Boi Neon (crítica – 2016)
Quando o instinto dita a verdade
Rosa é cor “de rapariga”, diz Iremar (Cazarré), mas ele usa assim mesmo
Por Luiz Joaquim | 13.01.2016 (quarta-feira)
“Boi Neon” (Bra., 2016), é o quinto longa-metragem solo do pernambucano Gabriel Mascaro, 32 anos. Há ainda um sexto filme seu – “KFZ-1348” –, co-dirigido com Marcelo Pedroso em 2008. Só por estas orações, abrindo este texto, o leitor poderia se perguntar: mas quem é esse cineasta tão jovem e tão prolífero?
Apenas pela sua capacidade produtiva – alicerçada pela companheira e produtora Rachel Ellis – já seria suficiente para Mascaro ser considerado um fenômeno entre sua geração de realizadores no Brasil.
Com a chegada de “Boi Neon” ao mundo, que circulou por mais de 30 festivais no planeta, levou 14 prêmios e será lançado comercialmente em 15 países, talvez alguns espectadores por aqui, adormecidos para o cinema autoral, entendam a partir de seus filmes anteriores que seu talento e sucesso não surgiram de uma hora para outra. E que “Boi Neon” tem uma força própria porque é fruto da coerência estética e humana que percorre desde sempre a obra de Mascaro.
Quando divulgado pela primeira vez publicamente, em 2010 (ainda sob o nome de “Valeu o Boi!”), o mote do enredo parecia bastante esperto.
Uma vez que aqui conheceríamos o heterossexual vaqueiro de curral, Iremar (Juliano Cazarré), cujo sonho é ser estilista no pólo de confecção do Agreste, enquanto sua companheira, Galega (Maeve Jinkings), é quem dirige o caminhão da família, não havia como não enxergar ali uma sadia provocação quanto a aspectos do gênero sexual. Em outras palavras, era uma cutucada nada discreta contra preconceitos.
Cinco anos depois, com “Valeu o Boi!” rebatizado, pronto e lançado, o que vemos é algo que opera numa esfera muito mais larga daquela do seu mote. “Boi Neon”, o filme, escreve com imagens possantes e desafiadoras (que Mascaro sempre prezou em sua filmografia), junto a personagens que são mais que autênticos. Eles são reconhecíveis. Mas que você só os reconhece quando conversa com você mesmo, muito intimamente.
Como se não bastasse, nesse universo muito particular (mas possível) que Mascaro criou, homens e bichos não possuem distinção, particularmente quando o assunto é o sexo, ou melhor, o instinto.
Há uma liberdade e um respeito pelo corpo do outro (seja pelo do bicho, ou pelo do homem, ou entre eles) em “Boi Neon”, que desnorteia aquele que o assiste. E parece que é só por ser assim, por existir essa postura na trupe de Iremar, que o tal universo criado por Mascaro no filme nos acena com tanta beleza. A beleza do não-julgamento quando o assunto é o corpo.
Consagração – Na mais recente premiação, Gabriel Mascaro recebeu o troféu de melhor diretor do Festival de Marrakech das mãos de Francis Ford Coppola, ali como presidente do júri.
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