Início de um novo ano, três filmes políticos
Antes tarde do que nunca: “120 Batimentos por Minuto”; “The Square”; “Destino de uma Nação”
Por Luiz Joaquim | 21.01.2018 (domingo)
Hoje (21) é domingo. Um dia, por que não dizer, sagrado também para ir ao cinema. E 2018, em seu comecinho, mesmo antes de entrarmos na tradicional temporada “pré-Oscar”, já iniciou com um muito bom cardápio nas salas de exibição para espectadores exigentes.
Ainda que com um pouco de atraso, longe das datas de seu lançamento, o CinemaEscrito comenta aqui três destes títulos que certamente irão fazer seu público refletir sobre questões políticas; seja pela urgência de ações, pelo humor sobre eternos assuntos polêmicos, ou seja pela revisão história de um líder controverso.
120 Batimentos por minuto (120 battements par minute, Fra., 2017. De Robin Campillo) – Representante da França na corrida por uma estatueta do Oscar como filme estrangeiro, temos aqui um dos mais celebrados títulos daquele país no ano passado (e com razão) em função de uma combinação afinadíssima de um roteiro denso e fluido, em tom revisionista de uma história recente – e de impacto ainda hoje –, e orquestrada por um coletivo de atores numa sintonia perturbadora pelo seu ritmo e talento performático.
Este inclusive é uma das dezenas de pontos muito forte deste filme que parece conquistar a todos. Aos olhos do espectador estrangeiro da cultura francesa, há apenas Adèle Haenel (A garota desconhecida) como figura reconhecível no elenco.
E seu status internacional nem faz diferença aqui, uma vez que Haenel está para o contexto da dramaturgia no mesmo patamar (às vezes abaixo) de todo o elenco que compõe o braço francês do grupo ativista Act Up.
No início dos anos 1990, eles fizeram muito barulho para que seus governantes tratassem a disseminação da AIDS, seu tratamento e medidas de precauções com a importância e, principalmente, a urgência que merecia.
Urgência, a propósito, é o tom em 120 Batimentos… Por toda sua duração, e desde o minuto 1, fica claro pelos diálogos rápidos, discussões acaloradas de reuniões tensas, e pelo estado de saúde de seus personagens (quase todos soropositivo), que não há outro caminho que não seja o da luta imediata e constante pelo esclarecimento de informações e a tomada de responsabilidade do governo e da indústria farmacêutica para a tragédia identificada pelas letras HIV que, no final dos 1980, ainda era muita associada como exclusividade entre os homossexuais masculinos.
Entre tantos aspectos, o filme de Campillo também conquista pela sutileza cinematográfica. Os “120 BPM” no título também pode ser relacionado com a música eletrônica (algumas com a frequência de 120 batidas por minuto) que particularmente na França do final dos 1980 e início dos 1990 ganhou destaque internacional, sendo seu ícone maior a dupla Daft Punk.
Não à toa, é ela, a música eletrônica, que embala o filme e rende imagens memoráveis, quando o foco sai dos corpos dos personagens numa boate para registrar a beleza da poeira do ambiente, que sobe lentamente. Funciona como uma poesia visual sobre no que nos transformaremos um dia. Todos. Sejamos nós vítimas da AIDS ou não.
The square: A arte da discórdia (Sue., 2017, De Ruben Östlun) – Palma de Ouro em Cannes 2017, e também forte candidato ao Oscar de filme estrangeiro, seu diretor, Ruben Östlun, ganha nova projeção e respeito mundial após sua incrível obra anterior (Forca maior. 2014) The square, inclusive, tem sofrido comparações injustas com Östlun, talvez pela sua proposta divertida, cômica mesmo, de tratar um tema sempre curioso. Esquecem os detratores (ou apenas querem esquecer) que a humor talvez seja um dos gêneros mais complexos do cinema.
No caso, acompanhamos a vida de um curador (Claes Bang) de um museu de arte contemporânea na Suécia cujas ações– seja no campo pessoal ou profissional – acabam reverberando de forma negativa.
Do ponto de vista da provocação, The square é bem recheado, uma vez que a arte contemporânea, habitualmente incompreendida por muitos, acaba dando margem à piadas fáceis (mas não bobas) aqui.
Desde o princípio, com o curador sendo entrevistado pela jornalista norte-americana ( Elisabeth Moss, da telessérie O conto de Aia, ótima), até a sequência de um seminário com um artista plástico e um senhor com Síndrome de Tourret na plateia, além da já antológica cena do jantar com a participação de um performer para arrecadar fundos ao museu são boas (e divertidíssimas) ilustrações do universo único do mercado da arte.
Há ainda a ideia d`O quadrado do museu (e sua divertida campanha de divulgação) onde, uma vez dentro dele, todos devem obrigatoriamente se ajudar; funcionando aqui como uma metáfora de nossa hipocrisia social.
O destino de uma nação (Darkest hour, GB, 2017. De Joe Wright) – Gary Oldman é o corpo e a alma deste filme. Vencedor do Globo de Ouro 2018 de melhor ator dramático, Oldman tem a câmera enamorada por ele sob uma pesada maquiagem que o transformou em Winston Churchill durante sua tumultuada posse e seus primeiros dias como Primeiro Ministro durante a ascensão nazista.
O período concentrado aqui é o mês de maio de 1940, quando Churchill é indicado a assumir o mais importante posto político britânico, mesmo que por uma manobra de seu partido opositor. Temido e indesejado pelo parlamento, e também pelo Rei George, Winston precisa pensar não apenas em estratégias contra os soldados de Hitler (que naquele momento tinha encurralado 300 mil soldados ingleses em Dunquerque, França), mas também contra seus opositores no parlamento.
Suas ideias audaciosas e, principalmente, corajosas ali postas em prática constituem, no filme, a força da imagem que Churchill estabeleceu como líder exemplar para sempre na história da Grã-Bretanha e do mundo. Bonito de ver.
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