos fixos e contemplativos da paisagem modificada, seja pela construção de uma barragem que modificou a vida dos moradores locais, seja pela presença dos cata-ventos.
E dentro do tema da Mostra neste 2016, “Espaços em Conflito”, o filme é um dos que melhor se apresenta uma vez que, num segundo momento do documentário, conhecemos moradores locais que passam a interagir com a equipe. Eles lançam sua particular perspectiva sobre a presença da tecnologia naquele lugar, mesmo que eles próprios não usufruam do tal progresso.
Ainda que, a partir daqui, com o filme tomando uma outra direção diferente da vista na sua primeira metade – quando as imagens e os sons são os únicos responsáveis pelas impressões que chegam ao espectador -, “Aracati” continua forte em sua capacidade provocar reflexões e sensações sobre aquele ambiente. Só que, desta vez, pela palavra autêntica e, em certa medida, pura de seus personagens locais.
Mesmo que este documentário de observação faça reverberar diversas questões técnicas a respeito de suas estratégias de formatação, o filme de De Simone e Portugal alcança também outro escala, esta mais sutil, do cinema.
É a escala de provocar sensações próprias, particulares, do cinema. Isso quer dizer fazer o espectador esquecer-se de seu próprio lugar e ver-se transferido para aquele lugar que a tela e o som lhes oferecem no auditório de projeção. Não há elogio maior que se possa fazer a um filme dessa natureza.
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